PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE GOIÁS SENTENÇA

Transcrição

1 MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL - Classe 2100 Impetrante: LUCAS RIBEIRO DA SILVA XAVIER Impetrado: REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS Tipo A SENTENÇA LUCAS RIBEIRO DA SILVA XAVIER impetrou o presente mandado de segurança individual, com pedido liminar, inicialmente perante a Subseção Judiciária de Jataí/GO, em face de ato acoimado de coator atribuído ao REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS, objetivando a sua matrícula ou transferência para o curso de Medicina Veterinária Bacharelado da UFG/Unidade de Goiânia. Asseverou, em síntese, ser estudante do curso de Medicina Veterinária, no campus de Jataí, e que, por motivos de saúde, não teria conseguido permanecer na cidade de Jataí/GO, estando, atualmente, em tratamento em Goiânia/GO, onde está a maioria de seus parentes. Aduziu ser inconstitucional a recusa da autoridade impetrada em autorizar a realização do mencionado curso no Campus Samambaia de Goiânia/GO, tendo em vista o direito à educação, previsto no art. 205 da CF, bem como os princípios da legalidade, igualdade, da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Alegou, ainda, que a instituição de ensino teria estabelecido o direito de estudar em casa, com acompanhamento dos docentes, mas esse procedimento não funcionou. A inicial veio instruída por procuração e documentos. Declinada a competência em favor desta Seção Judiciária do Estado de Goiás e distribuídos os autos a este Juízo, ao impetrante foram concedidos os benefícios da assistência judiciária gratuita. A Universidade Federal de Goiás manifestou o seu interesse em ingressar no feito. Pág. 1/6

2 A análise do pedido liminar foi postergado para após as informações, nas quais a autoridade impetrada alegou, basicamente: a) os atestados médicos apresentados não indicaram a obrigatoriedade de o impetrante ser transferido para o Campus Goiânia, mas apenas o afastamento das atividades acadêmicas por prazo limitado e a permanência do acompanhamento psiquiátrico e psicológico do paciente para remissão do quadro sintomático apresentado, pelo que não há prova prova pré-constituída que comprove a existência de direito líquido e certo; b) não houve pedido administrativo de transferência ex officio para o curso de Medicina Veterinária do Campus de Goiânia; c) a situação acadêmica do impetrante encontra-se em fase de recurso em relação à possível exclusão do quadro discente; d) os requisitos necessários à transferência ex officio não estão configurados, ou seja, não se trata de servidor público federal civil ou militar estudante, ou seu dependente estudante, e nem mesmo de remoção ex officio ou de mudança de domicílio decorrente desta (art. 1º da Lei 9.536/97 e art. 99 da Lei 8.112/90). O pedido de liminar foi indeferido e o Ministério Público não vislumbrou interesse público a justificar a sua atuação no feito. É o relatório. Decido Pretende o impetrante, aluno do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Goiás, no campus de Jataí, a sua matrícula e/ou transferência para a Unidade de Goiânia. A decisão que negou o pleito liminar já delineou o entendimento: (...) O art. 49 da Lei 9.394/96 1, ao definir apenas a hipótese de transferência de alunos mediante a existência de vaga e por meio de processo seletivo, optou por proteger o princípio da isonomia. A transferência obrigatória de estabelecimento de ensino superior, independentemente da 1 Art. 49. As instituições de educação superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo. Parágrafo único. As transferências ex officio dar-se-ão na forma da lei. Pág. 2/6

3 existência de vaga, é regra de exceção, em favor de servidor público removido ex officio, cujo escopo é permitir a continuidade do serviço público, sem prejuízo dos estudos do servidor estudante e seus dependentes 2 (art. 1º da Lei 9.536/97 3 e art. 99 da Lei 8.112/90 4 ). É ver, portanto, que a legislação que trata da transferência obrigatória de estudante não contempla a hipótese de tratamento de saúde. Não se está a olvidar a orientação jurisprudencial, embora vacilante, no sentido de que as garantias constitucionais do direito à saúde, à educação e à unidade familiar amparam a pretensão do estudante de ensino superior de transferência para entidade congênere para fins de tratamento médico, em face de enfermidade grave, afastando-se os entraves legais e burocráticos suscitados em âmbito administrativo 5, o que não é a hipótese dos autos. O relatório médico e psicológico, datado de 23/06/13, afirmou que avaliação médico psiquiátrica e psicológica, realizada em 18/04/13, revelou estar o impetrante acometido de instabilidade emocional, dificuldade de verbalização dos sentimentos, baixa assertividade e niilismo, sem objetivos e metas definidas, apresentando, contudo, orientação temporal e espacial, discurso lógico e coerente. Afirmou que o paciente apresentava, ainda, sintomas mistos de ansiedade e depressão, provavelmente decorrentes de situações estressoras atuais, como mudanças no ciclo de vida (mudança de cidade, mudança de ambiente social e acadêmico). Destacou encontrar-se, naquela oportunidade, em acompanhamento médico psiquiátrico e psicológico, realizando tratamento medicamentoso e psicoterapêutico que envolve consultas de avaliação e sessões de psicoterapia tanto individual como familiar. Por 2 TRF 1ª Região, Sexta Turma, AMS , Rel. Desembargador Federal Souza Prudente, DJF1 de 07/04/2008, p Art. 1º. A transferência ex-officio a que se refere o parágrafo único do art. 49 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, será efetivada, entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino, em qualquer época do ano e independente da existência de vaga, quando se tratar de servidor público federal civil ou militar estudante, ou seu dependente estudante, se requerida em razão de comprovada remoção ou transferência de ofício, que acarrete mudança de domicílio para o município onde se situe a instituição recebedora, ou para localidade mais próxima desta. Parágrafo único. A regra do caput não se aplica quando o interessado se deslocar para assumir cargo efetivo em razão de concurso público, cargo comissionado ou função de confiança. 4 Art. 99. Ao servidor estudante que mudar de sede no interesse da administração é assegurada, na localidade da nova residência ou na mais próxima, matrícula em instituição de ensino congênere, em qualquer época, independentemente de vaga. Parágrafo único. O disposto neste artigo estende-se ao cônjuge ou companheiro, aos filhos, ou enteados do servidor que vivam na sua companhia, bem como aos menores sob sua guarda, com autorização judicial. 5 TRF 1ª Região, Sexta Turma, AMS , Rel. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, e-djf1 de 27/05/2013, p.824. Pág. 3/6

