DENIS WARREN. Entrevista

Transcrição

1 Entrevista texto e entrevista: Luciano Vieira Entrevistamos o guitarrista brasileiro radicado em Londres, para saber sobre sua carreira, seus projetos e também as diferenças entre ser músico no Brasil e na Europa. DENIS WARREN

2 1- Quando começou a se interessar por música? Meu interesse por música veio naturalmente pois, cresci imerso nesse mundo, meu pai é pianista e costumava estudar em casa. Ele é inglês e teve uma formação clássica no Reino Unido, mas mudou-se para o Brasil Rio de Janeiro, logo depois de casar. Desde cedo a música estava presente de forma rotineira, seja através da apreciação ao vivo do repertório clássico de compositores como Bach, Mozart e Chopin, das gravações de bandas como os Beatles ou no choro e samba da vida carioca. 2-Qual a sua formação? Aprendi a tocar guitarra sozinho logo depois que me mudei para Florianópolis na década de 80. O acesso a informação era bastante limitado então o melhor recurso era o ouvido. Lembro de colocar fitas K7 no aparelho de som e reproduzir uma música por partes até aprender a tocar os riffs e os solos. Muitas vezes era difícil ter certeza se o que eu estava tocando era o mesmo da gravação, então a última avaliação era a das outras pessoas, se achavam que soava parecido meu trabalho estava feito. Algumas vezes eu conseguia comprar uma revista de guitarra importada como a Guitar World, ou pegava emprestado alguma videoaula ou livro de outro guitarrista. Era um verdadeiro garimpo de informação e tudo que vinha de novo era precioso. Toda a parte de teoria musical pude aprender com o meu pai já que a linguagem era universal, só tive que fazer pequenas adaptações ao meu instrumento. Frequentei também diversos workshops e cursos ministrados por diferentes instrumentistas, o que me fez encarar o processo musical de forma ampla e que me motivou a buscar o domínio de outras linguagens além do rock e metal, entre elas o jazz, blues e a música brasileira. Fiz vestibular de música e frequentei a universidade por alguns anos assistindo principalmente as aulas que podiam contribuir de forma efetiva no meu desenvolvimento musical. Não tive interesse em conquistar o diploma, por isso deixei de lado algumas das matérias pedagógicas, redundantes ou não relacionadas com música. Outra coisa que me fez consolidar o aprendizado de música foram os anos de aulas que tive que ministrar para alunos de perfis variados. Cada um tem uma forma de aprender e sempre foi o meu objetivo conseguir transmitir a informação de forma eficiente, buscando m u i t a s v e z e s abordar um a s s u n t o por outros ângulos.

3 3- Qual é o seu set-up, ele é o mesmo em estúdio e no palco? Não, é bem diferente e tudo depende de qual projeto estou participando. No meu primeiro album DEEP usei um set simples com duas guitarras Castelli, um cabeçote Orange Tiny Terror e outro cabeçote Peavey Triple X, os dois plugados numa caixa 4 x 12 com falantes Jensen. No meu álbum novo, o HIGH, o produtor Alexei Leão sugeriu que cada parte fosse gravada com um timbre novo, dessa forma salientando a característica natural do trecho. Um riff blues receberia uma timbragem específica, uma música pesada seria gravada com um Hi-Gain, um solo limpo de jazz com uma guitarra semi-acústica e assim por diante. Acabamos afinal usando 9 guitarras, 6 amplificadores, 2 caixas, 2 pré-amplificadores e. 1 pedal de distorção. Ao vivo a concepção é bem diferente, costumo simplificar o caminho do sinal e ter o controle inteiro na mão. Se o projeto for o meu trabalho solo uso 3 guitarras, uma Castelli com afinação normal e outra em Db e uma Fender Stratocaster também com afinação normal. Geralmente uso apenas um amplificador que pode ser desde um Marshall DSL até um Orange TH30. De pedais apenas um delay e um booster. Tenho um outro projeto que é uma banda de rock progressivo inglesa, onde preciso explorar de forma mais ampla a tessitura timbrística do instrumento. Costumo usar apenas duas guitarras com afinação padrão, mas amplio o set de pedais usando além do delay e booster um Digitech Whammy 4, um Harmonizer e um Loop Station. Além disso, toco com frequência em pubs de Londres com um trio chamado Bossarockers que mistura bossa e choro com uma pegada roqueira. Trabalhamos com um vocal feminino, um violão de 7 cordas e uma guitarra. Costumo simplificar bastante o set usando apenas uma Fender Stratocaster e um Vox Lil' Night Train com um pedal de delay. 4- Quais são suas influências? Coloco como influência tudo que contribuiu para o meu engajamento musical e para a consolidação do meu ouvido e estética. No começo foi a música clássica e as bandas de rock britânicas. Logo depois o rock progressivo, o metal e os trabalhos instrumentais de guitarristas como o Steve Vai, Joe Satriani, Yngwie Malmsteen e Greg Howe. Com o meu estudo musical passei a conhecer estilos diversos que passaram a moldar a minha forma de pensar e fazer música como o choro, a bossa, tango, jazz, blues e música contemporânea. Sempre tive muita curiosidade musical, seja descobrindo técnicas ou sonoridades diferentes, e foi trilhando esse caminho que conheci músicos que tomo como referência até hoje como Scott Henderson, Allan Holdsworth, Chick Corea, Frank Gambale, Egberto Gismonti, Villa Lobos, Tom Jobim, John Coltrane, Miles Davis e Joe Pass.

