Jornalismo literário na formação histórico-cultural da cidade 1

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1 Jornalismo literário na formação histórico-cultural da cidade 1 Ahynssa Thamir Gomes SILVA 2 Thaís Holanda PRACIANO 3 Alejandro Vivanco SEPÚLVEDA 4 Universidade de Fortaleza, Fortaleza, CE RESUMO Trata-se de uma reportagem publicada na revista-laboratório A Ponte, do curso de Jornalismo da Unifor, que lança mão dos recursos do jornalismo literário para contar a história da Academia Cearense de Letras. Optou-se por ir além ao permitir a experimentação de um relato em primeira pessoa, como se a instituição falasse de si, contando a sua própria vida, a de seus personagens e as curiosidades relacionadas à cidade de Fortaleza. As alunas puderam participar de todas as etapas de produção de uma matéria jornalística voltada para a revista, desde o pensamento da pauta, o foco da matéria, a escolha das fontes, enquadramento das fotografias, até a sua diagramação. PALAVRAS-CHAVE: Jornalismo Literário; Revista; Academia Cearense de Letras; História. 1. INTRODUÇÃO A primeira Academia de Letras do Brasil é cearense e foi fundada no dia 15 de agosto de Há quase 120 anos, os seus criadores, que eram intelectuais irreverentes, nacionalistas e nada tradicionais, foram inspirados pelos ideais da Padaria Espiritual e resolveram criar um espaço no qual a verdadeira literatura do Ceará pudesse ser exposta, surgindo assim a Academia Cearense de Letras. A matéria foi desenvolvida durante a disciplina de Princípios e Técnicas de Jornalismo Impresso II, no período de , para ser veiculada na revista-laboratório A Ponte, veículo que possui perfil monotemático, publicação semestral e adota o gênero denominado jornalismo literário. 1 Trabalho submetido ao XXI Prêmio Expocom 2014, na Categoria Jornalismo, modalidade Produção Jornalismo Literário e/ou Opinião. 2 Aluno líder do grupo e estudante do 7º. Semestre do Curso Comunicação Social - Jornalismo, ahynssa@hotmail.com. 3 Estudante do 7ª. Semestre do Curso Comunicação Social - Jornalismo, thaispraciano@gmail.com. 4 Orientador do trabalho. Professor do Curso Comunicação Social - Jornalismo, alejandro@unifor.br. 1

2 O gênero de jornalismo literário torna flexível a experimentação de novas formas de escrita e dá a possibilidade de um maior aprofundamento nos assuntos, o contar da história é recriado de maneira leve. No caso d'a Ponte, a sua linha editorial privilegia contar histórias por meio do relato de personagens anônimas. A edição em que foi publicada a reportagem tinha como tema Descobrindo Fortaleza. A ideia era que os alunos percorressem diversos pontos importantes da capital cearense para apresentar ao leitor uma abordagem destes cenários e seus personagens, a partir de uma perspectiva diferenciada. Sob a orientação do professor da disciplina, os alunos passaram por todo o processo de produção jornalístico, desde a elaboração da pauta, pesquisa, angulação do texto, entrevistas, enquadramento das fotos, edição de imagens e textos, revisão e diagramação. A dupla de repórteres optou por uma forma de narrativa experimental: apresentar a Academia Cearense de Letras em primeira pessoa, com a intenção de humanizá-la e aproximá-la do leitor. Embora a Academia possua muitos nomes ilustres, conhecidos da trajetória da Academia, e citados na matéria, as autoras perceberam que a sua história também poderia ser contada por pessoas anônimas, fontes não oficiais, mas que participam ativamente do seu cotidiano. Os relatos são de pessoas comuns que deixam os seus traços no local e mostram curiosidades sob outros pontos de vista. 2. OBJETIVO Desenvolver o gênero de jornalismo literário por meio da elaboração de uma grande reportagem para a revista do curso, como também possibilitar ao aluno o acesso a todas as etapas da produção jornalística impressa. Fomentar o incentivo à inovação no desenvolvimento das matérias jornalísticas, com uma proposta de veículo que permita a experimentação da escrita, exercitando as etapas de criação de uma reportagem de jornalismo literário envolvendo todos os recursos que ela propicia. 2

