POR UM PROCESSO DE PROJETO SIMULTÂNEO
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- João Pedro Casado Castel-Branco
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1 POR UM PROCESSO DE PROJETO SIMULTÂNEO Márcio Minto FABRICIO Professor do Dep. de Arquitetura e Urbanismo. Escola de Engenharia de São Carlos -USP - marcio@sc.usp.br Silvio Burrattino MELHADO Professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo silvio.melhado@poli.usp.br RESUMO O presente trabalho discute os novos paradigmas de gestão do desenvolvimento e projeto de produtos na indústria contemporânea reunidos sob o conceito de Engenharia Simultânea, análisa sucintamente a pertinência destes paradigmas na construção de edifícios e defende a necessidade de adaptações ao contexto do setor e a adoção de uma denominação própria - Projeto Simultâneo - a fim de demarcar as particularidades do processo de projeto de edifícios. 1. INTRODUÇÃO Nos empreendimentos de construção de edifícios o desenvolvimento dos projetos são organizados de forma hierarquizada e sequencial. Ao longo do processo de projeto diferentes agentes e projetistas tomam isoladamente importantes decisões de concepção do negócio, do produto e do processo de produção que repercurtem em múltiplos aspectos da qualidade das edificações e da sua construtibilidade. Os grupos tradicionais de projeto de edifícios são estruturados como uma espécie de equipe de revezamento em que cada projetista desenvolve sua parte ou especialidade do projeto e passa o canudo para o projetista seguinte numa sucessão em que o projeto resulta da soma das contribuições individuais dos diversos projetistas e agentes decisorios. Conforme ressalta Tzortzopoulos et al. (2002) na manufatura o desenvolvimento de novos produtos contém a seqüência de atividades que abrange do projeto a comercialização, envolvendo a da identificação das necessidades dos clientes e das possibilidades de mercado à disposição final do produto no mercado. Em outras indústrias têm ganhado relevância a idéia de desenvolvimento integral e integrado de novos produtos envolvendo todas as decisões de diferentes âmbitos relacionados a concepção, produção, comercialização, uso e manutenção do produto conceito de ciclo de vida. Essa forma de desenvolver novos produtos é denominada Engenharia Simultânea (ES). 2. O CONCEITO DE ENGENHARIA SIMULTÂNEA O termo Engenharia Simultânea é a tradução para o português mais aceita da expressão em inglês Concurrent Engineering. A palavra concurrent tem o sentido de concomitante e, assim, a tradução por simultânea expressa melhor a idéia contida no termo em inglês. Na literatura abordagens similares à Engenharia Simultânea, podem ser encontradas com as denominações em inglês de Design Integrated Manufacturing, Synchronous Engineering, Concurrent Product/Process Development,
2 Team Approach, Life-Cycle Engineering, Product and Cycle-time Excellence, Overlapping Engineering e em português como Engenharia Paralela, Engenharia Concomitante e Engenharia Concorrente. Os primeiros estudos sobre Engenharia Simultânea, tal como esta é entendida hoje, e a sua utilização sistemática por empresas ocidentais, remonta da segunda metade da década de oitenta. A denominação Concurrent Engineering foi proposta e caracterizada primeiramente pelo Institute for Defense Analysis (IDA) do governo americano. Engenharia Simultânea: uma abordagem sistemática para integrar, simultaneamente projeto do produto e seus processos relacionados, incluindo manufatura e suporte. Essa abordagem é buscada para mobilizar os desenvolvedores (projetistas), no início, para considerar todos os elementos do ciclo de vida da concepção até a disposição, incluindo controle da qualidade, custos, prazos e necessidades dos clientes. (Institute for Defense Analyses IDA, 1988) apud Society of Concurrent Product Development (SCPD, 2002). As principais características da ES são: ênfase no momento da concepção do produto e valorização do projeto; realização em paralelo de várias atividades de desenvolvimento de produto (desenvolvimento conjunto de projetos do produto e da produção); formação de equipes de projeto multidisciplinares e coordenadas; utilização da informática e das novas tecnologias de telecomunicação no desenvolvimento do projeto e orientação para a satisfação dos clientes e usuários para o ciclo de vida de produtos e serviços. E os principais objetivos e benefícios da ES são: redução do tempo de projeto; introdução de inovações; ampliação da qualidade ao longo da vida útil de produtos e serviços; ampliação da manufaturabilidade dos projetos e aumento de eficiência dos processos produtivos de bens e serviços. 