Apelação Cível n , de São José Relator: Des. Luiz Fernando Boller

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1 Apelação Cível n , de São José Relator: Des. Luiz Fernando Boller APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO JULGADOS PROCEDENTES. PRETENDIDA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. PENÚRIA ECONÔMICA NÃO DEMONSTRADA. INSURGENTE QUE, ADEMAIS, PROCEDEU AO RECOLHIMENTO DO PREPARO. BENESSE DENEGADA. EXTINÇÃO DA AÇÃO DE EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE MOTIVADA PELA AUSÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. SOLUÇÃO IRREPREENSÍVEL. CONTRATO DE SEGURO DE ACIDENTES PESSOAIS QUE, COM A SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº /06, DEIXOU DE ESTAR ELENCADO NO ROL TAXATIVO DO ART. 585 DO CPC, COMO TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. ALMEJADA REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. SOLUÇÃO QUE NÃO SE JUSTIFICA. SENTENÇA MANTIDA. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. "Nos termos do inciso III do artigo 585 do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n /2006, o contrato de seguro de acidentes pessoais não constitui título executivo extrajudicial. Logo, é incabível execução com base nele, após a vigência da lei supracitada" (Apelação Cível nº , de Garopaba, rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, julgado em 18/08/2011). Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n , da comarca de São José (3ª Vara Cível), em que é apelante Cristian Reichow, e apelada Itaú Vida e Previdência S/A: A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais. O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo

2 Senhor Desembargador Victor Ferreira, com voto, e dele participou a Excelentíssima Senhora Desembargadora Rosane Portella Wolff. Florianópolis, 17 de outubro de Luiz Fernando Boller RELATOR

3 RELATÓRIO Cuida-se de apelação cível interposta por Cristian Reichow, contra decisão prolatada pelo juízo da 3ª Vara Cível da comarca de São José, que julgou procedentes os Embargos à Execução nº (disponível em < acesso nesta data), opostos por Itaú Vida e Previdência S/A, declarando extinta a ação de Execução por Quantia Certa contra Devedor Solvente nº (disponível em < foro=64> acesso nesta data), por não estar o Contrato de seguro de acidentes pessoais elencado no rol do art. 585 do Código de Processo Civil, como título executivo extrajudicial, condenando o exequente embargado, via de consequência, em ambos os processos, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 600,00 (seiscentos reais), a rigor do que dispõe o art. 20, 4º, do Código de Processo Civil (fls. 86/88). Fundamentando a insurgência, o recorrente sobressaiu, em síntese, que mantinha com a embargante Contrato de Seguro de Vida - representado pela Apólice (fl Apenso 1) -, que previa cobertura por invalidez permanente total no valor de R$ ,07 (dezessete mil, cento e sessenta e cinco reais e sete centavos), de modo que tal documento consubstancia pleno título executivo extrajudicial, "porquanto munido de certeza, liquidez e exigibilidade face a prova da aposentadoria por invalidez" (fl. 94). Neste pensar, sustentou que a exigibilidade do aludido Contrato está patenteada pelo que estatuem o art. 27 do Decreto-Lei nº 73/66 e o art. 5º do Decreto nº /67, motivo por que merece reparo a decisão vituperada. Na sequência, avultou que por auferir rendimentos advindos apenas do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez, efetivamente não dispõe de recursos suficientes para honrar o pagamento das custas judiciais sem prejuízo do próprio sustento, requerendo seja-lhe concedida a benesse da justiça gratuita. Por derradeiro, afiançou que na hipótese de reforma do decisum redarguido, faz-se necessária a inversão dos ônus sucumbenciais, alternativamente, bradando pela redução do quantum arbitrado, objetivando a fixação em não mais do que o equivalente a 1/2 (meio) salário mínimo em cada processo, justificando o pleito na "singeleza da matéria, [...] que motivou até mesmo o julgamento antecipado da demanda" (fl. 96), termos em que clamou pelo conhecimento e provimento do apelo (fls. 92/97), que foi recebido no duplo efeito (fl. 101). Em contrarrazões, a apelada Itaú Vida e Previdência S/A exaltou ser escorreita a decisão do juízo a quo, inexistindo respaldo jurídico para a pretendida reforma, razão pela qual clamou pelo desprovimento do reclamo (fls. 105/112). Ascendendo a este pretório, os autos foram por sorteio distribuídos ao Desembargador Jairo Fernandes Gonçalves (fl. 115) que apontando a existência de anterior Agravo de Instrumento registrado e autuado sob o nº (disponível em <