4 fim, concluiu pela permanência do acompanhamento psiquiátrico e psicológico do paciente para remissão do quadro sintomático apresentado. Ora, esse é o relatório mais recente colacionado com a inicial. Consta, também, outro relatório médico, datado de 18/06/13, com idêntica descrição do quadro de saúde do impetrante, mas que concluiu pela necessidade de afastamento das atividades acadêmicas por 30 (trinta) dias. Verifico, portanto, que não foram trazidos aos autos provas suficientes a comprovar a gravidade do estado de saúde do impetrante; a possibilidade de conciliar o tratamento com os estudos, já que o relatório médico refere afastamento das atividades acadêmicas ; a impossibilidade de sua permanência na cidade de Jataí; e, sobretudo, que o seu tratamento apenas poderia ser realizado em Goiânia ou que estaria a necessitar de acompanhamento de parentes que moram nessa Capital (a prefacial sequer especifica que familiares seriam esses). Limitou-se a inicial a trazer assertivas genéricas dissociadas de prova contundente. Com efeito, ainda que houvesse comprovação da gravidade da doença do impetrante, não foge à razoabilidade supor que o seu tratamento poderia ser feito na própria cidade de Jataí, bem como com o deslocamento de algum familiar até aquela localidade. Ademais, cumpre observar que o impetrante indicou nos requerimentos feitos na instituição de ensino, na inicial, bem como na procuração, que o seu domicílio é na cidade de Rio Verde/GO, no mesmo endereço indicado como sendo o escritório do advogado que está aqui a representá-lo, tudo a denotar que esse é seu genitor, conforme documento de identidade juntado no presente mandamus. No mais, importa salientar que, malgrado o deferimento do pedido administrativo, formulado em 05/08/13, de exercício domiciliar, o impetrante não entrou em contato com a instituição de ensino para iniciar o tratamento excepcional que lhe foi disponibilizado, consoante informação fornecida pela autoridade impetrada. Os documentos trazidos pela instituição de ensino superior demonstram, ainda, que o impetrante foi excluído do quadro discente da UFG, por ter sido reprovado em todas as disciplinas do primeiro semestre do curso, estando o processo administrativo, naquele momento, aguardando prazo para interposição de recurso. Pág. 4/6

5 De tudo, é sentir que os documentos juntados pelo impetrante não são aptos a justificar o tratamento diferenciado daquele previsto na legislação, para que seja autorizada a sua transferência (art. 49 da Lei 9.394/96). Com efeito, a existência de doença, por si só, não implica em ofensa ao direito do impetrante à educação e à saúde. E, em sede de mandado de segurança, é necessário que haja lesão ou ameaça de lesão a direito líquido e certo (art. 5º, LXIX, da CF), ou seja, a direito comprovado de plano, que se apresenta revestido de prova pré-constituída, não comportando a hipótese de dilação probatória. Nisso não vislumbro o fumus boni iuris. Ausente o fumus bonis iuris, fica prejudica a análise quanto ao periculum in mora, haja vista a imprescindibilidade de concomitância dos dois requisitos para a autorização da medida postulada. Diante do exposto, indefiro a liminar. (...) Inexistem elementos hábeis a alterar o quadro fático delineado à época da análise do pleito liminar, de sorte que a tese ali esposada deve ser mantida. Desse modo, não comprovada a prática do alegado ato ilegal e arbitrário, deve prevalecer a autonomia conferida às Universidades (art. 207 da CF). Do exposto, julgo improcedente o pedido inicial e denego a segurança. Sem custas e sem honorários advocatícios. Oportunamente, arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Goiânia, vide data da assinatura deste documento. Pág. 5/6

6 Leonardo Buissa Freitas JUIZ FEDERAL Pág. 6/6