A Utilização das Tecnologias Assistivas pelo Terapeuta Ocupacional como meio facilitador da Inclusão

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1 A Utilização das Tecnologias Assistivas pelo Terapeuta Ocupacional como meio facilitador da Inclusão A UTILIZAÇÃO DAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PELO TERAPEUTA OCUPACIONAL COMO MEIO FACILITADOR DA INCLUSÃO ESCOLAR E SOCIAL DA PESSOA COM NECESSIDADES ESPECIAIS RELATO DE EXPERIÊNCIA MAGALI HELENE SOZO[1] PATRICIA MARTINS FERREIRA[2] Resumo O acelerado avanço tecnológico das últimas décadas tem trazido mais praticidade para o dia a dia das pessoas, modernizando e ampliando o acesso à informação e comunicação. Para as pessoas com necessidades especiais, mais do que facilidade, a tecnologia abre novos caminhos, expandindo as possibilidades de atuação no meio e de interação. Pensando nisso, a terapia ocupacional aliou se às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), buscando a acessibilidade e a inclusão destes indivíduos. O presente estudo tem como objetivo apresentar aos terapeutas ocupacionais os benefícios da utilização das TICs como recurso terapêutico na reabilitação e inclusão de indivíduos com necessidades especiais. Trata se do relato da experiência de um projeto do setor de terapia ocupacional do Centro Estadual de Apoio ao Deficiente (CEAD), em Goiânia, com 10 pacientes que apresentam mobilidade reduzida como sequela de lesão encefálica, onde são utilizados recursos de informática durante os atendimentos, visando principalmente a melhoria da independência funcional e a inclusão sócio educacional destes indivíduos. Os usuários vêm demonstrando grande aceitação pelo projeto, demonstrando maior interesse e motivação para aprender. Obtiveram ganhos evidentes com melhora na autonomia e independência funcional, nos aspectos cognitivos, controle motor, função manual, auto estima, comunicação e interação, o que refletiu nos campos educacionais, profissionais, sociais e até nos relacionamentos familiares destes indivíduos. As TICs tornaram se, portanto, importantes aliadas da terapia ocupacional no auxílio à inclusão educacional e social das pessoas com necessidades especiais. Palavras chave: Equipamentos de Auto Ajuda; Tecnologia da Informação; Terapia Ocupacional; 1/9

2 THE USE OF ASSISTIVE TECHNOLOGY BY OCCUPATIONAL THERAPISTIS AS FACILITATOR OF EDUCATION AND SOCIAL INCLUSION OF PEOPLE WITH SPECIAL NEEDS EXPERIENCE REPORT Abstract: The quick technological advances of recent decades have brought more practical for day to day life of people, modernizing and expanding access to information and communication. For people with special needs, rather than ease, the technology opens new avenues, expanding the possibilities of action and interaction in the middle. Thinking about this, occupational therapy allied to the Information and Communication Technologies (ICTs), seeking to accessibility and inclusion of these individuals. This study aims to provide occupational therapists the benefits of using ICT as a therapeutic resource in the rehabilitation and inclusion of individuals with special needs. This is the story of the experience of a sector project in occupational therapy from the State Center for Disability Support (CEAD), in Goiania, with 10 patients with reduced mobility as a sequela of brain injury, where computing resources are used during the attendances, mainly targeting the improvement of functional independence and social and educational inclusion of these individuals. The users have shown great acceptance by the project, showing a greater interest and motivation to learn. Gains obtained with obvious improvement in functional autonomy and independence in cognitive, motor control, hand function, self esteem, communication and interaction, which resulted in the fields of education, professional, social and family relationships even in these individuals. ICTs have become, therefore, important allies of occupational therapy to help in the educational and social inclusion of people with special needs. Keywords: Self Help Devices; Information Technology; Occupational Therapy 2/9

