Laboratório Regional de Enologia dos Açores Valências e Potencialidades 1. Paulo Barros Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto
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1 Laboratório Regional de Enologia dos Açores Valências e Potencialidades 1 Paulo Barros Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto Conceber uma nova estrutura neste caso o Laboratório Regional de Enologia dos Açores - é estabelecer um compromisso entre múltiplos aspectos políticos, técnicos e funcionais que devem conduzir a que a futura estrutura seja útil, funcional, que origine progresso. É um equilíbrio de racionalidade entre aquilo que poderia apetecer construir e os meios financeiros disponíveis para tal. É ter parcimónia na utilização de recursos públicos, É dar um instrumento de apoio concreto ao desenvolvimento da Região. Com proximidade. É projectar uma estrutura adequada à utilização agradável dos seus utentes e trabalhadores. Estávamos em 2006: Os Açores careciam de uma estrutura local que permitisse melhorar a qualidade dos seus vinhos, que desse apoio de proximidade aos seus vitivinicultores, que permitisse dar resposta pronta, para ser eficaz, às diversas solicitações do foro analítico que surgiam cada vez em maior número, que permitisse que os vinhos outrora famosos além-mar o voltassem a ser de forma moderna e consistente. Hoje, qualquer mercado é exigente. Não basta que o vinho seja apetecível do ponto de vista organoléptico. A sua composição intrínseca, não observável pelo consumidor, pode ser tão importante quanto o é o seu aspecto, cor, aroma e sabor. Estamos num mundo globalizado em que os produtos concretamente os produtos agro-alimentares, com é o vinho, - não se afirmam pelo que parecem, mas por aquilo que efectivamente são. De facto, caracterizar-se concretamente aquilo que se tem é o primeiro passo para se lançarem novos voos para um produto que faz parte da mais íntima tradição destas 11 Palestra proferida no Seminário Vitivinicultura Atlântica Construir o Futuro, Ilha do Pico,, organizado pela Cooperativa Vitivinícola da Ilha do Pico, Açores, em 11 de Junho de
2 ilhas, que é um vector de desenvolvimento económico que constitui com as suas vinhas um ícone mundial. Levar este vinho aos mercados onde os nossos portugueses aí residentes podem ser instrumento da sua promoção, implica que não se avance com pés de barro, não se matando à nascença qualquer iniciativa de implantação em mercados altamente exigente como são, por exemplo, os EUA - por mera razão composicional dos vinhos. Isto é não só uma fragilidade local, regional, como também nacional. Não me cansarei de chamar a atenção para que qualquer campanha de promoção de vinhos em mercados exigentes deve ter assegurada a retaguarda. E a retaguarda é um conhecimento intrínseco do produto. É prevenirem-se eventuais barreiras comerciais de natureza composicional. É respeitarem-se regras de comercialização cada vez mais exigentes do ponto de vista nutricional os alérgenos, os pesticidas, os compostos potencialmente nocivos para a Saúde. São os metais pesados, os compostos voláteis tóxicos. São todos os aspectos que as organizações ditas de defesa dos consumidores apontam ao vinho, ao álcool e aos aspectos negativos dele decorrentes, mas o novo enquadramento que o vinho progressivamente vai tendo o ser tratado como um produto alimentar, com as regras de segurança cada vez mais apertadas. Como todas as empresas multinacionais bem sabem e asseguram, não haveria qualquer campanha de comunicação, por mais potente que fosse, que consiga atenuar os danos que o surgimento de uma notícia negativa para a saúde ou segurança dos consumidores provoca na imagem do produto. É uma destruição que não afecta apenas a marca com possíveis culpas, mas todos os produtos equivalentes, mesmo que completamente inocentes. Veja-se o caso recente dos pepinos espanhóis. E se tal sucedesse com o vinho? Que retaguarda conseguíamos nós assegurar em Portugal? Que meios teriam para tal as instituições vitivinícolas que se devem ocupar da fiscalização e controlo dos produtos? Pedia-se a intervenção das Universidades? Estariam estas dispostas para tal e no momento? No fundo, competirá à Universidades serem os defensores de retaguarda ou serem tropas avançadas? Foi neste contexto de reflexão que este desafio surgiu. Foi isso que tentámos cumprir ao aceitarmos participar na equipa de projecto para a criação de raiz do novo Laboratório Regional de Enologia dos Açores, em Madalena do Pico. Este desafio começou, talvez em 2006, quando estive pela primeira vez nesta maravilhosa ilha, frente a um rude buraco no solo vulcânico, junto a uma adega onde provei uns promissores vinhos experimentais. 2
