Capítulo 1: Sistemas Lineares e Matrizes
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- João Lucas Bastos Lombardi
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1 1 Livro: Introdução à Álgebra Linear Autores: Abramo Hefez Cecília de Souza Fernandez Capítulo 1: Sistemas Lineares e Matrizes Sumário 1 O que é Álgebra Linear? Corpos Espaços Vetoriais Sistemas de Equações Lineares Matrizes A Denição de Matriz Operações com Matrizes Matriz Inversa
2 2 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES 1 O que é Álgebra Linear? Os espaços em que trabalharemos são os R n, com n 2, isto é, o produto cartesiano de n cópias da reta real R. Para n 4, este espaço generaliza o espaço R 2 dos vetores do plano e o espaço R 3 dos vetores no espaço. A diferença crucial entre os casos n = 2 e n = 3 e os casos em que n 4 é que, para estes últimos, não se dispõe de uma representação geométrica. O fato não diminui a importância desses espaços, pois basta pensar que o R 4 é o espaço-tempo da Física, em que os pontos são quaternos (x, y, z, t), com as três primeiras coordenadas representando a posição no espaço de uma partícula ideal e a última representando o instante t em que esta partícula ocupa tal posição. Por não existir uma representação geométrica para os pontos de R n com n 4, seremos obrigados a tratá-los algebricamente, sem o recurso da visualização geométrica, tão fundamental em R 2 e R 3. Portanto, trataremos os elementos de R n como vetores, onde a soma de dois vetores (x 1, x 2,..., x n ) e (y 1, y 2,..., y n ) é dada por (x 1, x 2,..., x n ) + (y 1, y 2,..., y n ) = (x 1 + y 1, x 2 + y 2,..., x n + y n ), e a multiplicação do vetor (x 1, x 2,..., x n ) pelo número real a, chamado de escalar, é denida por a(x 1, x 2,..., x n ) = (ax 1, ax 2,..., ax n ). Os espaços R n são utilizados de modo essencial em quase todos os ramos do conhecimento e, por este motivo, são estudados em Matemática sob os mais variados pontos de vista e com as mais diversas estruturas. Por exemplo, no Cálculo Diferencial, são considerados como espaços normados; em Geometria, como espaços com produto interno. A estrutura de R n estudada em Álgebra Linear é a induzida pela estrutura de corpo da reta real R. Essa é a estrutura mínima apropriada para se estudar sistemas de equações lineares com várias incógnitas. Além disso, é aquela sobre a qual se constroem o Cálculo Diferencial e a Geometria Diferencial, entre outros.
3 1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 3 Como a estrutura de corpo de R desempenhará papel fundamental, vamos denir formalmente este conceito. 1.1 Corpos Um conjunto K será chamado de corpo se for munido de uma operação de adição (+) e uma operação de multiplicação ( ), vericando as condições a seguir. A1 A adição é associativa: (a + b) + c = a + (b + c), para todos a, b, c K. A2 A adição é comutativa: a + b = b + a, para todos a, b K. A3 A adição possui elemento neutro: existe 0 K, tal que a + 0 = a, para todo a K. A4 A adição possui simétricos: para todo a K, existe a K tal que a + ( a) = 0. M1 A multiplicação é associativa: (a b) c = a (b c), para todos a, b, c K. M2 A multiplicação é comutativa: a b = b a, para todos a, b K. M3 A multiplicação possui elemento neutro: existe 1 K \ {0}, tal que a 1 = a, para todo a K. M4 A multiplicação possui inversos: para todo a K \ {0}, existe a 1 K tal que a a 1 = 1. AM A multiplicação é distributiva com relação à adição: a (b + c) = a b + a c, para todos a, b, c K. Portanto, são corpos os conjuntos Q, R e C, com as suas respectivas adições e multiplicações. A operação de multiplicação em um corpo muitas vezes é denotada por ( ), escrevendo a b, ou mesmo ab, no lugar de a b, notação que adotaremos ao longo deste livro.
4 4 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES Existem exemplos de corpos que à primeira vista parecem exóticos, como o corpo de Galois 1 F 2, que consiste dos dois elementos 0 e 1 com as seguintes operações: Note que este é o corpo com o menor número possível de elementos, pois todo corpo deve possuir os dois elementos distintos 0 e 1. Apesar de parecerem apenas curiosidades, os corpos com um número nito de elementos têm as mais variadas aplicações em quase toda a Matemática e são essenciais na tecnologia e na computação. 1.2 Espaços Vetoriais Os espaços R n, por serem constituídos por vetores que podem ser somados e multiplicados por escalares, como vimos antes, são chamados espaços vetoriais. Como os espaços vetoriais são os objetos principais de estudo da Álgebra Linear, vamos deni-los formalmente a seguir. Um conjunto V será dito um espaço vetorial sobre um corpo K, se possui uma adição (+) com as mesmas propriedades da adição em um corpo; ou seja, A1 A adição é associativa: (u + v) + w = u + (v + w), para todos u, v, w V. A2 A adição é comutativa: u + v = v + u, para todos u, v V. A3 A adição possui elemento neutro (elemento zero): existe 0 V, tal que v + 0 = v, para todo v V. 1 Em homenagem a Évariste Galois (França, ), considerado um dos grandes gênios da Matemática.