3 INTRODUÇÃO As novas descobertas da tecnologia surgem a cada dia para facilitar a vida do homem, todavia, em resposta ao progresso acelerado da humanidade, é exigido do homem que se adapte ao meio para que não fique para trás nessa corrida pela evolução. As pessoas com necessidades especiais não devem ficar de fora deste progresso. Pensando nisso, a terapia ocupacional que tem como objetivo central auxiliar os indivíduos na melhora do seu nível independência e autonomia, adaptando se às exigências do meio, aliou se à tecnologia da informática buscando facilitar a inclusão desta clientela no mundo digital e, ao mesmo tempo, utilizar da infinidade de possibilidades que o computador oferece para adotá lo como um potente recurso terapêutico, mais interessante e estimulador que a maioria dos recursos comumente utilizados e que permite uma gama maior de possibilidades de desenvolvimento. Por meio do uso computador, diversos aspectos enfocados pela terapia ocupacional podem ser trabalhados, como os aspectos motores cognitivos, as atividades da vida prática, atividades laborativas e de lazer, tornando se assim uma ação complementar aos atendimentos realizados (WATANABE et. al; 2003). Nesta perspectiva, o computador tornase um grande aliado da terapia ocupacional em busca da inserção social e melhoria da qualidade de vida das pessoas com necessidades especiais, o que justifica a relevância desta pesquisa. 3/9

4 O presente estudo tem como objetivo apresentar aos terapeutas ocupacionais a experiência de um projeto que vem sendo desenvolvido em uma instituição da cidade de Goiânia, comprovando os benefícios da utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) como recurso terapêutico na reabilitação e inclusão de indivíduos com necessidades especiais. MÉTODO Trata se do relato da experiência de um projeto desenvolvido pelo setor de terapia ocupacional do Centro Estadual de Apoio ao Deficiente (CEAD), localizado em Goiânia Goiás, desde março de 2008, com 10 pacientes, que apresentam mobilidade reduzida como sequela de lesão encefálica. O CEAD é uma unidade da Secretaria Estadual de Cidadania e Trabalho que presta serviços a pessoas com deficiência física, auditiva, visual, mental, síndromes (exceto autismo), atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor (ADNPM) e dificuldades de aprendizagem associada a alguma deficiência, sem limite de idade ou distinção de classe social, que necessitem de habilitação e/ou reabilitação, objetivando promover a sua inserção e/ou re inserção social. A instituição conta, entre outros, com os serviços de alfabetização em Braille, apoio pedagógico, arte educação, atividades da vida diária, estimulação precoce, estimulação visual, fisioterapia, fonoaudiologia, Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), natação, odontologia, psicologia, psicomotricidade, psicopedagogia, serviço social e terapia ocupacional. Os participantes do projeto são pacientes que estavam em atendimento no setor de terapia ocupacional e foram inseridos no projeto. Constituem se em 10 pacientes, de ambos os sexos, sendo 70% do sexo feminino e 30% do sexo masculino, que possuem idade entre quatro e 36 anos, sendo 60% crianças em idade pré escolar e escolar, 20% adolescentes e 10% adultos. 100% dos integrantes do projeto apresentam restrição na mobilidade como seqüela de lesão encefálica. RESULTADOS E DISCUSSÃO O paciente com uma lesão cerebral, seja ela secundária à paralisia cerebral, acidente vascular encefálico ou traumatismo cranioencefálico, apresenta, na maioria das vezes, comprometimento motor significativo, tornando o trabalho da terapia ocupacional muitas 4/9

5 vezes repetitivo e de certa forma lento na visão do paciente. Foi com essa preocupação que se buscou o computador como um aliado mais dinâmico e presente nos atendimentos da terapia ocupacional. Os pacientes são atendidos duas vezes por semana, individualmente ou em grupos, com a utilização de recursos de informática, tais como softwares de jogos de desafio, agilidade, memorização, competição, raciocínio lógico e atividades na internet, como pesquisar e discutir assuntos, redigir e enviar s. Na escolha das atividades são considerados os fatores culturais e o interesse de cada paciente. O objetivo geral do atendimento é utilizar do computador como meio motivador e estimulador da promoção da independência funcional e autonomia destes pacientes. Os objetivos específicos são variados, indo de acordo com a necessidade específica de cada um. Os objetivos com paciente adulto foram principalmente despertar o interesse para a realização de atividades cotidianas e atividades profissionais, estimular a comunicação escrita e verbal, e possibilitar a procura de novos caminhos para agir e produzir. Já os objetivos com os adolescentes giram em torno da melhora dos aspectos cognitivos e comportamentais, da aceitação de regras e limites, da persistência, dos aspectos psicomotores, principalmente coordenação motora fina, da função manual e destreza; promover momentos de lazer, a descoberta de novas possibilidades e ainda prepará los para a sua inclusão profissional. Os objetivos com as crianças são estimular desenvolvimento psicomotor (lateralidade, esquema corporal, imagem corporal, equilíbrio, noção de cores, formas, espaço, seqüência, ritmo), os aspectos cognitivos (memória, atenção, raciocínio, orientação), a tolerância a frustrações, o sentimento de disputa, limites, melhorar a capacidade de comunicação, verbalização, planejamento e habilidade numérica, além de promover a socialização. A autora Luzia Iara Pfeifer, em seu artigo: A utilização do computador como recurso terapêutico ocupacional confirma a importância no computador como recurso auxiliar na aquisição destes objetivos destacados. Para a autora, o computador pode ser um instrumento de comunicação em caso de crianças gravemente comprometidas em seu aspecto motor; pode também ser um estímulo a portadores de deficiência mental na aquisição de conhecimentos pedagógicos através da ludicidade dos softwares educativos; além de auxiliar crianças com déficit de aprendizagem através do desenvolvimento da independência do processo de aprendizagem, na memorização de conteúdos de forma prazerosa, na identificação dos próprios erros através do corretor ortográfico e a possibilidade de corrigir sozinho. 5/9