3 Tudo não era mais do que um sonho. Começava um brain storming entre pessoas com o mesmo intuito: saber qual seria a dimensão adequada para a estrutura do futuro Laboratório Regional de Enologia, que valências aí instalar, com que meios financeiros poderíamos contar, quem iríamos nós servir e de que forma. No fundo estávamos precisamente no como começar. Foi-nos pedido que o novo laboratório pudesse acorrer às necessidades imediatas da Região em termos de análise de vinhos com vista à melhoria da sua qualidade; que fosse uma estrutura versátil, adaptável a novas solicitações no campo analítico. Deverse-ia assegurar a segurança de funcionamento e respeitar-se a sustentabilidade ambiental. Deveriam ainda ser respeitadas todas as normas técnicas na estrutura a criar, por forma a permitir a futura acreditação do laboratório e da câmara de provadores. E o que se pretendia como resposta do futuro laboratório? Todo o nosso esforço foi dirigido para que pudesse vir ser (i) um marco da afirmação da importância da Enologia da Região; (ii) um local de apoio enológico aos pequenos produtores das ilhas; (iii) um instrumento de apoio à certificação de dos produtos vitivinícolas da Região; (iv) um instrumento de apoio à consolidação das marcas e à exportação. Não podendo ter a veleidade de ser um laboratório onde todo o tipo de análises se pudesses realizar, deveria (v) constituir-se como centro de referência para subcontratação de serviços analíticos a outros laboratórios, nacionais ou internacionais. Naturalmente que numa estrutura que se vai criar de raiz, devem promover-se soluções arquitectónicas bem ponderadas. O projecto de um laboratório é sempre uma resposta a vários desafios: a segurança, a flexibilidade, o ambiente e o planeamento de custos de eficiência energética. Um moderno laboratório deve permitir flexibilidade suficiente para futuras mudanças devido à evolução rápida e constante na tecnologia e nos equipamentos e às alterações no tipo de análises que aí são praticadas. Os arquitectos, ou melhor, as equipas de projecto, devem esforçar-se por criar laboratórios sustentáveis, que minimizem os impactos ambientais e, além disso, devem optimizar a eficiência de todo o edifício, tendo como base o seu ciclo de vida. O planeamento de uma infra-estrutura laboratorial moderna deve ter em consideração não apenas a sua utilização imediata, mas também incluir o reconhecimento das 3
4 necessidades futuras em termos de flexibilidade - independentemente da escala de trabalho em causa ou a disciplina científica envolvida - pois a necessidade de mudança resulta da evolução rápida e constante na tecnologia e nos equipamentos de análise. Nas últimas décadas, ocorreu uma notável mudança no layout dos laboratórios, decorrente de alterações que se operaram no tipo de análises que aí passaram a ser praticados. Os métodos analíticos clássicos (Wet Chemical Methods) deram lugar aos métodos instrumentais de análise (Dry Chemical Methods), onde predominam os aparelhos electrónicos. A tomada de consciência de que o trabalho diário de um laboratório é muito semelhante, na maioria dos casos, a uma linha de montagem - onde a amostra é movida de uma área para outra, em sequência, sendo submetida a uma série de operações analíticas - modificou a concepção dos espaços e a interacção entre eles. Assim, a construção de um edifício com o objectivo de instalar um laboratório torna-se, como há pouco referi, uma tarefa muito complexa. Na fase de projecto, deve ser dedicada uma atenção muito especial à diversidade de equipamentos de análise que aí vão ser instalados, à proporção de métodos analíticos clássicos versus métodos por análise instrumental, às áreas com requisitos específicos que devem ter separação entre elas, aos aspectos da segurança microbiológica e de poluição, e, acima de tudo, à preocupação com a segurança do trabalhador. Para respondermos ao desafio que nos era proposto aqui nos Açores, o nosso trabalho começou por uma reflexão sobre as estruturas laboratoriais de vários laboratórios de análise de vinhos, através de documentos de projecto e de notas recolhidas em visitas efectuadas. Foram vistos com particular atenção, os layout dos laboratórios do Instituto dos Vinhos do Porto e do Douro, no Porto, da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, no Porto, do Laboratório do Centro Tecnológico da Cortiça, em Santa Maria de Lamas. Tentou-se recolher os aspectos gerais que estiveram subjacentes à sua concepção, projecto de adaptação ou construção de raiz e com essa experiência, permitirmos que o LRE dos Açores não tivesse que passar pelas mesmas dificuldades. Mas qual a principal dificuldade com que alguém se depara quando pretende projectar a construção de um laboratório? Em Portugal, ainda é muito raro ocorrer a construção 4