5 1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 5 A4 A adição possui simétricos: para todo v V, existe v V tal que v + ( v) = 0. E além disso, existe uma operação chamada de multiplicação por escalar, que associa a um elemento a K e a um elemento v V, um elemento av V, tal que ME1 a(u + v) = au + av, para todos a K e u, v V. ME2 (a 1 + a 2 )v = a 1 v + a 2 v, para todos a 1, a 2 K e v V. ME3 (a 1 a 2 )v = a 1 (a 2 v), para todos a 1, a 2 K e v V. ME4 1v = v, para todo v V. Os elementos de V serão chamados de vetores e os elementos de K de escalares. Assim, o elemento 0 de V será chamado de vetor nulo e o elemento v de vetor oposto de v. O primeiro matemático a dar uma denição abstrata para um espaço vetorial foi Giuseppe Peano (Itália, ) em seu livro Calcolo Geometrico, de No Capítulo IX, Peano dá uma denição do que ele chama de um sistema linear. Para Peano, um sistema linear consistia de quantidades com operações de adição e multiplicação por escalar. A adição deveria satisfazer as leis comutativa e associativa, enquanto a multiplicação por escalar deveria satisfazer duas leis distributivas, uma lei associativa e a lei de que 1 v = v para toda quantidade v. Além disso, Peano incluiu como parte de seu sistema de axiomas a existência de uma quantidade 0 (zero) satisfazendo v + 0 = v, para todo v, assim como v + ( 1)v = 0 para todo v. Peano também deniu a dimensão de um sistema linear como o máximo número de quantidades linearmente independentes do sistema (veja esta noção na Seção 2 do Capítulo 3). Peano vericou que o conjunto das funções polinomiais em uma variável forma um sistema linear, mas não existia um tal número máximo de quantidades linearmente independentes, portanto, a dimensão deste sistema deveria ser innito. O fato a seguir decorre da denição de espaço vetorial. Para a K e
6 6 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES v V, tem-se que a = 0 ou v = 0 av = 0. De fato, sejam a K e 0 V. Como = 0, pela propriedade ME1, segue-se que a 0 = a(0 + 0) = a 0 + a 0. Somando o simétrico a 0 de a 0 a ambos os lados da igualdade acima e utilizando as propriedades A4, A1 e A3, temos que 0 = a 0 + ( a 0) = (a 0 + a 0) + ( a 0) = a 0 + [a 0 + ( a 0)] = a = a 0. De modo semelhante, mostra-se (faça-o) que para 0 K e v V tem-se 0 v = 0, onde o elemento 0 da direita é o elemento zero de V. Reciprocamente, suponhamos que av = 0 e a 0, então, multiplicando ambos os lados da igualdade acima pelo escalar a 1, temos que 0 = a 1 0 = a 1 (av) = (a 1 a)v = 1v = v. Dois vetores u e v em um espaço vetorial V serão ditos colineares, se existir um elemento a em K tal que v = au. Portanto, são colineares os vetores u e au, para todo a K. Note que o vetor 0 é colinear com qualquer vetor v, pois 0 = 0v. É um exercício fácil mostrar que R n é um espaço vetorial sobre o corpo R, com as operações de adição de vetores e a multiplicação por escalares que denimos anteriormente, onde o elemento zero é o vetor (0, 0,..., 0) e o simétrico de (x 1, x 2,..., x n ) é o vetor (x 1, x 2,..., x n ) = ( x 1, x 2,..., x n ). Observe que não há nada de especial sobre os reais, além de sua estrutura de corpo para que R n seja um espaço vetorial sobre R. Mais geralmente, dado um corpo qualquer K, o espaço K n é um espaço vetorial sobre K, com
7 1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 7 operações semelhantes às de adição de vetores e de multiplicação de vetores por escalares que denimos no caso em que K = R. Por exemplo, os espaços vetoriais F n 2 sobre F 2, por mais inócuos que possam parecer, são de extrema utilidade em várias aplicações, dentre elas na construção de códigos corretores de erros (veja a referência [3] para maiores detalhes sobre esta teoria). Outros exemplos importantes de espaços vetoriais são os espaços R e C sobre o corpo Q e o espaço C sobre o corpo R. Como sucede com frequência em Matemática, ao introduzir um conceito para lidar com determinado problema, cria-se um instrumento que muitas vezes transcende o problema inicial e se constitui em um conceito central em vários outros contextos. Isto ocorreu com a noção de espaço vetorial, que inicialmente foi introduzida para tratar de alguns tipos de problemas em R n, como a resolução de sistemas de equações lineares cuja discussão iniciaremos na próxima subseção, e se desenvolveu em uma teoria com vida própria. Pode-se sinteticamente dizer que a Álgebra Linear é a parte da Matemática que se dedica ao estudo dos espaços vetoriais e de certas funções entre esses espaços, chamadas de transformações lineares. Embora muitas das ferramentas básicas da Álgebra Linear, particularmente as que estão relacionadas com sistemas lineares, datem da antiguidade, o assunto começou a tomar sua forma atual em meados dos século XIX. A partir desta época, muitas noções estudadas em séculos anteriores foram abstraídas e muitos métodos generalizados. A Álgebra Linear tem várias aplicações fora da Matemática. Por exemplo, citamos a teoria da relatividade e a mecânica quântica na Física e a teoria de análise de regressão na Estatística. A seguir, daremos alguns exemplos diferentes de R n para ilustrar situações onde aparecem os espaços vetoriais e que, muitas vezes, quando tratadas dessa forma ganham clareza. Exemplo 1 O conjunto das funções de um conjunto não vazio A em R forma um espaço vetorial sobre R, onde a soma é a soma usual de funções
8 8 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES com valores reais (f + g)(x) = f(x) + g(x), para todo x A, e a multiplicação de uma função f por um escalar a R é denida como sendo (a f)(x) = a f(x), para todo x A. Em particular, se I = [a, b] é um intervalo em R, sabe-se do Cálculo Diferencial e Integral que o conjunto das funções contínuas, bem como o conjunto das funções integráveis, de I em R, são espaços vetoriais sobre R. Exemplo 2 De acordo com o Exemplo 1, o conjunto S das sequências de números reais, isto é, o conjunto das funções de N \ {0} em R é um espaço vetorial sobre R. É fácil vericar (leitor, faça-o) que o conjunto R(a, b) das sequências (u n ) em S que satisfazem a recorrência u n+1 = au n + bu n 1, n 2, onde a e b são dois números reais xados, é um espaço vetorial sobre R. Em particular, o conjunto R(1, 1), que contém a sequência de Fibonacci 2 (aquela para a qual u 1 = u 2 = 1), é um espaço vetorial. Veremos no Capítulo 5 como esta informação nos ajudará a achar todas as sequências em R(1, 1), determinando suas fórmulas fechadas. Exemplo 3 (Peano) O conjunto K[x] dos polinômios com coecientes em um corpo K forma um espaço vetorial sobre K. Para n N, os conjuntos K[x] n = {p(x) K[x] ; grau(p(x)) n} {0} também são espaços vetoriais sobre K. Em particular, o conjunto R[x] 2 = {a 0 + a 1 x + a 2 x 2 ; a 0, a 1, a 2 R} é um espaço vetorial sobre R. 2 Apelido de Leonardo de Pisa (Itália, ). Foi o primeiro grande matemático europeu da Idade Média.
9 1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? Sistemas de Equações Lineares Desde a antiguidade, em diversas áreas do conhecimento, muitos problemas são modelados matematicamente por sistemas de equações lineares. Damos a seguir um exemplo de sistema de equações lineares: { x + y = 36 x y = 2, (1) onde se subentende que estamos buscando dois números reais cuja soma vale 36 e cuja diferença vale 2. Portanto, as soluções procuradas podem ser representadas por pares de números reais (a, b) tais que, se substituírmos x por a e y por b, nas equações, elas se tornam igualdades de fato. Por exemplo, o par (x, y) = (19, 17) é uma solução, pois obtemos as igualdades: { = = 2. Os sistemas com duas equações lineares, como o acima, já eram considerados pelos babilônios por volta de 1800 a.c. e resolvidos por um método que chamamos hoje de método de eliminação gaussiana 3. Por exemplo, para resolver o sistema de equações (1), ao somarmos a segunda equação à primeira, o transformamos no sistema equivalente, { 2x = 38 x y = 2, que seguimos transformando até obtermos um sistema onde as soluções são trivialmente encontradas: { 2x = 38 x y = 2 { x = 19 x y = 2 { x = 19 x y x = 2 19 { x = 19 y = Em homenagem a Carl Friedrich Gauss (Alemanha, ), considerado um dos maiores matemáticos de todos os tempos.
10 10 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES Esse método será generalizado e sistematizado para sistemas de equações lineares com m equações e n incógnitas do tipo a 11 x 1 + a 12 x a 1n x n = b 1 a 21 x 1 + a 22 x a 2n x n = b 2 (2). a m1 x 1 + a m2 x a mn x n = b m, onde os a ij 's e os b i 's, para 1 i m e 1 j n, são números reais dados, ou, mais geralmente, elementos de um corpo K dado. Seja S = {(c 1, c 2,..., c n ) R n ; a i1 c 1 + a i2 c a in c n = b i, 1 i m}. Esse subconjunto de R n é chamado de conjunto solução do sistema (2). É precisamente este conjunto que queremos determinar ou descrever o mais explicitamente possível. Note que para resolver o sistema (1), do exemplo acima, o modicamos gradativamente, por meio de uma sequência de transformações elementares, em um sistema mais simples de resolver, onde por transformação elementar de um sistema entendemos uma das seguintes transformações: 1) Trocar a posição relativa de duas equações do sistema; 2) Trocar uma equação pela soma membro a membro da própria equação com um múltiplo de outra; 3) Trocar uma equação dada por um de seus múltiplos (i.e., a equação obtida multiplicando ambos os membros da equação dada por um número real não nulo). Diremos que dois sistemas de equações lineares são sistemas equivalentes, se pudermos obter um sistema do outro a partir de uma sequência nita de transformações elementares. Esta relação entre sistemas é efetivamente uma relação de equivalência. De fato, ela é claramente reexiva, pois basta multiplicar uma das equações
11 1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 11 do sistema por 1; é transitiva, pois basta concatenar uma sequência de transformações elementares com uma outra; e é simétrica, pois podemos desfazer uma transformação elementar com outra. Assim, é imediato vericar que: Sistemas de equações lineares equivalentes possuem mesmo conjunto solução. Dentre os sistemas de equações lineares, ocupam lugar de destaque os sistemas homogêneos, ou seja, aqueles sistemas como em (2), porém com os b i 's todos nulos: a 11 x 1 + a 12 x a 1n x n = 0 a 21 x 1 + a 22 x a 2n x n = 0. a m1 x 1 + a m2 x a mn x n = 0. Esses sistemas possuem peculiaridades não compartilhadas pelos sistemas mais gerais. Por exemplo, o vetor (0, 0,..., 0) pertence ao conjunto S h de soluções do sistema. Além disso, se os vetores u = (c 1, c 2,..., c n ) e u = (c 1, c 2,..., c n) são soluções do sistema, e se a R, então os vetores u + u = (c 1 + c 1, c 2 + c 2,..., c n + c n) e au = (ac 1, ac 2,..., ac n ) também são soluções do sistema (3) (leitor, verique). Assim, resulta que o espaço S h das soluções do sistema (3) é um espaço vetorial sobre R De fato, as propriedades A1 e A2 da denição são satisfeitas para todos os vetores de R n e em particular para os de S h. Por outro lado, (0, 0,..., 0) S h e se (c 1, c 2,..., c n ) S h, então 1(c 1, c 2,..., c n ) = ( c 1, c 2,..., c n ) S h, o que mostra que a adição em S h possui também as propriedades A3 e A4. Além disso, as propriedades ME1ME4 da multiplicação por escalar são facilmente vericadas para S h. Note que o que há de essencial em um sistema de equações lineares (2) são os coecientes das equações que o formam além dos números que (3)
12 12 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES compõem os segundos membros das equações. Consideremos os vetores (a i1, a i2,..., a in, b i ) de R n+1 que representam os coecientes das equações do sistema (2) acrescidos dos segundos membros e os organizemos como linhas de uma tabela, chamada de matriz ampliada do sistema (2), como segue: a 11 a 12 a 1n b 1 a 21 a a 2n b (4) a m1 a m2 a mn b m Quando o sistema de equações é homogêneo, a ele associamos a matriz a 11 a 12 a 1n a 21 a a 2n..., a m1 a m2 a mn eliminando a coluna de zeros da direita na matriz (4). As matrizes surgiram por volta do ano 200 a.c. com os chineses, motivados pelo interesse em calcular soluções de sistemas com mais de quatro equações lineares. De fato, no Capítulo 8 do texto intitulado Jiuzhang suanshu, de autor desconhecido, que signica Nove capítulos sobre a Arte Matemática", ca claro que o procedimento de resolução de sistemas lineares usado pelos chineses é semelhante ao método de escalonamento, que discutiremos ainda neste capítulo, e é apresentado na forma de matrizes. Cabe observar que os chineses só consideravam sistemas lineares com o mesmo número de equações e incógnitas, não constando em seus escritos o motivo desses sistemas produzirem sempre uma única solução e como o algoritmo chinês funcionava. Problemas 1.1 Verique que o conjunto das funções de um conjunto não vazio A nos reais é um espaço vetorial sobre R, com as operações denidas no Exemplo
13 1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? Verique também que, para cada par de números reais (a, b), o conjunto das recorrências R(a, b), denido no Exemplo 2, é um espaço vetorial sobre R. 1.2 Seja v um elemento não nulo de um espaço vetorial V sobre R. Mostre que é injetora a função R V t tv. 1.3 Sejam v 1 e v 2 elementos de um espaço vetorial V sobre R. Mostre que a função R 2 V (a 1, a 2 ) a 1 v 1 + a 2 v 2 é injetora se, e somente se, v 1 e v 2 não são colineares. 1.4 Diga, em cada caso, por que o conjunto com as operações indicadas não satisfaz à denição de espaço vetorial, onde a R. a) R 2, com as operações: (x, y) + (x, y ) = (x + x, y + y ) e a(x, y) = (3ax, 3ay). b) R 2, com as operações: (x, y) + (x, y ) = (xx, yy ) e a(x, y) = (ax, 0). c) R 3, com as operações: (x, y, z) + (x, y, z ) = (0, 0, 0) e a(x, y, z) = (ax, ay, az). 1.5 Sejam U e W dois espaços vetoriais sobre um corpo K. Considere o produto cartesiano V = U W desses dois conjuntos. Dena as seguintes operações em V : (u 1, w 1 ) + (u 2, w 2 ) = (u 1 + u 2, w 1 + w 2 ) e a(u 1, w 1 ) = (au 1, aw 1 ), onde u 1, u 2 U, w 1, w 2 W e a K. Mostre que V com as operações de adição e de mutiplicação por escalar, acima denidas, é um espaço vetorial sobre K. Este espaço vetorial é chamado de espaço produto de U por W.
14 14 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES 2 Matrizes As matrizes são ferramentas básicas da Álgebra Linear, pois além de fornecerem meios para a resolução dos sistemas de equações lineares, elas também representarão as transformações lineares entre espaços vetoriais, como veremos no Capítulo A Denição de Matriz Dados m e n em N \ {0}, denimos uma matriz real de ordem m por n, ou simplesmente uma matriz m por n (escreve-se m n), como uma tabela formada por elementos de R distribuídos em m linhas e n colunas. Estes elementos de R são chamados entradas da matriz 4. Por exemplo, a matriz [3] é uma matriz 1 1, ao passo que [ ] é uma matriz 2 3. As entradas da primeira linha da matriz são dadas pelos números reais 2, 1 e 0 e as entradas da segunda linha da matriz são dadas pelos números reais 1, 2 e 4. É usual indicarmos as entradas de uma matriz arbitrária A pelos símbolos A ij, ou ainda a ij, onde os índices indicam, nessa ordem, a linha e a coluna onde o elemento se encontra. Assim, uma matriz m n é usualmente representada por a 11 a a 1n a A = 21 a a 2n..., a m1 a m2... a mn 4 As entradas de uma matriz não precisam ser necessariamente números reais, podem ser números complexos ou, mais geralmente, elementos de um corpo K.
15 2. MATRIZES 15 ou por A = [a ij ] m n, ou simplesmente por A = [a ij ], quando a ordem da matriz estiver subentendida. matrizes m n. O símbolo M(m, n) denota o conjunto das Dependendo dos valores de m e n, uma matriz m n recebe um nome especial. De fato, toda matriz 1 n é chamada de uma matriz linha e toda matriz m 1 é chamada de uma matriz coluna. Uma matriz n n é chamada de matriz quadrada de ordem n. Por exemplo, a matriz [ ] é uma matriz linha de ordem 1 5 e a matriz é uma matriz quadrada de ordem 3. Se A = [a ij ] é uma matriz quadrada de ordem n, as entradas a ii, com 1 i n, formam a diagonal principal de A. Uma matriz diagonal de ordem n é uma matriz quadrada de ordem n em que os elementos que não pertencem à diagonal principal são iguais a zero: a a a nn A matriz diagonal de ordem n cujas entradas da diagonal principal são iguais ao número real 1, , é chamada matriz identidade de ordem n e denotada usualmente por I n. Em alguns casos, representaremos por simplicidade I n apenas por I.
16 16 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES Uma matriz triangular superior de ordem n é uma matriz quadrada de ordem n em que todos os elementos abaixo da diagonal principal são iguais a zero: a 11 a a 1n 0 a a 2n a nn Portanto, uma matriz quadrada A = [a ij ] de ordem n é triangular superior se a ij = 0 sempre que i > j. Analogamente, uma matriz triangular inferior de ordem n é uma matriz quadrada de ordem n em que todos os elementos acima da diagonal principal são iguais a zero: a a 21 a a n1 a n2... a nn Portanto, uma matriz quadrada A = [a ij ] de ordem n é triangular inferior se a ij = 0 sempre que i < j. Uma matriz m n cujas entradas são todas iguais a zero é chamada de uma matriz nula. Por exemplo, a matriz [ ] é uma matriz nula de ordem Operações com Matrizes Dizemos que duas matrizes A = [a ij ] m n e B = [b ij ] m n, de mesma ordem, são iguais, escrevendo A = B, quando a ij = b ij para todo 1 i m e para todo 1 j n.
17 2. MATRIZES 17 Por exemplo, se x e y denotam números reais, temos que as matrizes [ ] [ ] x e 1 y 1 2 são iguais quando x = 1 e y = 2. Denimos a seguir uma operação de adição no conjunto M(m, n) das matrizes m n. Se A = [a ij ] e B = [b ij ] são duas matrizes de mesma ordem m n, a soma de A e B, denotada A + B, é a matriz C = [c ij ] de ordem m n tal que c ij = a ij + b ij para todo 1 i m e para todo 1 j n. Por exemplo, [ ] [ ] [ ] = Dada uma matriz A = [a ij ], dene-se a matriz oposta de A, como a matriz A = [ a ij ]. A adição de matrizes tem propriedades semelhantes à adição nos números reais, ou à adição de elementos em espaços vetoriais, como mostra o resultado a seguir. Proposição Se A, B e C são matrizes de mesma ordem, então : (i) (ii) (iii) A + (B + C) = (A + B) + C (associatividade da adição); A + B = B + A (comutatividade da adição); A + 0 = A, onde 0 denota a matriz nula m n (elemento neutro); (iv) A + ( A) = 0. Demonstração As propriedades acima decorrem diretamente das denições de igualdade e adição de matrizes. Por esta razão, provaremos apenas o item (i) e deixaremos (ii), (iii) e (iv) como exercício (veja Problema 2.5). (i): Se A = [a ij ], B = [b ij ] e C = [c ij ], então A + (B + C) = [a ij ] + [b ij + c ij ] = [a ij + (b ij + c ij )] = [(a ij + b ij ) + c ij ] = [a ij + b ij ] + [c ij ] = (A + B) + C,
18 18 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES onde usamos a associatividade da adição de números reais. Uma outra operação importante com matrizes é a multiplicação por escalar. Dada a matriz A = [a ij ] m n, denimos o produto de A pelo número real a, como aa = [aa ij ] m n. Por exemplo, = Tendo denido as operações de adição e multiplicação por escalar em M(m, n), denimos a operação de subtração da maneira usual: matrizes A e B em M(m, n), A B = A + ( B). dada as Proposição As seguintes propriedades se vericam para quaisquer A e B M(m, n), e a, a R: (i) a(a + B) = aa + ab; (ii) (a + a )A = aa + a A; (iii) a(a A) = (aa )A; (iv) 1A = A. Demonstração Provaremos apenas (i) e deixaremos a demonstração das demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5). (i): De fato, sejam A = [a ij ], B = [b ij ] elementos de M(m, n) e a um elemento de R, então a(a + B) = a[a ij + b ij ] = [a(a ij + b ij )] = [aa ij + ab ij ] = [aa ij ] + [ab ij ] = a[a ij ] + a[b ij ] = aa + ab, onde usamos a distributividade da multiplicação em relação à adição de números reais.
19 2. MATRIZES 19 Assim, com as Proposições e 1.2.2, provamos que o conjunto M(m, n) é um espaço vetorial sobre R. O conjunto das matrizes tem uma estrutura muito mais rica do que a de simples espaço vetorial, obtida com a noção de produto de matrizes, noção esta, fundamental para a resolução de sistemas de equações lineares com o uso de matrizes. Nosso próximo objetivo é, portanto, denir a multiplicação de matrizes e mostrar algumas de suas propriedades. A denição de produto de matrizes foi apresentada por Arthur Cayley (Inglaterra, ), no trabalho intitulado A Memoir on the Theory of Matrices, publicado em 1858 na revista Philosophical Transactions of the Royal Society of London. Neste trabalho, Cayley notou que a multiplicação de matrizes, como foi denida, simplica em muito o estudo de sistemas de equações lineares. Também observou que esta multiplicação deixava de apresentar propriedades importantes, como a comutatividade e a lei do corte, e que uma matriz não nula não é necessariamente invertível. Sejam A = [a ij ] m n e B = [b ij ] n p duas matrizes. Denimos o produto AB de A por B, denotado por AB, como a matriz C = [c ij ] m p tal que c ij = n a ik b kj = a i1 b 1j + + a in b nj k=1 para todo 1 i m e para todo 1 j p. Vamos explicar esta fórmula para obter o elemento da matriz AB que se encontra na i-ésima linha e j-ésima coluna: Na matriz A, destaque a i-ésima linha, e na matriz B, a j-ésima coluna. Feito isto, multiplique ordenadamente o primeiro elemento da linha com o primeiro elemento da coluna, o segundo elemento da linha com o segundo elemento da coluna, etc., o último elemento da linha com o último elemento da coluna e nalmente some esses números todos.
20 20 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES Por exemplo, 2 4 [ ] 2( 1) + 4(1) = 0( 1) + 0(1) ( 1) + 3(1) 2(1) + 4( 1) 2 2 0(1) + 0( 1) = (1) + 3( 1) 4 4 Note que para o produto de A por B estar denido, o número de colunas de A deve ser igual ao número de linhas de B. Assim, se A e B são matrizes 2 3 e 3 1, respectivamente, o produto AB está denido e é uma matriz 2 1. Porém, o produto BA não está denido. Uma condição necessária para que AB = BA é que A e B sejam matrizes quadradas de mesma ordem. Contudo, esta condição não é suciente. Por exemplo, as matrizes [ ] [ ] A = e B = são matrizes quadradas de ordem 2, mas AB BA. Assim, vemos que a multiplicação de matrizes não possui a propriedade comutativa. Observe que [ ] [ ] = 0, sem que nenhuma das duas matrizes seja nula. Portanto, na multiplicação de matrizes, podemos ter AB = 0 sem que necessariamente A ou B seja nula. Lembremos que isto não ocorre com a multiplicação de números reais, pois dados dois números reais x e y tais que xy = 0, tem-se obrigatoriamente que x = 0 ou y = 0. Os sistemas lineares como em (2) da Seção 1 se expressam de modo perfeito pela equação matricial AX = B, onde a 11 a a 1n x 1 b 1 a A = 21 a a 2n..., X = x 2. e B = b 2.. a m1 a m2... a mn x n b m
21 2. MATRIZES 21 As matrizes A, X e B são chamadas, respectivamente, de matriz dos coecientes do sistema, matriz das incógnitas e matriz dos termos independentes. Na seguinte proposição apresentamos algumas propriedades da multiplicação de matrizes. Proposição Desde que as operações sejam possíveis, temos: (i) A(B + C) = AB + AC (distributividade à esquerda da multiplicação em relação à adição); (ii) (iii) (iv) (A + B)C = AC + BC (distributividade à direita da multiplicação em relação à adição); (AB)C = A(BC) (associatividade); A I = I A = A (existência de elemento identidade). Demonstração Provaremos a propriedade (iii) e deixaremos a demonstração das demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5). (iii): Suponhamos que as matrizes A, B e C sejam de ordens n r, r s e s m, respectivamente. Temos que ( (AB)C )ij = s k=1 (AB) ikc kj = s k=1 ( r l=1 a ilb lk ) ckj = r l=1 a ( s il k=1 b ) lkc kj = r l=1 a il(bc) lj = ( A(BC)) ij. Isto mostra que a propriedade (iii) é válida. Tendo denido a multiplicação de matrizes, denimos a potenciação da maneira usual: dados A em M(n, n) e k N \ {0}, A 0 = I n e A k = A} A {{ A}. k fatores Dada uma matriz A = [a ij ] m n, chamamos de transposta de A, e denotamos por A t, a matriz [b ij ] n m, onde b ij = a ji,
22 22 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES para todo 1 i n e para todo 1 j m. Por exemplo, t [ ] = Uma matriz quadrada A é chamada simétrica se A t = A e antissimétrica se A t = A. Por exemplo, dadas as matrizes A = e B = 1 0 2, a matriz A é simétrica e B é antissimétrica. Terminamos esta seção apresentando o conceito de matriz em blocos. Uma matriz A é dita ser uma matriz em blocos se A está subdividida em matrizes menores, chamadas blocos. Esta subdivisão é, geralmente, apresentada por linhas horizontais e/ou linhas verticais, como mostra o seguinte exemplo: [ ] [ ] = Uma matriz pode ser subdividida em blocos de várias maneiras. exemplo, = = Uma propriedade interessante da partição em blocos é que os resultados das operações de adição e multiplicação com matrizes em blocos podem ser obtidos efetuando o cálculo com os blocos, como se eles fossem simplesmente elementos das matrizes. Por
23 2. MATRIZES Matriz Inversa Dada uma matriz quadrada A de ordem n, chamamos de inversa de A a uma matriz quadrada B de ordem n tal que AB = BA = I n. Por exemplo, dada a matriz temos que a matriz [ ] 2 5 A =, 1 3 [ ] 3 5 B = 1 2 é uma inversa de A, já que AB = BA = I 2. Note que uma matriz[ quadrada ] não possui necessariamente [ uma] inversa. 0 0 a b Por exemplo, seja A =. Dada qualquer matriz B =, temos 0 0 c d que [ ] [ ] [ ] 0 0 a b 0 0 AB = = I c d 0 0 Logo, A não tem inversa. Mesmo que uma matriz [ não ] seja nula, ela pode não ter inversa. Por 1 1 exemplo, a matriz A = não possui inversa, já que não existe uma 1 1 matriz quadrada B de ordem 2 tal que AB = I 2 (verique). Uma matriz quadrada A é dita invertível se A admite uma matriz inversa. Se uma matriz A possui uma inversa, então essa inversa é única. De fato, suponhamos que B e C são duas inversas de uma matriz A de ordem n n. Então AB = I n e CA = I n. Assim, por (iii) e (iv) da Proposição 1.2.3, C = C I n = C(AB) = (CA)B = I n B = B.
24 24 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES Já que a inversa, no caso de existir, é única, escrevemos A 1 para denotar a inversa de A. Se k N \ {0} e A é uma matriz invertível, denimos A k por: A k = A} 1 A 1 {{ A 1 }. k fatores Vejamos algumas propriedades das matrizes inversas. Proposição Sejam A e B matrizes quadradas de ordem n. (i) Se A é invertível, então A 1 é também invertível e (A 1 ) 1 = A. (ii) Se A e B são invertíveis, então AB também é invertível e (AB) 1 = B 1 A 1. Deixamos a demonstração desta proposição ao leitor (veja Problema 2.12), bem como a generalização do item (ii) para um número arbitrário de fatores. O interesse das matrizes invertíveis reside no fato de que dado um sistema linear de equações com n equações e n incógnitas, AX = B, se soubermos que a matriz A é invertível e soubermos como calcular sua inversa, então o sistema se resolve efetuando apenas a multiplicação da matriz A 1 com B, pois AX = B = X = (A 1 A)X = A 1 (AX) = A 1 B. Vimos que uma matriz quadrada não nula não possui necessariamente inversa. Uma pergunta natural é se podemos caracterizar as matrizes quadradas invertíveis, ou seja, se podemos apresentar uma condição necessária e suciente para que uma matriz quadrada seja invertível. Também estamos interessados em obter um método para o cálculo da inversa de uma matriz invertível. No próximo capítulo, apresentaremos uma caracterização de matrizes invertíveis e um método para inversão de matrizes que utiliza as transformações elementares nas linhas de uma matriz e a forma escalonada. No Capítulo 8, Proposição 8.3.1(iii), veremos um outro modo bem diferente de atacar este problema pelo uso dos determinantes. Problemas
25 2. MATRIZES 25 [ ] * Sejam A= Calcule 2A, 3B e 2A 3B. [ ] e B= Determine os valores de x, y e z em R para que as matrizes A e B dadas sejam iguais: [ ] x + y 0 A = z x 2y [ ] 13 0 e B = Dadas as matrizes [ ] [ ] A =, B =, C = 1 e D = [ 1 1], determine: (a) A + B; (b) 2C; (c) AC; (d) CD; (e) BC; (f) DA. 2.4* Considere as matrizes A = [a ij ] 4 5 com a ij = i j, B = [b ij ] 5 9 com b ij = j e C = [c ij ] com C = AB. (a) É possível determinar c 63? Justique a resposta. (b) Determine c Conclua as demonstrações das Proposições 1.2.1, e * Dada uma matriz A, dizemos que uma matriz X comuta com A se AX = XA. Determine todas as matrizes que comutam com [ ] 1 0 A = a) Mostre que a matriz c I n, onde c R, comuta com toda matriz X M(n, n).
26 26 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES b) Ache todas as matrizes M = [ x z ] [ ] y 1 1 que comutam com a matriz. t Verdadeiro ou falso? Justique. (a) Se A e B são matrizes quadradas de mesma ordem, então (A B)(A + B) = A 2 B 2. (b) Se A, B e C são matrizes quadradas de mesma ordem tais que AB = AC, então B = C. 2.9 Mostre que se A é uma matriz triangular superior, então A 2 também é uma matriz triangular superior. [ ] 2.10* (a) Obtenha A t 1 2 3, onde A = (b) Verique que a transposta de uma matriz triangular superior é uma matriz triangular inferior. (c) Mostre que (A + B) t = A t + B t e (ka) t = ka t, onde A e B são matrizes de mesma ordem e k R. (d) Se A é uma matriz m n e B é uma matriz n p, prove que (AB) t = B t A t. (e) Mostre que (A t ) t = A para toda matriz A de ordem m n. 2.11* Mostre que se B é uma matriz quadrada, então: (a) B + B t e BB t são simétricas; (b) B B t é antissimétrica. (c) Observando que B = B + Bt 2 + B Bt, 2 conclua que toda matriz quadrada se escreve como soma de uma matriz simétrica e de uma matriz antissimétrica.
27 2. MATRIZES 27 (d) Mostre que a escrita em (c) é o único modo possível de escrever uma matriz quadrada como soma de uma matriz simétrica e de uma matriz antissimétrica Prove a Proposição Demonstre que: (a) se A tem uma linha nula, então AB tem uma linha nula; (b) se B tem uma coluna nula, então AB tem uma coluna nula; (c) qualquer matriz quadrada com uma linha ou uma coluna nula não é invertível Mostre que uma matriz A é invertível se, e somente se, A t é invertível. Conclua que as operações de inversão e de transposição comutam; isto é, (A t ) 1 = (A 1 ) t, quando A é invertível Sejam a = (a 1,..., a n ), b = (b 1,..., b n ) R n. Denamos a a Diag(a) = a n Mostre que: (a) Diag(a) + cdiag(b) = Diag(a + cb) onde c R; (b) Diag(a) Diag(b) = Diag(b) Diag(a) = Diag(a 1 b 1,..., a n b n ); (c) Diag(a) m = Diag(a m 1,..., a m n ), onde m N \ {0}; (d) Em que condições a matriz Diag(a) é invertível e qual é a sua inversa? Este problema mostra que somar, multiplicar, calcular potências e inverter matrizes diagonais é muito simples Supondo que as matrizes A, B e C são matrizes quadradas de mesma ordem e invertíveis, resolva as seguintes equações matriciais nas quais X é a incógnita:
28 28 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES (a) CX + 2B = 3B; (b) CAX t = C; (c) ABX = C. [ ] a b 2.17 Dada uma matriz A =, mostre que : c d a) se ad bc 0, então A é invertível e [ A 1 1 d = ad bc c b) se ad bc = 0, então A não é invertível. ] b ; a
29 Bibliograa [1] H. P. Bueno, Álgebra Linear, um segundo curso, Coleção Textos Universitários, SBM, [2] P. Halmos, Teoria Ingênua dos Conjuntos, Editora Ciência Moderna, [3] A. Hefez e M. L. T. Villela, Códigos Corretores de Erros, Coleção Matemática e Aplicações, IMPA, [4] A. Hefez e M. L. T. Villela, Números Complexos e Polinômios, Coleção PROFMAT, SBM, [5] V. J. Katz, A History of Mathematics - an Introduction, HarperCollins College Publishers, [6] S. Lang, Introduction to Linear Algebra, 2 nd edition, Undergraduate Texts in Mathematics, Springer, [7] E.L. Lima, Álgebra Linear, 3 a edição, Coleção Matemática Universitária, IMPA, [8] E.L. Lima, Geometria Analítica e Álgebra Linear, 2 a edição, Coleção Matemática Universitária, IMPA,
30 2 Livro: Introdução à Álgebra Linear Autores: Abramo Hefez Cecília de Souza Fernandez Capítulo 2: Transformação de Matrizes e Resolução de Sistemas Sumário 1 Transformação de Matrizes Transformações Elementares de Matrizes Forma Escalonada de uma Matriz Matrizes Elementares e Aplicações Resolução de Sistemas Lineares
31 30CAPÍTULO 2. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES E RESOLUÇÃO DE SISTEMAS O método de eliminação em sistemas de equações lineares consiste em e- fetuar repetidamente transformações elementares sobre um sistema de equações lineares, de modo a ir obtendo sistemas equivalentes, até reduzir o sistema original a um sistema de fácil resolução. Neste capítulo, reinterpretaremos na matriz ampliada associada a um sistema de equações lineares as transformações que se efetuam nos sistemas de equações ao longo do processo de eliminação, explicitando seu caráter algorítmico, ou seja, de procedimento sistemático e efetivo. Esse método é essencialmente devido a Gauss e foi aperfeiçoado por Camille Jordan (França, ) e, por este motivo, é chamado de eliminação de Gauss-Jordan. 1 Transformação de Matrizes 1.1 Transformações Elementares de Matrizes Seja A uma matriz m n. Para cada 1 i m, denotemos por L i a i-ésima linha de A. Denimos as transformações elementares nas linhas da matriz A como se segue: 1) Permutação das linhas L i e L j, indicada por L i L j. 2) Substituição de uma linha L i pela adição desta mesma linha com c vezes uma outra linha L j, indicada por L i L i + cl j. 3) Multiplicação de uma linha L i por um número real c não nulo, indicada por L i cl i. Por exemplo, vamos efetuar algumas transformações elementares nas linhas da matriz
32 1. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES 31 Temos L 1 L , L L / e L 2 L 2 L Sejam A e B matrizes de ordem m n. A matriz A é dita ser equivalente por linhas à matriz B se B pode ser obtida de A pela aplicação sucessiva de um número nito de transformações elementares sobre linhas. Por exemplo, as matrizes e são equivalentes por linhas já que L 2 L 2 2L 1 L 3 L 3 + 2L 1 L 3 L 3 3L Observe que a noção de equivalência de matrizes por linhas corresponde à noção de equivalência de sistemas lineares quando se efetuam as respectivas transformações sobre as equações. De fato, a sistemas equivalentes, correspondem matrizes associadas equivalentes, e vice-versa.
33 32CAPÍTULO 2. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES E RESOLUÇÃO DE SISTEMAS Note que se A é equivalente por linhas a uma matriz B, então B é equivalente por linhas à matriz A, já que toda transformação elementar sobre linhas é reversível. Mais precisamente, se e representa uma das transformações elementares nas linhas de uma matriz A de ordem m n, denotando por e(a) a matriz obtida de A aplicando-lhe a transformação e, temos o resultado a seguir. Proposição Toda transformação elementar e nas linhas de matrizes em M(m, n) é reversível, no sentido de que existe uma transformação elementar e tal que e (e(a)) = A e e(e (A)) = A, para todo A M(m, n). Demonstração Se e é uma transformação elementar do tipo L i L j, tome e = e. Se e é uma transformação elementar do tipo L i cl i, tome e como a tranformação L i 1 c L i. Finalmente, se e é uma transformação elementar do tipo L i L i + cl j, tome e como a tranformação L i L i cl j. Não é difícil o leitor se convencer de que, em cada caso na demonstração anterior, e é a única transformação elementar com a propriedade que e (e(a)) = A para toda matriz A M(m, n). Se A é uma matriz equivalente por linhas a uma matriz B (e, então, B é equivalente por linhas a A), dizemos simplesmente que A e B são matrizes equivalentes. 1.2 Forma Escalonada de uma Matriz Nesta subseção mostraremos que toda matriz pode ser transformada por meio de uma sequência de transformações elementares sobre linhas numa matriz em uma forma muito especial, a forma escalonada, que será utilizada na próxima seção para resolver sistemas de equações lineares. Uma matriz m n será dita estar na forma escalonada se for nula, ou se: 1) o primeiro elemento não nulo de cada linha não nula é 1; 2) cada coluna que contém o primeiro elemento não nulo de alguma linha tem todos os seus outros elementos iguais a zero;
34 1. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES 33 3) toda linha nula ocorre abaixo de todas as linhas não nulas; 4) se L 1,..., L p são as linhas não nulas, e se o primeiro elemento não nulo da linha L i ocorre na coluna k i, então k 1 < k 2 < < k p. Por exemplo, a matriz está na forma escalonada, pois todas as condições da denição anterior são satisfeitas, mas as matrizes e não estão na forma escalonada, pois a primeira não satisfaz a condição 2, enquanto a segunda não satisfaz a condição 1 (observe que ela também não satisfaz a condição 4). Cabe aqui uma observação acerca da terminologia que utilizamos. Usualmente, na literatura, o termo forma escalonada de uma matriz refere-se a uma forma menos especial do que a nossa, a qual vários autores chamam de forma escalonada reduzida. A nossa justicativa para o uso dessa terminologia é que não há razão para adjetivarmos a forma escalonada, pois utilizaremos apenas uma dessas noções. O resultado que apresentaremos a seguir nos garantirá que toda matriz é equivalente por linhas a uma matriz na forma escalonada. O interesse desse resultado reside no fato que ao reduzir a matriz ampliada associada a um dado sistema de equações lineares à forma escalonada, encontramos um outro sistema equivalente ao sistema dado que se encontra em sua expressão mais simples. Quando aplicado aos sistemas de equações lineares, este resultado é chamado de processo de eliminação de Gauss-Jordan.
35 34CAPÍTULO 2. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES E RESOLUÇÃO DE SISTEMAS Vejamos agora um algoritmo que reduz por linhas uma matriz dada não nula qualquer a uma matriz na forma escalonada. O termo reduzir por linhas signica transformar uma matriz usando as transformações elementares sobre linhas. Este processo é também chamado de escalonamento de matrizes. Passo 1. Seja k 1 a primeira coluna da matriz dada com algum elemento não nulo. Troque as linhas entre si de modo que esse elemento não nulo apareça na primeira linha, isto é, de modo que na nova matriz a 1k1 0. Passo 2. Para cada i > 1, realize a transformação L i L i a ik 1 a 1k1 L 1. Repita os Passos 1 e 2 na matriz assim obtida, ignorando a primeira linha. Novamente, repita os Passos 1 e 2 nessa nova matriz, ignorando as duas primeiras linhas etc., até alcançar a última linha não nula. Passo 3. Se L 1,..., L p são as linhas não nulas da matriz obtida após terminar o processo acima e se k i é a coluna na qual aparece o primeiro elemento não nulo a iki da linha L i, aplique as transformações L i 1 a iki L i para todo 1 i p. Passo 4. Realize na matriz obtida até então as transformações L l L l a lki L i, l = 1,..., i 1, para i = 2. Depois para i = 3, e assim por diante, até i = p. Dessa forma, obteremos uma matriz na forma escalonada que é equivalente por linhas à matriz dada. Estabelecemos assim o seguinte resultado: Teorema Toda matriz é equivalente a uma matriz na forma escalonada. Por exemplo, a matriz /2
36 1. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES 35 é transformada numa matriz na forma escalonada com a seguinte sequência de transformações sobre suas linhas: L /2 L / /2 2 L 3 2L / / /2 L 1 L L 1 L 1 + 3L L L 2 L L Pelo algoritmo acima, deduzimos que qualquer matriz é equivalente a pelo menos uma matriz na forma escalonada. Como em cada passo do algoritmo temos certa margem de escolhas de transformações elementares sobre as linhas da matriz, não há aparentemente nenhum motivo para poder armar que a forma escalonada de uma dada matriz seja única. Fato é que, não importando qual a sequência de transformações elementares que efetuemos nas linhas de uma dada matriz, no nal do processo chegamos a uma mesma matriz na forma escalonada que é equivalente à matriz dada. Este resultado será provado na última seção do capítulo 1.3 Matrizes Elementares e Aplicações Uma matriz elementar de ordem n é uma matriz quadrada de ordem n obtida da matriz identidade I n a parir da aplicação de uma transformação elementar, isto é, trata-se de uma matriz da forma E = e(i n ), onde e é uma transformação elementar. Por exemplo, a matriz identidade é uma matriz elementar e as matrizes [ ] 0 1 e(i 2 ) =, onde e: L 1 L 2, 1 0
37 36CAPÍTULO 2. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES E RESOLUÇÃO DE SISTEMAS e e(i 3 ) = 0 1 0, onde e: L 1 L 1 + L 2, são matrizes elementares de ordem 2 e de ordem 3, respectivamente. Sejam A M(m, n) e e uma transformação elementar. O próximo resultado, cuja demonstração ca como exercício para o leitor (veja Problema 1.3), nos diz que a matriz e(a) pode ser obtida como o produto da matriz elementar e(i m ) pela matriz A. Por exemplo, consideremos 1 2 A = Se e 1 : L 1 L 2, e 2 : L 1 2L 1 e e 3 : L 1 L 1 + 2L 2, uma rápida vericação nos mostra que e 1 (A) = e 1 (I 3 )A, e 2 (A) = e 2 (I 3 )A e e 3 (A) = e 3 (I 3 )A. Teorema Seja e uma transformação elementar sobre matrizes de M(m, n). Considere a matriz elementar E = e(i m ). Então e(a) = EA, para todo A M(m, n). Como consequência do Teorema 2.1.3, temos Corolário Sejam A e B em M(m, n). Então, A é equivalente a B se, e somente se, existem matrizes elementares E 1,..., E s de ordem m tais que Demonstração E s E 2 E 1 A = B. Por denição, A é equivalente a B quando existem transformações elementares e 1,..., e s tais que e s (... (e 2 (e 1 (A)))... ) = B. Mas, pelo teorema anterior, a igualdade acima equivale a E s E 2 E 1 A = B,
38 1. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES 37 onde E i = e i (I m ), para cada 1 i s. Corolário Toda matriz elementar é invertível e sua inversa também é uma matriz elementar. Demonstração Seja E uma matriz elementar. Seja e a transformação elementar tal que E = e(i). Se e é a transformação elementar inversa de e e se E = e (I), pelo Teorema temos e Logo, E é invertível e E 1 = E. I = e (e(i)) = e (E) = e (I)E = E E I = e(e (I)) = e(e ) = e(i)e = E E. Pelo Corolário sabemos como inverter uma matriz elementar. Por exemplo, se considerarmos as matrizes A = e B = 0 1 0, podemos concluir que A e B são invertíveis, já que A e B são matrizes elementares. De fato, A = e 1 (I 3 ) com e 1 : L 1 L 2 e B = e 2 (I 3 ) com e 2 : L 1 L 1 + 2L 2. Pelo Corolário 2.1.5, A 1 = e 1(I 3 ), onde e 1 é a transformação elementar inversa de e 1 e B 1 = e 2(I 3 ), onde e 2 é a transformação elementar inversa de e 2. Mais precisamente, A 1 = e B 1 = A seguir, apresentamos o resultado central desta seção que caracteriza as matrizes invertíveis. Teorema Para uma matriz quadrada A de ordem n, são equivalentes as seguintes armações: (i) A é invertível;
39 38CAPÍTULO 2. TRANSFORMAÇÃO DE MATRIZES E RESOLUÇÃO DE SISTEMAS (ii) Se B é uma matriz na forma escalonada equivalente a A, então B = I n ; (iii) A é uma matriz elementar ou um produto de matrizes elementares. Demonstração Vamos começar provando a implicação (i) (ii). Com efeito, como B é equivalente a A, pelo Corolário 2.1.4, existem matrizes elementares E 1, E 2,..., E s tais que E s E 2 E 1 A = B. Como, pelo Corolário 2.1.5, cada E i é invertível e A, por hipótese, é invertível, temos que B é invertível (cf. Proposição 1.2.4). Por outro lado, pelo Problema 1.7, temos que B = I n. A implicação (ii) (iii) é evidente, já que A = E1 1 E2 1 Es 1 B, onde B = I n e cada E 1 i é uma matriz elementar (cf. Corolário 2.1.5). A implicação (iii) (i) é evidente, pois matrizes elementares são invertíveis e produtos de matrizes invertíveis são invertíveis (cf. Proposição 1.2.4). Observe, como decorrência do resultado acima, que uma matriz quadrada invertível é equivalente a uma única matriz na forma escalonada (a matriz identidade), cando estabelecida, neste caso, a unicidade da forma escalonada. Finalizamos esta seção apresentando um método para inversão de matrizes por meio de transformações elementares. Proposição Sejam A uma matriz invertível e e 1,..., e s uma sequência de transformações elementares tais que e s (... (e 2 (e 1 (A)))... ) = I, onde I é a matriz identidade. Então essa mesma sequência de transformações elementares aplicada a I produz A 1 ; isto é, e s (... (e 2 (e 1 (I)))... ) = A 1. Demonstração Para cada 1 i s, seja E i a matriz elementar correspondente à transformação e i. Então Assim, E s E 2 E 1 A = I. (E s E 2 E 1 I)A A 1 = I A 1,
Capítulo 2: Transformação de Matrizes e Resolução de Sistemas
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