SUSTENTABILIDADE E RELIGIÃO RESUMO
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- Zaira Fraga Bento
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1 SUSTENTABILIDADE E RELIGIÃO GIOVANI MARINOT VEDOATO 1 RESUMO O presente artigo visa efetivar uma devida articulação entre o tema da sustentabilidade e a função pública da religião. Se por um lado a temática da sustentabilidade coloca-se como algo vital ao ser humano moderno, por outro, uma religião que se diz séria, não pode passar à mercê de tamanha ordem. Palavras-chaves: História, Religião, Sustentabilidade, Terra e Vida. ABSTRACT The present article aims at bringing into effect a proper articulation between the theme of sustainability and the public function of religion. If on one hand the issue of sustainability places itself as something vital to the modern human being, on the other, a religion that affirms to be serious, cannot be at the mercy of such an order. 1 O Professor Pe. Dr. Giovani Marinot Vedoato é professor de filosofia na Faculdade Castelo Branco, em Colatina ES. Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
2 Keywords: History, Religion, Sustainability, Earth and Life. INTRODUÇÃO O momento histórico presente nos coloca diante de um grande dilema: ou formamos uma aliança global em torno da preservação da vida em sentido amplo, ou caminharemos para a destruição da biodiversidade. Eis o novo horizonte que se levanta no linear do tempo corrente: romper com o paradigma antropocêntrico, instaurado no início da modernidade e avançar em direção a um novo tempo epocal. Tempo em que o humano perde a centralidade em detrimento da comunidade de vida. A vida, em suas várias manifestações como centro do universo, é uma questão sine qua non para os tempos presente e futuro da humanidade. De fato, como apontam diversos autores, ou cuidamos de tudo que vive, ou morreremos todos. Onde entra o tema da religião nessa nova pauta imposta pela centralidade da vida? Em primeiro lugar, é preciso definir o que é e para que serve a religião. Depois, apresentar uma visão religiosa em que sua função pública se torne útil e necessária. Eis o intento do presente artigo; mostrar a indissociabilidade na relação sustentabilidade e religião para os tempos atuais. SUSTENTABILIDADE Por que falarmos de sustentabilidade como algo vital nos dias de hoje? Quem sabe o preâmbulo da carta da terra, aprovada no dia 14 de março do ano 2000 pode nos ajudar. 2 Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
3 Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher seu futuro. 2 E continua: Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, redução dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos equitativamente e o fosso entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causa de grande sofrimento. 3 Como definir o tema da sustentabilidade? Uma das melhores definições é dada por Leonardo Boff: O conjunto de processos e ações que se destinam a manter a vitalidade e a integridade da Mãe Terra, a preservação de seus ecossistemas em todos os elementos físicos, químicos e ecológicos que possibilitam a existência e a reprodução da vida, o atendimento das necessidades da presente e das futuras gerações, e a continuidade, a expansão e a realização das potencialidades da civilização humana em suas várias expressões. 4 2 CARTA DA TERRA. Disponível em: 3 Ibidem. 4 Boff, L. Sustentabilidade, p. 14. Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
4 A riqueza da definição de Boff é que ela indica em termos de operacionalidade para alguns passos importantíssimos: 1º passo O cuidado com a Mãe terra Assim como os filhos são chamados a cuidarem de suas mães de forma filial, cabe aos seres humanos desenvolver esta relação amorosa e cuidadora com a Mãe Terra. Isso significa desde o não jogar papel no chão até reflorestar florestar, e desenvolver programas de preservação do planeta. 2º passo A Mãe Terra como comunidade de vida Cuidar da biodiversidade é uma questão central para pensarmos a continuidade não só das variedades de vida, mas, até mesmo, da nossa própria vida neste planeta. Em termos práticos, significa desenvolvermos o seguinte lema: Sem o cuidado com a comunidade de vida, a vida não será possível. 3º passo A generosidade como presente/futuro do Planeta Face ao descuidado com o planeta, a nova ordem seria de deslocarmos o eixo do eu para o nós, ou seja, para o eixo da generosidade operosa, que cria relações amorosas, cuidadora, elegante, cordial com todas as expressões de vida. 4º passo Interdependência humana local e global A interdependência postula objetivamente que nossa vivência em rede não nos permite hierarquizar o tema da comunidade de vida num tema periférico ou secundário. Se por um lado somos comunidade, rede, estamos inter-retro-conectados, por outro, o cuidado é vital com toda a biodiversidade. Isso porque, a vida é o centro, é ela que precisa ser defendida e garantida em sua essência. 4 Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
5 RELIGIÃO O termo religião advém do latim religio, que dá a ideia etimológica de re- -ligare, que significa religar e ligar o ser humano com Deus. Em seu livro A águia e a galinha: uma metáfora sobre a condição humana, Leonardo Boff afirma que o papel da religião é de possibilitar, em última análise, o encontro do ser humano com o divino. A função da religião é criar as condições para que cada pessoa possa realizar seu mergulho no Ser e encontrar-se com Deus. 5 Diferente da fé que é mais um atitude de adesão e entrega a Deus, a religião, ao contrário, indica para o campo da doutrina, do rito, do dogma e da liturgia. Concretamente, a religião é como se institucionaliza a fé através de hierarquia, celebrações e diversas solenidades. Portanto, ela orienta-se mais para o campo da mediação no encontro entre ser humano e Deus. Diferente da teologia que é a racionalização da fé. Enfim, religião significa o conjunto de práticas que uma pessoa ou comunidade realiza como desdobramento de sua fé religiosa. Desta forma, a religião não é um tema meta-histórico e desvinculada da cotidianidade das pessoas. Ela acontece na vida, o que, portanto, em sentido histórico, todo o seu discurso transcendente se dá a partir da imanência da vida. Consequentemente, qualquer postura dualista oriunda da racionalidade religiosa nessa perspectiva não confere com o significado último do que a palavra religião reclama para si. Então, é deveras importante falar acerca 5 Boff, L. A águia e a galinha: uma metáfora sobre a condição humana, p. 89. Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