3. ENGENHARIA SIMULTÂNEA NA CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIOS A aplicação do modelo e das ferramentas relacionadas a ES na construção de edifícios tem sido tratada em diversos artigos publicados em eventos internacionais específicos como o Concurrent Engineering in Construction - CEC 1997 e o CEC 1999 bem como em alguns eventos de caráter mais geral como os encontros do IGLC (International Group for Lean Construction) que têm recebido contribuições sistemáticas relacionadas ao estudo da ES na construção. Outros trabalhos podem ser encontrados em revistas, anais e boletins técnicos diversos. Atualmente a ES aplicada à construção também conta com um grupo de trabalho (TG33 Concurrent Engineering in Construction - no International Council for Research and Innovation in Building and Construction (CIB). Nos trabalhos sobre ES na construção e no grupo de estudos do CIB destaca-se a participação de autores ingleses e americanos e a maioria dos trabalhos enfoca questões bastante especificas relacionadas à implantação de práticas e ferramentas relacionadas à ES na construção. Na França o grupo de estudos GEMAP (Groupe de Réflexion sur le Management de Projets) e alguns trabalhos publicados através do PCA (Plan Construcion et Architecture) têm abordado o assunto e apresentado contribuições importantes sobre o emprego da Engenharia Simultânea e sobre inovação na construção de edifícios (são exemplos: Jouini; Midler, 1996; Tahon, 1997). Os trabalhos franceses dão mais destaque às questões sociológicas e organizacionais envolvidas. No Brasil, uma das primeiras publicações que abordam a Engenharia Simultânea no projeto de edifícios é Casttels; Luna (1993). Outros trabalhos relacionados ao tema foram publicados mais
3 recentemente: Fabricio; Melhado (1998, 2001); Fabricio; Baía; Melhado (1999); Melhado (1999); Andery (2000); Jobim (2000); Brasiliano (2000); Romano et. al (2001); Fabricio (2002). O primeiro questionamento necessário é relativo à pertinência da denominação Engenharia Simultânea frente às práticas e problemáticas projetuais do setor de construção de edifícios. De fato, a complexidade do empreendimento de edifício que envolve questões imobiliárias, urbanísticas, tecnológicas, construtivas, arquiteturais, culturais e históricas transcende o escopo restrito das engenharias e torna o termo Engenharia Simultânea limitado frente ao conjunto de profissionais e problemáticas envolvido no processo de projeto do setor. Por esta razão, optou-se pela utilização da denominação Projeto Simultâneo proposta inicialmente em Fabricio; Melhado (1998). Outra dificuldade para aplicação da filosofia e consequentemente da denominação Engenharia Simultânea na gestão do processo de desenvolvimento e projeto de edifícios é que esses métodos foram desenvolvidos em outros setores industriais, com cultura, estruturas produtivas e desafios competitivos diferentes. Como ressalta Jouini; Midler (1996), as práticas de gestão não são pacotes que podem ser transferidos de um setor industrial para outro. As dinâmicas industriais próprias de cada setor, a história e capacitação dos profissionais envolvidos e os conflitos na articulação das interfaces entre agentes devem ser considerados para adaptar e reinventar os métodos de gestão dentro dos contextos setoriais. O primeiro passo para discutir a aplicação da Engenharia Simultânea no setor de construção é analisar as características comuns e as divergentes no ambiente e nos objetivos projetuais da indústria de produção seriada (origem da ES) e da indústria de construção. Em seguida, deve-se buscar métodos e conceitos próprios que contemplem as particularidades e as necessidades específicas da indústria da construção de edifícios. Como discutimos na introdução (item 1) o processo de