4 cbpesquisa=numproc&depesquisa= &pesquisar=pesquisar> acesso nesta data) - cuja análise foi procedida por este relator -, determinou a redistribuição do apelo por prevenção (fl. 116). É, no essencial, o relatório.

5 VOTO Num primeiro momento, ressalto que conquanto o apelante Cristian Reichow tenha avultado a insuficiência de recursos para honrar o pagamento das custas judiciais sem prejuízo do próprio sustento, o Detalhamento de Crédito (fl Apenso 1), relativo ao mês de outubro de 2010, descortina renda mensal aproximada de R$ 2.700,00 (dois mil e setecentos reais), o que - na ausência de qualquer elemento indicativo das despesas mensais do postulante -, a meu ver, não evidencia a alegada carência econômica. Ademais, constato ter sido procedido o recolhimento do preparo (fl. 99), circunstância evidentemente incompatível com a aludida hipossuficiência, razão pela qual, à mingua de quaisquer elementos outros capazes de conferir amparo ao pleito, a revogação do benefício da justiça gratuita, deferido em 1º Grau (fl Apenso 1), é medida que se impõe. Neste sentido, do acervo jurisprudencial deste pretório destaco: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO INDENIZATÓRIO. DANOS CONSTRUTIVOS. PROVA PERICIAL TÉCNICA. HONORÁRIOS DO EXPERT. OPOSIÇÃO AO VALOR. DESCOMPASSO COM A REDAÇÃO DO ART. 7 DA LC N 156/1997. CONSULTA A OUTROS PROFISSIONAIS. BUSCA DO MELHOR PREÇO. JUSTIÇA GRATUITA. PREPARO PREVIAMENTE RECOLHIDO. PRECLUSÃO LÓGICA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Havendo oposição ao valor dos honorários do expert, torna-se prudente consultar outros profissionais da área técnica específica, a fim de que se possa encontrar, dentre as propostas apresentadas, o de menor ou mais razoável valor. A atitude da parte em recolher o preparo recursal e requerer o deferimento do benefício da justiça gratuita faz transparecer uma certa ilogicidade com a alegada hipossuficiência, motivo pelo qual se indefere a pretensão. (Agravo de Instrumento n , da Capital, rel. Des. Fernando Carioni, julgado em 17/02/2012). Dito isto, conheço do apelo, porque, além de tempestivo, reúne as demais condições de admissibilidade, sobressaindo que segundo o disposto no art. 585 do Código de Processo Civil, São títulos executivos extrajudiciais: I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque; II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores; III - os contratos garantidos por hipoteca, penhor, anticrese e caução, bem como os de seguro de vida; IV - o crédito decorrente de foro e laudêmio; V - o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio; VI - o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial; VII - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, correspondente aos créditos