4 5- O que te motivou a sair do país, mesmo tendo uma carreira consolidada como guitarrista e professor? A busca pelo novo, a vontade de me desprender da vida que estava levando e descobrir uma lógica musical nova, um mercado e uma sistemática profissional diferente daquela em que estava acostumado. Foi uma forma de ter um tempo apenas pra mim e para as minhas vontades musicais. Em primeiro lugar uma oportunidade p a r a r e i n i c i a r a c a r r e i r a e experimentar caminhos que nunca tinha tomado. Depois como uma forma de repensar a minha relação com a música e entender como eu poderia ampliar o meu universo profissional. 6- Você é um músico experiente, com muita bagagem, por isso te pergunto quais as diferenças de se tocar música instrumental no Brasil e na Europa? A música instrumental requer um público adepto, que esteja acostumado e que aprecie música sem vocal, sem letra. Que muitas vezes é densa e dissonante, com uma característica abstrata forte. E esse tipo de platéia é escasso, tanto no Brasil quanto na Europa. Você nunca irá fazer um show em um estádio tocando música instrumental, tem que aceitar que o número de pessoas será pequeno. Mas a paixão pelo estilo alimenta o ânimo e a busca pela superação a cada apresentação justifica as condições. Em Londres as oportunidades são muitas, existem inúmeras casas de shows, pubs e arenas, mas existe muita banda. Então é mais fácil levar 300 pessoas para um show instrumental no Brasil do que aqui. 7- Seu site é um dos mais elaborados que já vi, com muita informação sobre sua carreira e também dicas de lições e exercícios. Qual a importância da internet na divulgação de um artista hoje e também que dicas você daria para quem quer divulgar um trabalho? A internet é um veículo para a propagação da informação imprescindível para o artista em a s c e n s ã o. E l a t e m u m a característica democrática forte onde cada publicação, página ou idéia tem o potencial de percorrer as diversas camadas sociais e culturais. É o mecanismo para quem não tem dinheiro transbordando, onde o sucesso de uma empreitada é medida através da aceitação do público. É muito difícil se promover sozinho, requer tempo e direcionamento. Por isso sempre recomendo criar material, seja vídeos, aulas ou textos, com que o público se identifique, que possa tirar proveito. Assim a divulgação será conquistada através do compartilhamento e a propagação será exponencial. Veja o clipe da música Cold Fusion

5 8- O que você pensa de instrumentos virtuais e se você já utilizou algum? Sou um defensor do verdadeiro, do equipamento palpável, que pode ser manipulado de forma mecânica. Mas entendo a função e finalidade do virtual e respeito a sua posição no mercado. De qualquer maneira tenho um Line 6 Pod HD que simula amplificadores, microfones e pedais que uso conectado via USB no computador para fazer pré-produções de forma prática. Mas na hora do trabalho sério, de registrar um produto final, nunca abro mão do equipamento de verdade, acho que soa muito melhor, tem um som mais orgânico, limpo e responde melhor a execução musical. Tenho instalado o Guitar Rig e já explorei o software como curiosidade. Acho interessante para aqueles que estão começando, pois permite experimentar as diversas concepções da geração timbrística, mas não pode ser a única fonte de referência sonora, pois ainda está aquém do hardware tradicional. 9- Quais são seus próximos projetos? tocaremos no maior festival de progressivo de Londres o Resonance Rock Festival. 10- Denis, obrigado pela entrevista e, por favor, deixe uma mensagem para nossos leitores e também seus contatos para quem quiser saber mais sobre seu trabalho. Obrigado demais pela oportunidade! E para os leitores, se você está lendo esta entrevista fico feliz em saber que você não faz parte da tendência ao imediatismo. Um aspecto fundamental para o aprendizado musical é a determinação em aprender, e isso transcende o meio. Informação de qualidade não é fácil de encontrar, por isso aprenda com livros, professores, observando, conversando, escutando, ache o conhecimento nas fontes remotas. Pense e reavalie o seu processo de estudo, faça lógica, mude o seu ponto de vista. Aprender não é fácil, mas a recompensa é única. Para conhecer o meu trabalho instrumental e ter acesso as minhas aulas online acesse o meu site: Logo vou colocar no ar um site exclusivo para o ensino de guitarra e música, que irá contar com diversos outros profissionais do ramo. Estou escrevendo um album de rock instrumental para trio, sem dobras de guitarra. Tudo muito simples com uma linha de bateria, uma de baixo e uma de guitarra. Também estou terminando de escrever meu primeiro album de fusion onde exploro harmonias mais complexas e caminhos melódicos novos. Esse ano vou gravar um álbum novo com a minha banda de rock progressivo e estamos terminando de agendar uma pequena tour, com a primeira data marcada para agosto quando discografia: Links para conhecerem os trabalhos de Denis Warren: