Caso clínico. André Caires Alvino de Lima
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- Rubens Cordeiro Campos
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1 Caso clínico André Caires Alvino de Lima Um homem de 47 anos, com antecedente de psoríase, apresenta-se com tosse, cefaleia, calafrios e rash petequial em membros inferiores. Avaliação laboratorial revela insuficiência renal aguda, com creatinina sérica de 4,8mg/dL (aumento em relação ao basal de 0,9mg/dL dois meses atrás). Análise de urina revela hematúria microscópica, com cilindros hemáticos e proteinúria 3+, com proteinúria de 24h de 2g. Exames de autoimunidade mostraram p-anca 1:320, com especificidade para antimieloperoxidase. Outros testes sorológicos foram normais, incluindo FAN, anti-dna, hepatite B e C, complemento C3 e C4. Radiografia de tórax revela opacidades intersticiais. A biópsia de pele revelou vasculite leucocitoclástica. A biópsia renal foi realizada. Dos 26 glomérulos na amostra, cinco são globalmente esclerosados, nove têm focos de necrose e crescentes celulares, com ruptura da membrana basal glomerular, crescentes circunferenciais e ruptura da cápsula de Bowman. Não há proliferação mesangial ou endocapilar. Existe infiltrado intersticial linfomononuclear e cilindros hemáticos. Duas artérias interlobulares apresentam necrose fibrinoide da íntima e inflamação transmural. Não foram identificados depósitos imunes na imunofluorescência. Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva 1. Introdução A glomerulonefrite rapidamente progressiva (GNRP), também conhecida como glomerulonefrite crescêntica (GN crescêntica), não é uma doença específica, mas representa uma manifestação histológica de um dano glomerular grave, caracterizado por acúmulo no espaço de Bowman de células provenientes da proliferação e da desdiferenciação das células dos epitélios visceral e parietal. Tais células envolvem e comprimem o tufo glomerular. Clinicamente, a GNRP está geralmente associada à presença de hematúria, macroscópica ou microscópica, com dismorfismo eritrocitário, cilindros hemáticos, graus variáveis de proteinúria e insuficiência renal. A etiologia da GN crescêntica pode ser variada, porém o resultado final consiste em lesão da membrana basal glomerular (MBG) e passagem de fibrina e fibronectina para o espaço
2 urinário, onde elas ativam as células epiteliais e estimulam a proliferação, causando rompimento da cápsula de Bowman e permitindo influxo maciço de macrófagos e fibrina. Essas alterações eventualmente levam à obstrução do fluxo tubular, à cicatriz glomerular e à perda do néfron acometido. 2. Mecanismos de formação dos crescentes glomerulares Crescentes glomerulares, definidos por duas ou mais camadas de proliferação celular no espaço de Bowman, são marcadores de glomerulonefrite inflamatória e indicam dano glomerular grave. Em geral, a intensidade da insuficiência renal e de outras manifestações clínicas de glomerulonefrite, como edema e hipertensão, correlacionam-se com a proporção de glomérulos que exibem crescentes. A glomerulonefrite crescêntica tipicamente está associada à síndrome de glomerulonefrite rapidamente progressiva. A formação dos crescentes glomerulares surge como uma reação inespecífica a uma injúria grave na parede capilar glomerular. O evento inicial é o desenvolvimento de lacunas ou furos na parede capilar glomerular, na membrana basal glomerular e na cápsula de Bowman, que permitem a passagem de células circulantes, principalmente macrófagos e linfócitos T, mediadores inflamatórios e proteínas plasmáticas, particularmente proteínas da coagulação, através da parede capilar glomerular e da membrana basal glomerular para o espaço de Bowman. O conteúdo pode ainda se estender até o interstício, através da cápsula de Bowman, contribuindo para a inflamação periglomerular. a. Formação e composição Proteínas da coagulação Duas características centrais da formação dos crescentes são a presença de fatores de coagulação no espaço de Bowman, levando à formação da rede de fibrina, e a deficiência de mecanismos fibrinolíticos. Algumas moléculas pró-coagulantes têm papel importante nesse processo: Fator tecidual: é o estímulo primário para a deposição de fibrina, através da ligação e da ativação do fator VII. Deriva das células endoteliais, dos podócitos e dos macrófagos. Interleucinas (IL-1 derivada de macrófagos) e fator de necrose tumoral (TNF) estimulam a produção do fator tecidual. Inibidor da via do fator tecidual (TFPi): acompanhando o aumento da atividade do fator tecidual, ocorre uma redução precoce do inibidor da via do fator tecidual, favorecendo a deposição de fibrina. Trombina: o papel da trombina na formação dos crescentes é sugerido por modelos animais em que a inibição de trombina reduziu a formação dos crescentes e a infiltração por macrófagos e linfócitos T.
3 Sistema plasminogênio/plasmina: exerce papel central na fibrinólise e na resolução dos crescentes glomerulares. Em modelos experimentais animais e humanos de GN crescêntica, a atividade fibrinolítica está diminuída, devido à redução do ativador do plasminogênio tecidual e ao aumento do inibidor do ativador do plasminogênio-1 (PAI-1), levando à formação da rede de fibrina no espaço de Bowman. A fibrina é um potente fator quimiotático, ajudando no recrutamento de macrófagos para o glomérulo. Macrófagos Participam ativamente da formação dos crescentes, uma vez que a expressão do fator tecidual e a deposição de fibrina são fenômenos dependentes de macrófagos. Eles tanto derivam da circulação quanto do interstício periglomerular, ao penetrarem o espaço urinário através das lacunas na cápsula de Bowman. A localização dos macrófagos nos glomérulos na GN crescêntica envolve múltiplos fatores quimioatrativos, que incluem: Quimiocinas: proteína quimioatrativa de macrófagos-1 (MCP-1), fator inibidor de macrófagos (MIF), proteína inflamatória de macrófagos-1-alfa (MIP-1-α) e osteopontina. A expressão do receptor de quimiocina 2B (CCR2B), um receptor do MCP-1, pode ser particularmente importante. Moléculas de adesão: molécula de adesão de célula vascular (VCAM)-1, molécula de adesão intracelular (ICAM)-1 e CD44, todos expressos nas células epiteliais parietais do glomérulo. Fator estimulador de colônias granulocíticas-macrofágicas derivado de células renais (GM-CSF) pode aumentar a expressão de ICAM-1, MCP-1 e interleucina (IL)-1β. Uma vez no espaço de Bowman, os macrófagos ativados contribuem para a formação de crescentes pela proliferação e liberação das seguintes moléculas: fator tecidual, IL-1 e TNF (estimula a expressão de moléculas de adesão, a proliferação celular e recrutam mais macrófagos), fator de crescimento transformador (TGF)-β (execre papel na transição para crescentes fibrocelulares e fibrosos, através do estímulo à produção de colágeno I), receptor de manose e metaloproteinases de matriz (MMP)-2, 3, 9 e 11. Linfócitos T São encontrados no espaço urinário e nos crescentes. A localização dos linfócitos T-helper envolve fatores quimioatrativos tradicionais (MCP e MIP-1-α), certas citocinas (IL-18 e IL-12p40), mastócitos e ligantes coestimulatórios nos macrófagos e células não-linfoides (CD80 e CD86). Algumas dessas citocinas podem ainda estimular a produção de citocinas proinflamatórias, como interferon-gamma e TNF. O papel dos
4 linfócitos T na injúria glomerular pode estar relacionado ao reconhecimento de antígenos e ao recrutamento de macrófagos. Além disso, um possível papel do canal de potássio voltagem-dependente Kv1.3, expresso em linfócitos T de memória, tem sido proposto em modelos animais experimentais. Células epiteliais parietais Constituintes significativos dos crescentes, com capacidade de proliferação em resposta aos fatores de crescimento. Apesar de não determinarem o curso ou as consequências dos crescentes glomerulares, podem sofrer desregulação e tornarem-se células inflamatórias macrófago-símile, produtoras de colágeno I. Podócitos (células epiteliais glomerulares viscerais) Apesar de serem células diferenciadas, os podócitos jovens podem ser recrutados pelas células parietais através de diferenciação e proliferação. Podem ainda sofrer transformação mesenquimal e contribuir para a formação de crescentes, particularmente nas fases precoces da doença. Células renais progenitoras Essas células estão localizadas na cápsula de Bowman e são capazes de regenerar podócitos. São identificadas por marcadores de células-tronco CD133 e CD24 e encontram-se em variados estágios de diferenciação. Dados de GN em humanos sugerem que a formação dos crescentes pode ser primariamente resultado de proliferação desregulada de células progenitoras renais em resposta à injúria podocitária. Fibroblastos intersticiais Constituem a segunda maior população de células nos crescentes em modelos experimentais, depois dos macrófagos. Nos crescentes, os fibroblastos são uma importante fonte de colágeno, caracterizando a transformação de crescentes celulares para fibrosos. b. Curso dos crescentes A presença de crescentes não significa necessariamente dano glomerular irreversível. A progressão para fibrose depende da integridade da cápsula de Bowman e da composição celular dos crescentes (sem componente de fibroblastos e colágeno predominante). Embora a presença de crescentes fibrosos geralmente se correlacione com esclerose glomerular, não há evidência de que o evento cause injúria ao capilar glomerular. Dessa forma, a formação de crescentes parece ser uma consequência e não a causa da lesão glomerular grave. Entretanto, vem aumentando a evidência de
5 que crescentes volumosos podem ocluir o fluxo tubular, gerando glomérulos atubulares, com consequente degeneração tanto glomerular quanto tubular. 3. Classificação da GN crescêntica Existem três categorias de GN crescêntica, baseadas na presença e na distribuição dos depósitos imunes na imunofluorescência (IF). a. Tipo 1 (anticorpo anti-mbg) Corresponde a apenas 10% dos casos de GNRP. A Síndrome de Goodpasture é o exemplo típico desta categoria. Na MBG normal, as cadeias α3, α4 e α5 do colágeno tipo IV têm uma estrutura hexâmera e estão ligadas no domínio NC-1 adjacente para formar dímeros (isoforma D), em pacientes com a Síndrome de Goodpasture, existem depósitos lineares de imunoglobulinas G (IgG) direcionados contra o domínio nãocolágeno 1 (NC-1) da cadeia α3 do colágeno tipo IV na MBG e na membrana alveolar pulmonar. Mais recentemente, anticorpos contra o domínio NC-1 da cadeia α5 do colágeno tipo IV foram identificados em pacientes com anticorpo anti-mbg. A etiologia da Síndrome de Goodpasture ainda é incerta. Fatores genéticos e ambientais podem predispor ao desenvolvimento da síndrome. Tem sido mostrado que a autoimunidade contra o domínio NC-1 da cadeia α3 do colágeno IV é fortemente associado ao HLA-DR15. Entretanto, a apresentação desse antígeno aos linfócitos T parece ser mais determinada por fatores de processamento do que por preferências das moléculas indiscriminadas do DR15. Tabagismo, infecções virais do trato respiratório ou exposição a hidrocarbonetos solventes podem estar frequentemente associados à Síndrome de Goodpasture e contribuir para o seu desenvolvimento. Atualmente, a Síndrome é definida como uma conformeropatia autoimune, uma vez que a doença é desencadeada por uma perturbação da estrutura quaternária do hexâmetro α345nc1, induzindo uma mudança conformacional patogênica, levando à formação de autoanticorpos. A injúria formada por tais anticorpos produz lacunas na parede capilar glomerular, permitindo a entrada de fatores de coagulação e células inflamatórias, promovendo a formação dos crescentes. Praticamente todos os casos de Síndrome de Goodpasture se apresentam com GNRP. A síndrome nefrítica geralmente é acompanhada de anemia, hemorragia pulmonar e dispneia. O diagnóstico pode ser confirmado pela detecção de anticorpos anti-mbg no sangue e pela imunofluorescência do tecido renal, revelando depósitos lineares de IgG ao longo da MBG. Em 10-38% dos casos, p-anca (antimieloperoxidase) ou mais raramente c-anca (anti-proteinase-3) podem ser detectados.
6 Raros casos de nefropatia membranosa precedendo ou sucedendo a recuperação da Síndrome de Goodpasture têm sido relatados, sugerindo um possível aumento na síntese de antígenos, exposição de epítopos ocultos ou deposição de complexos antígeno-anticorpo. A detecção de anticorpos contra o receptor da fosfolipase A2 (PLA2R) é crucial na discriminação da nefropatia membranosa primária, uma vez que existem implicações terapêuticas envolvidas. Raramente, a GN tipo 1 pode-se desenvolver em pacientes com Síndrome de Alport que recebem um transplante renal, uma vez que a presença de epítopos antigênicos presentes no enxerto renal, inexistentes no rim nativo do receptor, pode desencadear a produção de anticorpos. Na maioria dos casos, existe uma deposição linear transitória de IgG ao longo da MBG, sem anticorpos anti-mbg circulantes, porém em 3-12% dos pacientes os anticorpos anti-mbg podem produzir GN crescêntica grave. Os epítopos reconhecidos pelos anticorpos anti-mbg na Síndrome de Alport ligada ao X são hexâmetros não-ocultos do domínio NC-1 da cadeia α5 do colágeno. b. Tipo 2 (por imunocomplexos) Corresponde a 15-20% dos casos de GN crescêntica, sendo um grupo heterogêneo de GNRP, caracterizado por depósitos granulares de imunoglobulinas. Diferentes doenças por imunocomplexos podem contribuir para o desenvolvimento da GN tipo 2, incluindo GN aguda pós-infecciosa, nefrite lúpica, púrpura de Henoch- Schonlein (PHS), crioglobulinemia mista, nefropatia por IgA, GN membranoproliferativa mediada por imunocomplexos, glomeruloesclerose diabética e amiloidose primária ou secundária. A ocorrência de GN crescêntica tem sido estimada em 16% para GN pósinfecciosa, 8% para nefrite lúpica, 2,7% para adultos com PHS e 11% para nefrite crioglobulinêmica. Nessas doenças, a deposição de imunocomplexos circulantes na MBG ou a formação in situ de imunocomplexos nos capilares glomerulares ativam células inflamatórias e complemento, causando dano à MBG. Além disso, a injúria glomerular pode desencadear inflamação e ativar a resposta imune inata, recrutando macrófagos, células natural killer, granulócitos e células dendríticas (capazes de estimular a resposta imune adaptativa, com a produção de células TH1 e TH17). c. Tipo 3 (pauciimune) É a forma mais comum de GN crescêntica, responsável por cerca de 60-80% dos casos, caracterizada pela ausência de depósitos imunes glomerulares, atualmente considerada vasculite renal de pequenos vasos. Na verdade, embora em uma pequena parcela dos pacientes com GNRP e ausência de imunodepósitos glomerulares os sinais clínicos de vasculite não estejam presentes, a maioria dos casos se apresentam com anticorpos anti-citoplasma de neutrófilos (ANCA) circulantes e sinais e sintomas de
7 vasculite. Um consenso recente propôs uma reclassificação da GN tipo 3 em vasculite ANCA-associada, incluindo a Poliangeíte Microscópica (PAM), a Granulomatose com Poliangeíte (GPA, antigamente conhecida por Granulomatose de Wegener), a Granulomatose Eosinofílica com Poliangeíte (GEPA, antiga Síndrome de Churg-Strauss). A GNRP acontece em 70% dos casos de GPA com acometimento renal, em 65% dos casos de PAM e menos comumente em GEPA, com 13,8%. Essas vasculites compartilham lesões renais caracterizadas por proliferação extracapilar difusa e inflamação necrotizante dos capilares, vênulas, arteríolas e pequenas artérias. Entretanto, os sinais e sintomas clínicos são diferentes. Em todas, lesões de pele, gastrointestinais e neurológicas podem estar presentes. Na GPA, ocorre envolvimento granulomatoso do trato respiratório, orelha, nariz e garganta. GEPA está associada com asma, eosinofilia e inflamação granulomatosa. Na PAM, a capilarite pulmonar é frequente. Cerca de 75% dos pacientes com GPA têm c-anca, 20% têm p-anca e apenas 5% são ANCA negativos. Em relação à PAM, 10% dos pacientes têm ANCA indetectável, enquanto 50% são p-anca positivo e 40% são c-anca positivo. Cerca de um terço dos pacientes com GEPA não apresentam ANCA circulante, 60% são positivos para p-anca, em particular aqueles com envolvimento renal, e 20% são p-anca positivos. Fatores genéticos podem estar envolvidos na etiopatogenia das vasculites associadas ao ANCA. Tem sido observado um risco mais elevado de vasculite em afroamericanos portadores do alelo HLA-DRB1*15. Em europeus, o HLA-DP tem sido associado à GPA, enquanto a PAM se associa com HLA-DQ. Um aumento da expressão de proteinase 3 na membrana de neutrófilos foi associada a aumento de risco de vasculite e de recidiva. Também foi demonstrada uma ligação entre C3 e o gene CTLA- 4 e as vasculites associadas ao ANCA, sugerindo que o complemento pode estar envolvido na patogênese e que a ativação de linfócitos T também é importante nessas doenças. Fatores ambientais, como poluentes e sílica podem ter papel predisponente. Casos têm sido relatados após exposição a drogas, como penicilamina, hidralazina, propiltiouracil, alopurinol, piperacilina, dapsona e cocaína adulterada com levamisol. Na maioria dos casos, a vasculite persistiu mesmo após a descontinuação da droga. Frequentemente, a doença pode ser desencadeada por infecções virais ou por Staphylococcus aureus. A papel patogênico para o ANCA é reforçado por experimentos in vitro mostrando que o ANCA pode ativar neutrófilos pro-inflamatórios e monócitos a produzirem espécies reativas de oxigênio e enzimas líticas, resultando em lise de células endoteliais. Além disso, os antígenos liberados pelos neutrófilos ativados podem-se ligar às células endoteliais, formando imunocomplexos com ANCA circulantes, levando à apoptose endotelial. 4. Epidemiologia
8 As glomerulonefrite são raras, responsáveis por cerca de 13% das biópsias renais. Embora a GN por imunocomplexos possa acontecer em qualquer idade, o lúpus é típico de mulheres em idade fértil, a PHS é mais frequente em crianças e adolescentes, a crioglobulinemia mista e vasculites associadas ao ANCA são frequentes entre a quinta e a sétima décadas de vida. A Síndrome de Goodpasture pode ter uma distribuição bimodal, sendo mais frequente na segunda e na terceira décadas de vida, quando costuma acometer homens, e na sexta década, afetando preferencialmente mulheres. Não existe predisposição racial, mas os tipos 1 e 3 ocorrem mais frequentemente em caucasianos. A Síndrome de Goodpasture ocorre preferencialmente em países nórdicos e anglo-saxônicos. A GN pós-infecciosa é mais frequente em países subdesenvolvidos, por razões socioeconômicas. A nefrite lúpica é mais rara em caucasianos do que em asiáticos. 5. Manifestações clínicas e diagnóstico Síndrome nefrítica e GNRP são apresentações comuns de todas as glomerulonefrites crescênticas. Sinais e sintomas extra renais podem estar presentes. Hemorragia pulmonar e anemia grave estão presentes na Síndrome de Goodpasture. Artralgia, rash cutâneo, pleurite e pericardite podem estar associadas à nefrite lúpica. Púrura, artralgia e dor abdominal caracterizam a PHS. Púrpura, fadiga, dor articular, hepatoesplenomegalia e neuropatia periférica são manifestações da crioglobulinemia. O quadro clínico de vasculites de pequenos vasos é variável. Na GPA, cavitações e nódulos pulmonares, mononeurite múltipla, rinite, sinusite, otite média e episclerite são frequentes. Na PAM, infiltrados pulmonares, úlceras e nódulos cutâneos e artralgia costumam acompanhar o quadro renal. GEPA se caracteriza por asma, sinusite, neuropatia periférica e envolvimentos pulmonar e cutâneo. Testes sanguíneos possibilitam a diferenciação: Anticorpo anti-mbg na Síndrome de Goodpasture; Queda de C3 e C4, FAN e anti-dna na nefrite lúpica; Baixos níveis de C3 na GN pós-infecciosa; Crioglobulinas circulantes e hipocomplementemia são marcadores da nefrite crioglobulinêmica; Altos níveis de IgA estão presentes em muitos pacientes com nefropatia por IgA e PHS; ANCA está presente em 90% das GN pauciimunes. A biópsia renal é bastante útil. Embora os achados na microscopia óptica possam ser semelhantes, proliferação endocapilar costuma ser ausente nos tipos 1 e 3, enquanto é uma constante no tipo 2. Necrose fibrinoide pode ser vista na nefrite lúpica e é frequente nas vasculites associadas ao ANCA. Granuloma pode ser visto na GPA e infiltrado eosinofílico pode ocorrer na GEPA.
9 A imunofluorescência tem grande importância, uma vez que depósitos lineares de IgG ao longo da MBG são típicos da Síndrome de Goodpasture, depósitos granulares de imunoglobulinas e complemento caracterizam a tipo 2 e a ausência de depósitos corresponde à tipo 3. Na nefrite lúpica, é típico o padrão full house (IgG, IgM, IgA, C3, C1q, kappa e lambda). Depósitos granulares de Ig e C3 ocorrem na GN pós-infecciosa, na GN membranoproliferativa e na GN crioglobulinêmica. Depósitos mesangiais de IgA acontecem na nefropatia por IgA e na PHS. 6. Prognóstico Independentemente da doença de origem, o prognóstico era ruim até poucos anos atrás. As terapias modernas melhoraram os desfechos, porém o prognóstico depende fortemente do valor de creatinina na apresentação do quadro. Valores elevados se correlacionam com pior sobrevida global e renal. Envolvimento pulmonar e idade são fatores associados à maior mortalidade. Além da creatinina sérica, a biópsia renal também pode indicar prognóstico, chegando a 15% de recuperação de função renal se todos os glomérulos se apresentarem com crescentes. 7. Tratamento O tratamento precoce é fundamental em casos de GN crescêntica. A abordagem atual é baseada em uma combinação de corticosteroides e drogas citotóxicas, que visam a reduzir a inflamação e a cessar a resposta celular e a produção de anticorpos. Geralmente, o tratamento é iniciado com metilprednisolona em pulsoterapia, seguida por prednisona oral na dose de 1mg/kg, e ciclofosfamida intravenosa (na dose de 0,5-1g/m 2 ) ou oral (2-3mg/kg). Plasmaferese pode ser associada para remover anticorpos circulantes e imunocomplexos. Pacientes com Síndrome de Goodpasture costumam responder ao início precoce de corticosteroides e ciclofosfamida, porém plasmaferese é indicada se hemorragia alveolar maciça. A plasmaferese pode oferecer benefícios em relação à terapia imunossupressora sozinha, incluindo desaparecimento mais precoce de anticorpos anti-mbg circulantes e melhor creatinina na recuperação, porém o prognóstico depende mais da proporção de glomérulos com crescentes do que da terapia escolhida. O tratamento da GN tipo 2 também consiste em altas de corticosteroides e ciclofosfamida. Em casos refratários de nefropatia por IgA e crioglobulinemia, a plasmaferese pode melhorar a resposta, enquanto que não interfere no curso da nefrite lúpica grave tratada com imunossupressão com corticosteroide e ciclofosfamida. Rituximabe tem sido usado como terapia de resgate em pacientes com nefrite lúpica e nefrite crioglobulinêmica.
10 Em pacientes com vasculite associada ao ANCA, é mandatório o tratamento com altas doses de corticosteroides e ciclofosfamida, além de plasmaferese em casos de hemorragia pulmonar ou vasculite renal grave. Rituximabe associado com corticosteroides pode induzir e manter a remissão de formas graves de vasculite, incluindo aquelas combinadas com infecção. 8. Bibliografia recomendada RIBEIRO ALVES, M. A. V. F. Glomerulonefrites crescênticas. In: BARROS, R. T. Glomerulopatias: Patogenia, clínica e tratamento. São Paulo: Sarvier, p KDIGO Clinical Practice Guidelines for Glomerulonephritis. Kidney International supplements, v. 2, n. 2, jun Disponível em: Acesso em: 31 mar
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