6 inscritos na forma da lei; VIII - todos os demais títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva (grifei). Pois bem. Em que pese o apelante defenda a exequibilidade do Contrato de Seguro de Vida representado pela Apólice nº (fl Apenso 1), que previa cobertura por invalidez permanente total, no valor de R$ ,07 (dezessete mil, cento e sessenta e cinco reais e sete centavos), constato, a bem da verdade, que se trata de Contrato de Seguro de Acidentes Pessoais Coletivo, em que figura como estipulante o Banco Itaú S/A. Tal ilação, além de exsurgir evidente diante da análise das garantias contratadas - morte acidental e invalidez permanente total por acidente -, decorre também das Condições Gerais do PPI Premiável, a que aderiu o exequente embargado (disponível em < regulamentos/regul_ppipremiavel_itau.pdf> acesso nesta data). Em sendo assim, considerando que com o advento da Lei nº /06, o contrato de seguro de acidentes pessoais deixou de integrar o rol taxativo do art. 585 do Código de Processo Civil - mais especificamente o respectivo inc. III -, induz a ausência de condição de processabilidade da ação de Execução por Quantia Certa contra Devedor Solvente nº , encetada por Cristian Reichow. Acerca da sobredita alteração legislativa, Humberto Theodoro Júnior ministra que: [...] Na vida moderna existe uma variedade enorme de contratos de seguro, a maioria deles envolve situações complexas, de difícil enquadramento no conceito de obrigação líquida, certa e exigível, sem o qual não se pode cogitar da execução forçada. O primitivo inciso III do art. 585 conferia força executiva aos contratos de seguro de vida e de acidentes pessoais de que resultasse morte ou incapacidade. Com a reforma da Lei nº , de 06/12/2006, a força executiva ficou limitada ao contrato de seguro de vida. Perdeu tal eficácia, portanto, o contrato de acidentes pessoais (Processo de Execução e Cumprimento de Sentença. 26. ed. rev. e atual. São Paulo: Liv. e Ed. Universitária de Direito, 2009, p. 134). A respeito, também pontua Ernane Fidélis dos Santos que: [...] O contrato de seguro de vida continua com a possibilidade de ser título executivo extrajudicial (art. 585, III, última parte), mas suprimiu-se o de acidentes pessoais, ainda que dele resulte morte ou incapacidade (Lei nº /2006). Há, no caso, portanto, de se fazer necessária diferenciação. O contrato pode acobertar especificamente a vida da pessoa, com indicação do beneficiário, ou beneficiários; mas, se a cobertura é tão-só para a hipótese de acidente pessoal, nem por isso o evento morte pode conferir executividade ao título. Aqui não se dispensa o processo de conhecimento para o respectivo acertamento, havendo, quando muito, a adoção do procedimento sumário, quando for o caso (Manual de Direito Processual Civil. Volume 2: execução e processo cautelar. 11. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 31). Neste esteio, ponderando que o título que lastreou a demanda subjacente não está elencado naqueles taxativamente referidos no art. 585 do Código

7 de Processo Civil, revela-se adequado o decisum combatido, que declarou a extinção da ação de execução. Aliás, neste rumo, colho precedente de nossa Corte: PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. CONTRATO DE SEGURO POR ACIDENTES PESSOAIS. INVALIDEZ. EXCLUSÃO DO CONTRATO DO ROL TAXATIVO DOS TÍTULOS EXECUTIVOS EXTRAJUDICIAIS PELA LEI N /2006. ARTIGO 585, III, DO CPC. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. Nos termos do inciso III do artigo 585 do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n /2006, o contrato de seguro de acidentes pessoais não constitui título executivo extrajudicial. Logo, é incabível execução com base nele, após a vigência da lei supracitada. (Apelação Cível nº , de Garopaba, rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, julgado em 18/08/2011). Ademais, a rigor do art. 586 do Código de Processo Civil, indispensável é a presença dos pressupostos da liquidez, certeza e exigibilidade, de modo que, versando a contenda acerca de seguro de acidentes pessoais onde é discutida a incapacidade do exequente estipulante, a aferição de tal condição carece da exaustiva via do processo de conhecimento: PROCESSO DE EXECUÇÃO AJUIZADO CONTRA CORRETORA. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. EMBARGOS À EXECUÇÃO PROMOVIDOS PELA CORRETORA. CARÊNCIA DE AÇÃO RECONHECIDA. APELADA QUE FICOU INCAPACITADA PARA O TRABALHO E O SEGURO POR ACIDENTES PESSOAIS NÃO ESTÁ ELENCADO NO ROL DE TÍTULOS EXECUTIVOS DO ARTIGO 585, III, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. O contrato de seguro de vida tem a qualidade de título executivo extrajudicial, mas tutela apenas a vida, e, portanto, para instruir a execução, precisa ser acompanhado da certidão de óbito, o que não é o caso dos autos. A incapacidade total e completa para o trabalho da apelada deve ser coberta pelo seguro por acidentes pessoais e, por necessitar de dilação probatória, referido contrato de seguro não é considerado título executivo extrajudicial. [...] (Apelação Cível nº , de Joaçaba, rel. Des. Jaime Luiz Vicari, julgado em 11/08/ grifei). E do supracitado aresto destaco o seguinte excerto: [...] Como sustentou, após a entrada em vigor da Lei nº /2006, que alterou o artigo 585, III, do Código de Processo Civil, esse artigo, no que diz respeito aos contratos de seguro, tutela apenas o de vida. Senão, vejamos: Art São títulos executivos extrajudiciais: [...]; III - os contratos garantidos por hipoteca, penhor, anticrese e caução, bem como os de seguro de vida; Isso porque, nos contratos de seguro de vida, a comprovação é feita pela simples apresentação da certidão de óbito, ao contrário do que acontece com os contratos de seguro de acidentes pessoais de que resulte incapacidade, como é o caso dos autos, em que há necessidade de dilação probatória, muitas vezes com a realização de perícia. A respeito, valiosa é a lição de Araken de Assis: No que concerne ao contrato de seguro, definido no art. 757, caput, do CC-02, o art. 585, III, a partir da Lei /2006, tutela apenas o de vida. Por conseguinte,

