O ÍNDIO PLATINOCOMO PAPEL BRANCO: OS PRIMEIROS TEMPOS DA IMPRENSA NA AMÉRICA JESUÍTICA ( )
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1 O ÍNDIO PLATINOCOMO PAPEL BRANCO: OS PRIMEIROS TEMPOS DA IMPRENSA NA AMÉRICA JESUÍTICA ( ) Fernanda Gisele Basso (BIC/UNICENTRO), Márcio Fernandes (Orientador), Universidade Estadual do Centro-Oeste/Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes Palavras-chave: América Jesuítica, Processos Comunicacionais, Cultura das Letras, Imprensa Resumo: Nos confins da América, durante 200 anos, padres católicos e índios guaranis construíram mais do que edificações (Reduções Jesuíticas). O presente projeto estuda a implantação e os impactos de uma cultura que os habitantes nativos jamais sonharam o universo letrado, simbolizado pelos livros, trazidos pelos europeus, recurso esse que fazia deixar de lado a oralidade que dominava aquele pedaço de chão americano, a partir dos indígenas (taxados de papel branco), sacerdotes, militares, viajantes e membros da Coroa, o que propiciou um circuito regular de comunicação interna e em direção à Europa. Introdução Na metade do século 17, as Reduções Jesuíticas se encontravam nos confins da América. Grande parte do Novo Mundo estava mapeada e conhecida, mas apenas uma pequena parte, colonizada. Sobretudo no Sul do continente, a prestigiosa Companhia de Jesus havia sido encarregada décadas antes de fazer a sua parte neste processo de ocupação do solo, estabelecendo colônias para vida coletiva à base do trabalho dos índios guaranis, em uma faixa de terra que hoje abarca o Estado do Rio Grande do Sul e partes de duas nações vizinhas Argentina e Paraguai, mas que, como bem lembra BANGERT (1972), pertencia à época ao Vice-Reinado do Paraguai. Sob o argumento de também levar a doutrina cristã aos guaranis, tidos por pagãos, como uma suposta tarefa divina, sacerdotes embalados pelas visões de Ignácio de Loyola (mais tarde canonizado) construíram um colosso coletivo que durou dois séculos que ainda instiga a memória coletiva pela complexidade do que ali se protagonizou da construções arquitetônicas às manifestações artísticas, passando pelo aspecto mais impressionante e objeto de estudo deste artigo: a implantação do universo letrado em um grupo social que, na ótica européia, era bárbaro demais, oral demais, atrasado demais, portanto, para os padrões civilizatórios do Velho
2 Mundo, resultando na formação de um formidável circuito comunicacional, que se materializava em livros, enquanto aspecto unitário, e em bibliotecas públicas. DARNTON, em seu Os dentes falsos de George Washington: um guia não convencional para o século XVIII (2003: 41), acerca do fluxo das informações na França pré-revolução de 1789, pondera que: Cada sociedade desenvolve seus próprios meios de buscar e reunir informação; suas maneiras de comunicar o que reúne, quer ela use ou não de conceitos como notícias ou meios, podem revelar muito sobre sua compreensão da própria experiência. Para dar conta dessa tentativa de produzir uma compreensão própria do universo indígena, padres católicos de diversas partes da Terra que cruzaram pela América Missioneira (termo decorrente das Missões, nome alternativo às Reduções, que serviam para identificar as cerca de 40 cidades construídas por religiosos e nativos ao longo dos dois séculos de estudo em questão 1580 a 1780, aproximadamente) operaram com a introdução do letramento de dois modos que se mesclavam o tempo todo a cultura do manuscrito (dividida em ler e escrever, sobretudo) e as técnicas de impressão, derivadas da invenção do século 15 do alemão Johannes Gutenberg, os tipos móveis. Eram os jesuítas parte de um grupo social que via no letramento uma forma eficiente de dominação do pensamento coletivo e a eles se somavam viajantes eruditos e os mandatários da Colônia, dentre outros. GOMES, em seu livro 1808 (2007: 124) ilustra bem tal visão, de atraso provocado pela Censura Real à formação de mídias, citando TOLEDO: Materiais e Métodos Devido à precariedade das comunicações com o interior da Colônia, a notícia da morte do rei D. João I, em 1777, levou três meses e meio para chegar a São Paulo. Duas décadas e meia mais tarde, a Província de São Pedro do Rio Grande (atual Estado do Rio Grande do Sul), demorou três meses e treze dias para saber que Portugal e Espanha estavam em guerra. Quando a notícia chegou, no dia 15 de janeiro de 1801, fazia nove dias que o confronto terminara, com a derrota de Portugal. A presente pesquisa opera com pesquisa teórica e empírica. No primeiro caso, uma ampla revisão da literatura do tema, em português e em espanhol, é parte do processo. Obras capitais quanto ao assunto estão na bibliografia do estudo, caso dos livros Jesuitas, guaraníes y encomenderos (edição em espanhol), de Antonio Astrain (1995) e História da Companhia de