6 Cabe ao terapeuta ocupacional ter domínio desse recurso e, principalmente, identificar as dificuldades e facilidades da criança a ser atendida, além de analisar as necessidades de adaptações para a utilização do computador, para propiciar o desenvolvimento satisfatório da criança. Assim, é necessário que se realize uma seleção cuidadosa dos programas que serão utilizados, considerando a acessibilidade ao equipamento, os aspectos posturais, o quadro clínico que o paciente apresenta e suas implicações, as adaptações necessárias, o interesse e as demandas do paciente. Ao eleger o programa que será utilizado, é imprescindível analisar se as habilidades que ele requer são apropriadas para as demandas com as quais se está lidando. Os elementos chaves nessa seleção são: as habilidades físicas, cognitivas e afetivas exigidas para a utilização do programa, as diversas habilidades requeridas e a velocidade necessária para o processamento destas habilidades (WATANABE et. al; 2003). Para ser utilizado como recurso terapêutico o computador precisa ser adaptado às necessidades de cada paciente, em relação aos aspectos ergonômicos, e ao uso de adaptações que possibilitem ou facilitem o acesso e graduação das atividades e softwares que serão utilizados. Para a acessibilidade ao computador são criados e utilizados recursos de acessibilidade, desenvolvidos aproveitando os potenciais remanescentes do paciente para facilitar o seu acesso à maquina, sendo compreendidos como recursos de tecnologia assistiva, que se constituem de adaptações funcionais, de hardwares e/ou de softwares (OLIVEIRA, 2007). Adaptação é um ramo da tecnologia assistiva que pode ser definido como modificação da tarefa, método e meio ambiente, para a promoção da independência e função. O ato de adaptar promove ajuste, acomodação e adequação do indivíduo a uma nova situação (TEIXEIRA, ARIGA; YASSUKO, 2003). Dos pacientes atendidos pelo projeto, 50% possuem distúrbios de movimento relacionados a ataxia ou a presença de componentes atetóides, com os quais são utilizadas adaptações que permitam maior controle do movimento. Os demais pacientes possuem espasticidade de moderada à grave, sendo necessárias adaptações que favoreçam principalmente o controle postural, ampliem a capacidade de alcance e facilitem o acesso às atividades. Foram introduzidas adaptações tais como desentupidor de pia para minimizar as reações associadas em pacientes com sequela de hemiplegia, cadeira de rodas adaptada, mesa recortada, contensor, pulseira de peso, ponteira, jogos adaptados nos quais não há necessidade de clicar, apenas mover o mouse, entre outras adaptações de maior complexidade. 6/9