3 3. JUSTIFICATIVA A comunicação do texto jornalístico literário funciona como uma ponte entre a sociedade e a notícia, pois proporciona uma leitura diferente daquela encontrada em outros meios de comunicação. O seu texto é mais aproximado da literatura do que dos jornais, já que o uso de descrições, diálogos, adjetivos e recursos literários são amplamente utilizados. Completando 120 anos em agosto de 2014, a Academia Cearense de Letras foi a primeira do país, surgindo antes mesmo da brasileira. Sua importância é cultural e histórica para a cidade de Fortaleza, além da contribuição científica e literária, que são as principais razões porque as autoras a escolheram como tema. A proposta da revista é falar sobre algum local ou personagem de Fortaleza pouco conhecido e explorado pela população. Pensando nisso, as alunas perceberam que poucas pessoas da própria cidade conheciam a Academia e que isto poderia ser explorado. O espaço é bastante visitado por escolas, mas ainda assim muitas pessoas desconhecem a sua existência. Desta forma, o principal objetivo da matéria foi levar o leitor para dentro da Academia por meio da leitura e instigar nele o desejo de conhecê-la. A Academia abriga diversas obras de arte e um grande acervo de livros que poderiam ser amplamente utilizados pela sociedade. O local por si próprio já conta uma história e possui personagens incomuns que a visitam todos os dias. Entretanto, são necessárias inúmeras reformas e um maior policiamento para que as pessoas possam visitála com mais conforto. A reportagem pretendeu explorar a história da ACL, como também suas falhas e relevância cultural. Optou-se por deixar o próprio local contar sua história em primeira pessoa, fazendo assim um convite pessoal para que a população conheça e desfrute do que ela tem a oferecer. 4. MÉTODOS E TÉCNICAS UTILIZADOS A produção jornalística literária apresentada foi desenvolvida na disciplina Princípios e Técnicas do Jornalismo Impresso II, do curso de Comunicação Social da Universidade de Fortaleza, em que todos os semestres os alunos desenvolvem uma edição 3

4 da revista A Ponte. A revista é monotemática e pretende exercitar o olhar mais apurado e sensível dos alunos, que produzem em duplas matérias de jornalismo literário sobre o tema, bem como o material fotográfico. Para a edição No. XX d'a Ponte, elaborada no primeiro semestre de 2013, os alunos escolheram por meio de votação o tema Descobrindo Fortaleza. A ideia era que o público-alvo da revista, estudantes universitários, conheça facetas da sua cidade que não imaginavam existir. Os estudantes são responsáveis por realizar a pauta, sair a campo e realizar entrevistas e pesquisas, escrever a matéria, fazer as fotos e acompanhar todo o processo de diagramação. O jornalismo literário é uma produção que é feita com pesquisas e investigações, demorando mais tempo para ser finalizada do que uma notícia factual, que deve chegar o mais rápido possível para o leitor. A informação é, portanto, muito mais aprofundada, densa e detalhada, dando espaço para assuntos que não seriam abordados em outros formatos. Como afirma Pena, o jornalismo literário: Significa potencializar os recursos do jornalismo, ultrapassar os limites dos acontecimentos cotidianos, proporcionar visões amplas da realidade, exercer plenamente a cidadania, romper as correntes burocráticas do lide, evitar os definidores primários e, principalmente, garantir perenidade e profundidade aos relatos. No dia seguinte, o texto deve servir para algo mais do que simplesmente embrulhar o peixe na feira. (PENA, 2008, p. 6-7) Ressalta-se que esse gênero, mesmo que próximo da literatura, ainda possui a informação como o seu principal objetivo. O seu público-alvo é composto por qualquer pessoa que deseje informar-se em um nível mais aprofundado e pessoal. O texto transforma-se em mais do que um relato e torna-se emissor de história e cultura. A matéria apresentada fala sobre a Academia Cearense de Letras, seu surgimento, espaços, arredores, história, usos diários e personagens que não são notados pelos visitantes. Foi escolhido o uso de primeira pessoa para humanizar a própria academia e deixar o leitor mais próximo dela. A principal proposta foi levar o leitor para dentro da Academia por meio da leitura e fazê-lo passear pela sua história. Para isso, além do usa da primeira pessoa, foram utilizados outros recursos para facilitar a imersão do leitor. Como mostra Martinez (2009), os sete pilares da Academia Brasileira de Jornalismo Literário são imersão do repórter na 4

5 realidade; voz autoral; estilo; precisão de dados e informação; uso de símbolos; digressão e humanização. A Academia Cearense de Letras foi visitada diversas vezes antes da realização da matéria. Também foram lidos vários livros da própria biblioteca da Academia que contam a sua história e curiosidades. A imersão do repórter é explicada por Passos e Orlandini (2008) como pesquisa intensiva ou exaustiva somada à convivência (e em muitos casos, vivência) com o tema e personagens sobre quem se escreverá, em longas entrevistas e no acompanhamento de atividades rotineiras. Os personagens escolhidos para a narrativa, fora a própria Academia que se tornou um personagem principal, foram pessoas que convivem diariamente com a ACL e não são notadas. O encarregado dos serviços-gerais e dois visitantes, que vão à academia todos os dias, foram escolhidos em vez dos próprios acadêmicos. A escolha desses personagens partiu do princípio de que, nesse gênero, como afirmam Passos e Orlandini (2008), é preciso buscar fontes alternativas, ouvir pontos de vistas menos abordados pela imprensa diária, o que demanda pesquisa (inclusive em campo) de qualidade. O jornalismo literário possui como característica a sua atemporalidade e, por isso, a matéria foi escrita para ser lida a qualquer momento. A sua construção foi construída baseada na própria história da Academia expandindo para todas as nuances que são próprias do local, sem preocupar-se com acontecimentos pontuais da contemporaneidade e sim com aspectos que são indiferentes ao tempo. Como ressalta Pena: Ele não está mais enjaulado pelo deadline, a famosa hora de fechamento do jornal ou da revista, quando inevitavelmente deve entregar a sua reportagem. E nem se preocupa com a novidade, ou seja, com o desejo do leitor em consumir os fatos que aconteceram no espaço de tempo mais imediato possível. Seu dever é ultrapassar estes limites e proporcionar uma visão ampla da realidade. (PENA, 2008, p. 7) Após a pesquisa, visitações à academia, entrevista com os personagens e escolha das fotografias, a matéria foi escrita e diagramada. Neste momento é necessário pensar em como fazer para o texto ficar disposto de forma criativa, dinâmica e de fácil compreensão. Para isso, são utilizados outros recursos, como um QR code, matérias coordenadas e uma breve linha do tempo. 5

6 A matéria foi inteiramente pensada para ser lida como um quebra-cabeça que se completa no final e dá ao leitor uma visão ampla e diferenciada da Academia Cearense de Letras. O foco na construção foi a sua relevância história e detalhes que não são percebidos em uma primeira visita. Espera-se que os leitores aprendam mais sobre a história da Academia e sua relevância para a cidade, além de desejar visitá-la. Como afirma Pena: Diferentemente das reportagens do cotidiano, que, em sua maioria, caem no esquecimento no dia seguinte, o objetivo aqui é a permanência. Um bom livro permanece por gerações, influenciando o imaginário coletivo e individual em diferentes contextos históricos. Para isso, é preciso fazer uma construção sistêmica do enredo, levando em conta que a realidade é multifacetada, fruto de infinitas relações, articulada em teias de complexidade e indeterminação. (PENA, 2008, p. 8-9) 5. DESCRIÇÃO DO PRODUTO OU PROCESSO A produção jornalística literária sobre a Academia Cearense de Letras foi desenvolvida em dupla durante a disciplina de Princípios e Técnicas de Jornalismo Impresso II para ser publicada na Revista A Ponte, veículo o qual possui perfil monotemático e publicação semestral. O tema desta edição é Descobrindo Fortaleza e foi escolhido em uma reunião de pauta realizada no início do semestre de com os alunos e o professor da disciplina. A proposta do tema é mostrar uma cidade desconhecida para muitos ou que passa despercebida com a correria do dia a dia. E, para isso, os alunos percorreram diversos pontos importantes da capital cearense para mostrar ao leitor uma abordagem destes cenários a partir de perspectivas diferenciadas. Com a narração em primeira pessoa, o espaço da Academia Cearense de Letras foi humanizado e exposto a partir de um novo ponto de vista. O rompimento com o lead tradicional potencializou a utilização de outros recursos jornalísticos. A busca por fontes alternativas permitiu apresentações amplas da realidade, que fogem dos pontos de vista abordados pela imprensa diária. E as constantes visitas levaram à profundidade dos relatos, além de uma melhor percepção dos acontecimentos cotidianos. A pesquisa foi realizada por meio de várias visitas à Academia, tanto para conhecer o seu acervo, o público frequentador, as pessoas das redondezas e facilitar uma imersão na 6

7 realidade apresentada. A biblioteca da ACL serviu como fonte histórica e as conversas com os personagens da matéria deram o tom curioso e humanizador aos relatos. Para a realização da matéria, as alunas trabalharam de forma conjunta e tiveram contato com todas as etapas da produção jornalística, desde a elaboração da pauta com a orientação do professor da disciplina, a pesquisa de campo, a perspectiva das entrevistas, o enquadramento das fotos e a disponibilidade do texto na diagramação. O gênero de jornalismo literário torna flexível a experimentação de novas formas de escrita e permite ao aluno uma reflexão sobre a produção jornalística factual. Com a possibilidade de um maior aprofundamento nos assuntos, a escrita é recriada e desenvolvida de maneira leve. É passado ao leitor um efeito de humanização e imersão na realidade apresentada, propiciando assim que ele viva o que foi percebido pelo jornalista. 6. CONSIDERAÇÕES A matéria produzida sobre a Academia Cearense de Letras para a revista A Ponte proporcionou às alunas o exercício pleno de uma reportagem de revista, incluindo todo o seu processo de criação de pauta, apuração, pesquisa, entrevista, escrita, escolha de outros recursos e diagramação. As alunas tiveram a oportunidade de aprender como se estrutura um texto de jornalismo literário, suas origens e importância para a comunicação. Foi possível desenvolver como é feita a sua construção, incluindo a narrativa diferenciada de outros gêneros jornalísticos. A experiência de ir a campo para colher dados, pesquisar e entrevistar foi bastante benéfico para as estudantes, que aprenderam como aproveitar e explorar uma pauta tendo a liberdade de mudar as direções do texto. Além disso, foi possível conhecer a aprender sobre a Academia Cearense de Letras e criar um vínculo com a sua história e personagens. 7

8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS MARTINEZ, Mônica. Jornalismo literário: um gênero em expansão. Intercom - Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, São Paulo, v. 32, n. 2, p , Disponível em: < Acesso em: 15 mar PASSOS, Mateus Yuri; ORLANDINI, Romulo Augusto. Um modelo dissonante: caracterização e gêneros do jornalismo literário. Revista Contracampo, Niterói, n. 18, p.75-96, Disponível em: < Acesso em: 15 mar PENA, Felipe. O jornalismo Literário como gênero e conceito. Revista Contratempo, Niterói, n. 17, p.43-58, Disponível em: < Acesso em: 15 mar