6 da função pública da religião, ou seja, historicamente não existe religião a-histórica e neutra, ela sempre estará a serviço ou não de uma determinada visão de mundo. Objetivamente, nasce dessa ordem a necessidade de vincular adequadamente o tema da sustentabilidade com o da religião. Se a sustentabilidade orienta para a possibilidade da vida presente e futura do planeta, por sua vez, a religião indica para o comprometimento com toda comunidade de vida planetária como dom sacramental. A religião não pode ser assunto simplesmente do intra-templo, ou de sacristia como querem muitos. Sua função pública é fundamental no que tange ao cuidado com a vida do planeta. Nessa relação sustentabilidade e religião, eis algumas posturas vitais que devem nortear a prática religiosa. 1ª postura Cuidar amorosamente da vida em sentido pleno O paradigma antropocêntrico deve ser substituído pela referência comunidade de vida, ou seja, no centro não está mais o ser humano, mas a vida de forma geral. Cabe ao ser humano cuidar da vida, intendendo-se pertencente, parte integrante e não dominadora desta grande cadeia de vida que é a terra. Eis o que postula um belíssimo texto do livro do Gênesis: Tomou, pois, o Senhor Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e guardar. 6 6 Gn 2, Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
7 2ª postura Comunidade de vida Viver no planeta hoje deve significar viver com outros, participar do banquete da vida de forma interdependente, comprometida e zelosa com a nobre tarefa de construir um mundo possível como diz o evangelho de João: Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância. 7 3ª postura Generosidade com os mais pobres A centralidade na biodiversidade não exclui a opção pelos pobres, na verdade exige algo mais, como nos diz Pablo Richard: Não basta escutar o grito dos pobres e o grito da terra e optar por eles. A opção pelos pobres urge-nos, com os mesmos pobres e excluídos, a buscar alternativas concretas e críveis. A opção pelos pobres hoje, exige a reconstrução da esperança e a proposta de alternativas. Urge passar do protesto à proposta. 8 Daí, a denúncia profética de Leonardo Boff: 7 Jo 10, Richard, P. Força ética e espiritual da teologia da libertação, p. 90. Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
8 Sustentabilidade se realiza quando cada indivíduo pessoal puder viver autonomamente, ganhar seu pão, para ele e para sua família, conseguir chegar ao final do mês com as contas pagas, de alimentação, de água, de luz, de telefone, de internet, de aluguel de casa, de transporte, de educação e de outras coisas básicas da infraestrutura material. Sob este ponto de vista, grande parte da humanidade não goza de sustentabilidade: vive abaixo da linha da pobreza, sem água tratada, sem esgoto, sem e com má nutrição. 9 4ª postura Construir uma sociedade do bem-viver Uma sociedade do bem-viver significa optar por um modelo de vida onde não se consome mais do que aquilo que o ecossistema pode suportar. Significa equilibrar adequadamente produção, reutilização e reciclagem. Em perspectiva religiosa, significa estar bem com os outros existentes e com Deus conforme Boff: Bem-viver é estar permanentemente em harmonia com o Todo, harmonia entre marido e mulher, entre todos na comunidade, celebrando os ritos sagrados que continuamente renovam a conexão cósmica e com Deus. 10 CONSIDERAÇÕES FINAIS A relacionalidade proposta entre sustentabilidade e religião conduz de maneira objetiva a algumas conclusões: 9 Boff. L. Sustentabilidade, Ibidem, p Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
9 1ª conclusão Contemporaneidade do tema sustentabilidade Urge ao tempo presente, a formação de uma aliança global para cuidarmos da terra e de toda sua biodiversidade. Do contrário, teremos que conviver com a matança da diversidade da vida e com a possibilidade da destrutividade do planeta; 2ª Conclusão Não existe religião neutra, ou religiões em cima do muro. Toda religião é histórica o que, portanto, significa pensar no compromisso ou na omissão do sistema religioso em geral frente ao tema da sustentabilidade. 3ª Conclusão Avançar na temática sustentabilidade e religião, mais que elaborar caminhos conceituais, significa pensar operacionalidades práticas constantes no intuito de que a continuidade e a vitalidade do planeta sejam possíveis; 4ª Conclusão Por fim, não é justo, nem ético e muito menos lúcido, pensar numa dicotomia entre sustentabilidade e religião. Isso porque, sustentabilidade e religião bem articuladas, podem apresentar um caminho seguro à luz da fé, da presença de Deus entre nós. Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
10 REFERÊNCIAS BOFF, L. A águia e a galinha: uma metáfora sobre a condição humana. Petrópolis: Vozes, 2001., Ethos mundial. Rio de Janeiro: Sextante, 2003., Sustentabilidade. Petrópolis: Vozes, GADOTTI, M. Pedagogia da terra. Petrópolis: Ed. Da Fundação, RICHARD, P. Força ética e espiritual da teologia da libertação. São Paulo: Paulinas, TOURAINE, A. Um novo paradigma para compreender o mundo hoje. Petrópolis: Vozes, Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 03 - janeiro/junho de
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