projeto de um novo produto na indústria seriada é, em geral, percebido de forma mais ampla que na construção. Além disso, na indústria seriada, muitas vezes, o desenvolvimento de um novo produto é acompanhado pelo desenvolvimento de uma inovação no conceito do produto ou na tecnologia ou no marketing ou em vários destes aspectos conjuntamente. Na construção, ao contrário, a maioria dos empreendimentos é desenvolvida com base nos padrões tradicionais e não está orientada para a introdução de inovações (ver Fruet; Formoso, 1993; Amorim, 1996). Além disso, em muitas indústrias, a grande série de produção (a automobilística é o exemplo típico) justifica a mobilização em tempo integral das equipes de projeto e elevados investimentos financeiros, ao passo que na construção os recursos mobilizados no projeto têm que ser amortizados em um número bastante restrito de unidades de produto. Em Fabricio (2002) é possivel encontrar uma análise extensa das distinções entre os setores industriais de produção em série e a de construção de edifícios, bem como diversas razões para proposição de um termo destinto de forma a marcar as distinções entre tais setores. 4. CONCEITO DE PROJETO SIMULTÂNEO A proposta de Projeto Simultâneo desenvolvida em Fabricio (2002) parte dos conceitos e filosofias de colaboração que norteiam a aplicação da ES em outras indústrias, mas não pretende impor ao setor de construção a rigidez e a complexidade dos métodos e das ferramentas associadas a ES. Procurase, portanto, o desenvolvimento de um modelo próprio de gestão do processo de projeto que seja orientado às características e possibilidades setoriais, mas reflita os paradigmas contemporâneos de
4 organização de projetos e as novas possibilidades tecnológicas no tratamento e organização dos fluxos de informações. Explorada as restrições e as condições para introdução de práticas de ES no processo de projeto de construção, parte-se para a proposição de formas e adaptações para viabilizar tal aplicação. A denominação Projeto Simultâneo denota a ênfase dada às questões de gestão do processo de projeto e a busca pela colaboração e paralelismo na atuação dos agentes e na concepção integrada das diferentes dimensões do empreendimento. O conceito de Projeto Simultâneo deve ser entendido como uma adaptação (ao setor) da Engenharia Simultânea que busca convergir, no processo de projeto do edifício, os interesses dos diversos agentes participantes do ciclo de vida do empreendimento, considerando precoce e globalmente as repercussões das decisões de projeto na eficiência dos sistemas de produção e na qualidade dos produtos gerados, envolvendo aspectos como construtibilidade, habitabilidade, manutenibilidade e sustentabilidade das edificações (Fabricio, 2002). Em síntese, como Projeto Simultâneo na construção de edifícios define-se: O desenvolvimento integrado das diferentes dimensões do empreendimento, envolvendo a formulação conjunta da operação imobiliária, do programa de necessidades, da concepção arquitetônica e tecnológica do edifício e do projeto para produção, realizado através da colaboração entre o agente promotor, a construtora e os projetistas, considerando as funções subempreiteiros e fornecedores de materiais, de forma a orientar o projeto à qualidade ao longo do ciclo de produção e uso do empreendimento (Fabricio, 2002). Assim, no Projeto Simultâneo as equipes de projeto, em uma análogia com um time de futebol, apresenta, em um dado momento do processo, um jogador que detém a posse da bola e tem um papel preponderante, mas, simultaneamente, os demais membros do time participam do lance. Os principais elementos considerados para implantação do Projeto Simultâneo na construção de edifícios, conforme discutido em detalhes em Fabricio (2002), são: valorização do papel do projeto e integração precoce, no projeto, entre os vários especialistas e agentes do empreendimento; transformação cultural e valorização das parcerias entre os agentes do projeto; reorganização do processo de projeto de forma a coordenar concorrentemente os esforços de projeto; utilização das novas tecnologias de informática e telecomunicações na gestão do processo de projeto. Os objetivos considerados mais relevantes para aplicação do Projeto Simultâneo na criação e desenvolvimento de novos empreendimentos de edifícios são (pela ordem): (1) ampliar a qualidade do projeto e, por conseguinte, do produto; (2) aumentar a construtibilidade do projeto; (3) subsidiar, de forma mais robusta, a introdução de novas tecnologias e métodos no processo de produção de edifícios; (4) eventualmente, reduzir os prazos globais de execução através de projetos de execução mais rápida. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ANDERY, P. R. P. Desenvolvimento de produtos na construção civil: uma estratégia baseada no Lean Design. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GESTÃO DE DESENVOLVIMENTO DE PRODUTO, 2., 2000, São Carlos. Anais... São Carlos: UFSCar, CD-ROM. AMORIM, S.L. Inovações tecnológicas nas edificações: papéis diferenciados para construtores e fornecedores. Gestão & Produção, São Carlos, v.3, n.3, p
5 BRASILIANO, A. E. Gestão do desenvolvimento de projetos das edificações públicas: um modelo segundo os princípios da engenharia simultânea Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Espirito Santo, Vitória. CASTELLS, E.J.F.; LUNA, M.M.M. A Engenharia Simultânea e a fase de projeto da indústria da construção civil. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 1993, São Carlos. Anais... São Carlos: ABEPRO, FABRICIO, M. M. Projeto Simultâneo na construção de edifícios Tese (Doutorado) Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo. FABRICIO, M. M.; BAÍA, J. L.; MELHADO, S. B. Estudo do fluxo de projetos: cooperação seqüencial x colaboração simultânea. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE GESTÃO DA QUALIDADE E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO, 1999, Recife. Anais... Recife: Escola politécnica de Pernambuco/ANTAC, CD-ROM FABRICIO, M. M.; MELHADO, S. B. Projeto simultâneo e a qualidade na construção de edifícios. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL NUTAL 98- ARQUITETURA E URBANISMO: tecnologias para o século XXI, 1998, São Paulo. Anais... São Paulo: FAU/USP, CD-ROM FABRICIO, M. M.; MELHADO, S. B.; BAÍA, J. L. A brief reflection on the improvement of the design process efficiency in brazilian building projects. In: ANNUAL CONFERENCE OF INTERNATIONAL GROUP FOR LEAN CONSTRUCTION, 7., 1999, Berkeley. Proceedings... Berkeley: IGLC, 1999a. FABRICIO, M. M.; MESQUITA, M. J.; MELHADO, S. B. Colaboração simultânea em diferentes tipos de empreendimentos de construção de edifícios. In: ENCONTRO NACIONAL DE TECNOLOGIA DO AMBIENTE CONSTRUÍDO: cooperação & responsabilidade social, 9., 2002, Foz do Iguaçu. Anais... Foz do Iguaçu, CD-ROM FRUET, G.M.; FORMOSO, C.T. Diagnóstico das dificuldades enfrentadas por gerentes técnicos de empresas de construção civil de pequeno porte. In: SEMINÁRIO QUALIDADE NA CONSTRUÇÃO CIVIL, 1993, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre, p JOBIM, M.S.S. Aplicação dos conceitos de desenvolvimento de produto à construção civil. In: SEMINÁRIO SOBRE LEAN CONSTRUCTION, 5., 2000, São Paulo. Anais... São Paulo: Lean Construction Institute do Brasil, JOUINI, S.B.M.; MILDLER C. L ingénierie concourante dans le bâtiment. Paris, Plan Construction et Architeture / GREMAP,1996. MELHADO, S. B. O plano da qualidade dos empreendimentos e a engenharia simultânea na construção de edifícios. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 1999, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: UFRJ/ABEPRO, CD-ROM SOCIETY OF CONCURRENT PRODUCT DEVELOPMENT (SCPD). Disponível em: < Acesso em: 10 Apr TAHON, C. Le pilotage simultané d un projet de construction. Paris: Collection Recherche, TZORTZOPOULOS, P.; BETTS, M.; COOPER, R. Product development process implementation exploratory case studies in construction and manufacturing. In: ANNUAL CONFERENCE OF INTERNATIONAL GROUP FOR LEAN CONSTRUCTION, 10., 2002, Gramado-RS. Proceedings... < Acesso em: 21 Set ROMANO, F.V.; BACK, N.; OLIVEIRA, R. A importância da modelagem do processo de projeto para o desenvolvimento integrado de edificações. In: WORKSHOP NACIONAL: gestão do processo de projeto na construção de edifícios, 2001, São Carlos. Anais... São Carlos: EESC/USP, CD- ROM
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