5 deste tipo de instalações, sendo que, não poucas vezes, a integração de conselheiros técnicos nessas equipas, com conhecimento específico, ocorre numa fase já adiantada do processo, com situações já consumadas que perturbam a funcionalidade da solução final. Não foi o que aconteceu neste caso, pois desde a fase inicial de projecto, foi acautelado o aconselhamento técnico específico da equipa projectista. Assim, na fase inicial do projecto, efectuou-se um cuidadoso estudo do layout, prevendo-se uma possibilidade de expansão de cerca de 25% da capacidade analítica, face às necessidades actuais. Mas, em grande linhas, que áreas atribuir aos vários espaços? Como proporcionar os diversos laboratórios, sabendo-se que presentemente os métodos analíticos clássicos (Wet Chemical Methods) estão a dar lugar aos métodos instrumentais de análise (Dry Chemical Methods), onde predominam os aparelhos electrónicos? Esta circunstância foi devidamente atendida, desde início, pois a proporção destas áreas iria/irá condicionar enormemente os custos de construção e de funcionamento. Optou-se pelo layout que em nossa opinião maior funcionalidade daria ao laboratório, que corresponde a uma modulação do tipo rectangular. Na concepção do edifício tevese em conta a multiplicidade de estruturas mecânicas que aí iriam ser instaladas, tais como as decorrentes dos sistemas de condicionamento de ar específicos para a sala de prova, sistemas de aspiração mecânica e respectivas condutas de ar e corettes técnicas, redes de gases de laboratório. Sendo assim o laboratório dotado de sistemas mecânicos e técnicos muito complexos, a manutenção de todas as estruturas inerentes ao normal funcionamento do laboratório (canalizações várias, rede de gases, filtros, esgotos, etc.) deverá poder ocorrer com um mínimo de perturbação do normal funcionamento do mesmo. A solução que foi conseguida e que se revela muito vantajosa, foi a previsão de um piso técnico sob e sobre as áreas de laboração, por onde passam ou estão instaladas todas essas infra-estruturas. Tratando-se de locais de risco elevado, os laboratórios devem imperiosamente ser construídos com requisitos de segurança adequados. Foi isto que sempre esteve presente na equipa projectista ao se considerarem as necessidades especiais de evacuação em caso de incêndio ou sismo, a selecção de matérias de construção compatíveis com baixo risco de propagação, de elevada resistência mecânica e ao ataque químico, a correcta exaustão de hottes, a apropriada armazenagem de reagentes e solventes inflamáveis e as especificidades de instalação eléctrica. No que diz respeito à sala de prova, esta foi planeada e constrida de acordo com as mais recentes normas internacionais, designadamente as que são da competência da OIV Organização Internacional da Vinha e do Vinho, possibilitando trabalhar-se sem 5
6 recurso à iluminação natural no momento de prova, sendo dotada de ventilação forçada com pressão positiva de ar filtrado e desodorizado. Por forma a normalizar o local de observação, foram atendidas as especificações para as cores do ambiente circundante e para a temperatura de cor da iluminação ambiente e localizada. Apenas com estes requisitos estruturais cumpridos se poderá vir a conseguir, futuramente, a acreditação de uma câmara de provadores, em complemento da acreditação dos ensaios laboratoriais propriamente ditos que aqui vierem a ser realizados. Como conclusão, poderei revelar-vos que foi uma experiência altamente enriquecedora do ponto de vista profissional ter colaborado neste projecto. O planeamento deste laboratório foi assim uma tarefa multidisciplinar, pois a equipa de projecto incluiu não apenas o arquitecto, como engenheiros das várias especialidades envolvidas, tendo o meu contributo residido na oferta da minha experiência profissional na área da análise de vinhos, das metodologias analíticas que serão praticadas, aí se incluindo a análise sensorial. A concepção de um laboratório é, pois, uma resposta a vários desafios - segurança e factores de risco para os trabalhadores, flexibilidade, qualidade do ambiente, eficiência de custos - todos estes aspectos orientados para uma qualidade global das instalações, onde a produtividade e o conforto estão maximizados. Espero que o futuro confirme que todo este esforço valeu a pena e que o Laboratório Regional de Enologia cumpre o seu papel no desenvolvimento da Enologia da Região e preenche o seu devido espaço na resposta necessária à melhoria dos vinhos dos Açores. Muito obrigado pela vossa atenção. Paulo Barros 6
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