3 Jesus, de William Bangert (1972). Igualmente fazem parte do escopo da pesquisa reflexões de pesquisadores como Peter Burke e Roger Chartier, dentre outros. Ademais, a pesquisa leva em conta documentos de época, neste caso produzidos entre 1580 e 1780, em suas versões fac-símile, que estão disponíveis em centros de documentação ou em bibliotecas digitais. Eventualmente, há o uso de versões de documentos mais recentes, caso das capas de jornais editados no século 19 no Estado do Rio Grande do Sul e constantes do livro Jornais raros do Musecom , publicação de Resultados e Discussão A pesquisa tem procurado demonstrar a formação e impactos de uma Cultura das Letras no espaço platino, como uma espécie de Imprensa da época, na medida em que, por exemplo, documentos circulavam com regularidade nesta parte do continente livros religiosos, cartas de viajantes, relatos militares, decisões das Coroas espanhola e portuguesa, etc. Há de se destacar especialmente a dimensão relevante que padres jesuíticas forneciam aos livros, havendo inclusive a produção de diversas obras, a partir de uma mesma prensa móvel, em variados povoados da época, sempre com o religioso encarregado da publicação levando seu equipamento para onde quer que fosse. Conclusões Portanto, recuperar e debater o que se pode chamar de sistema missioneiro de comunicação é estimular a compreensão de uma época importante na trajetória da América. No final do século 19, no mesmo período em que índios guaranis, através de uma dessas ferramentas do referido sistema (as cartas), tentavam retomar uma proposta um tanto utópica de vida social, o Brasil como um todo ainda se encontrava mergulhado na escuridão que a ausência da cultura letrada provoca. Agradecimentos À Deus, que me deu força e permitiu que concluísse este trabalho. À meus familiares, pelo o amor e o apoio que nos deram e pelos seus ensinamentos que continuam até hoje. Ao professor Márcio Fernandes com os seus ensinamentos À todos que direta ou indiretamente colaboraram para a realização desse trabalho.
4 Referências ALVES FILHO, I. Brasil, 500 anos em documentos. Rio de Janeiro: Mauad, 1999 ASTRAIN, A. Jesuitas, guaraníes y encomenderos. Assução: Cepag, 1995 BANGERT, W. História da Companhia de Jesus. Porto/São Paulo: Apostolado da Imprensa/Loyola, CHARTIER, R. Os desafios da escrita. São Paulo: Editora Unesp, DARNTON, R. Os dentes falsos de George Washington um guia não convencional para o século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2005 DOHMANN, K; AMABLE, M. A. Historia del Montoya. Posadas: Isarm, 2002 GAUZ, V. Missões Jesuíticas no Paraguai I, disponível em acesso em abr GOLIN, T. A Guerra Guaranítica: como os exércitos de Portugal e Espanha destruíram os Sete Povos dos jesuítas e índios guaranis no Rio Grande do Sul. Passo Fundo: Ediupf, 1998 / Porto Alegre: Editora da Universidade-UFRGS, 1998 GOMES, L. 1808: como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil. São Paulo: Planeta, 2007 KERN, A. Utopias e missões jesuíticas. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 1994 LEITE, S. Suma histórica da Companhia de Jesus: assistência de Portugal, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1965 MIRANDA, M. E.; LEITE, C. R. S. C. (orgs). Jornais raros do Musecom: Porto Alegre: Museu da Comunicação Social, MONTOYA, A. R.. Conquista espiritual feita pelos religiosos da Companhia de Jesus nas Províncias do Paraguai, Paraná, Uruguai e Tape. Porto Alegre: Martins Livreiro Editor, O. M. KOSTIANOVSKI. Anais do 7. Simpósio Nacional de Estudos Missioneiros, Santa Rosa, 1987, Vol. 1, p PLA, J. Obras completas, disponível em acesso em ago PINTO, V. N.. Comunicação e cultura brasileira. São Paulo: Ática, 2000.
5 QUEVEDO, J. As Missões crise e redefinição. São Paulo: Ática, 1993
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