8 para o seguro de acidentes pessoais, obrigatório ou facultativo, e seja qual for o dano (p. ex., danos materiais ou pessoais, resulte ou não incapacidade), caberá ação de cobrança pelo procedimento sumário, quando envolver veículos, a teor do artigo 275, II, e. O beneficiário da quantia segurada deve instruir a execução com a apólice ou o bilhete (art. 10 do Dec. -lei 73/1996; art. 758 do CC-02) e a prova do óbito. (Manual da execução. 11 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, p ). Sobre a matéria, Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, textualmente: Quanto ao seguro de vida, sua eleição como título executivo decorre da natureza do crédito por ele devido. Também por isto, admite-se que esta execução se proceda ainda que não exibida a apólice ou o bilhete de seguro (art. 758 do CC), podendo-se provar a existência do contrato de seguro pela apresentação de outro documento idôneo, como o contrato, o recibo da seguradora etc. Esta tendência é interessante, porque se trata de rara hipótese em que o título executivo não é materializado em um documento específico, podendo ser demonstrado por qualquer documento capaz de indicar a existência do contrato. Vale frisar que estes contratos são títulos executivos em si, independentemente de satisfação dos requisitos postos no art. 585, III, do CPC. Ou seja, o simples fato de estarem assegurados por estas garantias especiais, ou de versarem sobre seguro de vida, já lhes outorga a condição de título executivo, ainda que não estejam elaborados como instrumento público ou como instrumento particular assinado por duas testemunhas. Não fosse assim, dificilmente se explicaria a sua alocação fora do inciso II do artigo em exame (Execução. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 440). Então, como o seguro de vida deve vir acompanhado pela certidão de óbito, e o seguro por acidente pessoais por não estar mais elencado no artigo 585 do Código de Processo Civil não é considerado título executivo, a execução promovida pela apelada deve ser declarada extinta sem julgamento do mérito. E tampouco prospera a propalada exigibilidade do aludido Contrato - patenteada pelo que estatuem o art. 27 do Decreto-Lei nº 73/66 e o art. 5º do Decreto nº /67 -, visto que a demanda executiva não compreende satisfação de prêmio, mas, sim, da cobertura contratada. Já no tocante à pretendida redução dos honorários advocatícios de sucumbência, não vislumbro desproporção e/ou fixação em valor excessivo, bem porque o valor de R$ 600,00 (seiscentos reais) foi arbitrado pela magistrada sentenciante para ambos os processos - ação de Execução e Embargos à Execução -, e não, para cada um deles, como dá a entender o apelante, de maneira que, a se dar guarida ao pleito, alterando-se o valor para o equivalente a 1/2 (meio) salário mínimo para cada processo, resultaria a imposição em quantia ainda superior àquela já estipulada na origem. Dessarte, pronuncio-me pelo conhecimento e desprovimento do apelo, mantendo impoluta a irreprochável conclusão externada pela togada singular. É como penso. É como voto.