7 Alguns participantes apresentaram resistência à utilização das adaptações, o que desenvolveu neles a persistência, onde o próprio paciente buscou descobrir formas de manusear o mouse sem precisar de adaptações. Vale ressaltar que as adaptações favorecem um condicionamento. Algumas crianças no início dos atendimentos necessitavam do uso de contensor, agora conseguem controlar os movimentos e não precisam mais dele. No início houve criança que apresentou resistência ao uso do computador, dizendo que não gostava, porém mascarando o medo de não conseguir dominá lo. As atividades foram graduadas para que ela conseguisse, o que fez com que despertasse o seu interesse, ao acreditar no seu potencial, então aos poucos foram sendo introduzidas atividades de maior complexidade. A utilização do computador como aliado da terapia ocupacional vêm demonstrando grande aceitação pelos usuários do CEAD e principalmente um estimulo para novas formas de aprendizado. As crianças demonstram interesse para aprender, estímulo para movimentar os membros superiores, seus ganhos são notórios. Em cada atendimento trazem consigo o aprendizado anterior. O ganho maior foi a socialização e principalmente a interação com a família que se tornou parte da equipe interagindo aos atendimentos propostos, podendo ela mesma perceber o potencial de seu filho. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para as pessoas, a tecnologia torna as coisas mais fáceis. Para as pessoas com deficiência, a tecnologia torna as coisas possíveis (RADABAUGH, 2001, p.13 apud OLIVEIRA, 2008). O computador é um meio estimulante que facilita a aprendizagem, proporciona oportunidades de realização de atividades que não seriam possíveis sem seu auxílio, aumenta a motivação e as perspectivas dos pacientes e potencializa o processo de reabilitação (WATANABE et. al; 2003). Fornece ambientes de aprendizagem e oferece novos caminhos possíveis para a pessoa, sem limitar o seu potencial ou restringir a sua capacidade (FILHO, et. al; 2006). Por meio da atividade de utilização do computador, há a criação de novas possibilidades e finalidades na intervenção de terapia ocupacional, já que proporcionam um conhecimento e uma experiência de acordo com os seus próprios interesses, necessidades e potencialidades, e lhes oferecem instrumentos para seu próprio uso, ampliando a 7/9

8 comunicação, possibilitando crescimento pessoal, autonomia, interação social e inclusão cultural (WATANABE et. al; 2003). Para a estimulação da pessoa com deficiência, a tecnologia da informação se torna fundamental, pois a velocidade da renovação do saber e as formas interativas da informatização trazem uma nova perspectiva de educação para essa clientela. Portanto, torna se necessário desenvolver serviços e propostas educativas abertas e flexíveis que atendam às necessidades de mudanças (MACIEL, 2000). O aprendizado adquirido em terapia, com a utilização do computador como recurso, tem refletido em outras esferas da vida destes indivíduos, contribuindo para melhora dos aspectos psicossociais e na execução das atividades da vida diária, prática e lazer. As TICs tornaram se, portanto, importantes aliadas da terapia ocupacional no auxílio à inclusão educacional e social das pessoas com necessidades especiais. Pode se afirmar pelo exposto que o Computador é um grande aliado no processo de inclusão da pessoa com deficiência. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FILHO, R. O. et al. O uso do software comunique como recurso tecnológico no processo de ensino e aprendizagem de alunos com paralisia cerebral. Nov Tecnol Educ. v. 4 n. 2, p. 1 9, dezembro/2006. Disponível em: acesso em: MACIEL, M. R. C; Portadores de deficiência: a questão da inclusão social. São Paulo Perspec. [online]. 2000, vol.14, n.2 OLIVEIRA, A. I. A; Softwares Adaptados de Computador. In: CAVALCANTI, A; GALVÃO, C; Terapia Ocupacional: Fundamentação e Prática, Guanabara Koogan, OLIVEIRA, A. I. A. et al. Tecnologia de ensino e tecnologia assistiva no ensino de crianças com paralisia cerebral. Ciências & Cognição v. 13 n. 3, p , dezembro/2008. PFEIFER, L.I. A utilização do computador como recurso terapêutico ocupacional. Disponível 8/9

9 em: Acesso em: 04/06/2009 TEIXEIRA, E.; ARIGA, M. Y.; YASSUKO, R. Adaptações. In: TEIXEIRA, E.; SAURON, F. N.; SANTOS, L. S. B.; OLIVEIRA, M. C. Terapia ocupacional na reabilitação física. São Paulo: Roca, p RADABAUGH, 2001, p.13 apud OLIVEIRA, A. I. A. et al. Tecnologia de ensino e tecnologia assistiva no ensino de crianças com paralisia cerebral. Ciências & Cognição v. 13 n. 3, p , dezembro/2008. Disponível em: acesso em: WATANABE, M. K. F. et al. Terapia Ocupacional e o uso do computador como recurso terapêutico. Acta Fisiátrica v.10, n.1, p , abril/2003. Disponível em: acesso em: [1] Terapeuta Ocupacional do Centro Estadual de Apoio ao Deficiente (CEAD) e Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais de Goiânia (APAE GO); Especialista em LER/DORT. E mail: maga.sozo@hotmail.com [2] Terapeuta Ocupacional do Hospital Dia do Idoso (HDI); Pós graduada em Reabilitação dos Membros Superiores. E mail: pati mferreira@hotmail.com 9/9