O USO DO DISSULFIRAM NA DEPENDÊNCIA AO CRACK. ENSAIO CLÍNICO.

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1 O USO DO DISSULFIRAM NA DEPENDÊNCIA AO CRACK. ENSAIO CLÍNICO. Nome dos autores: Thaynne Almeida Diniz 1 ; Leonardo Baldaçara 2 ; Bruna Leal Parreira 3 1 Acadêmica do Curso de medicina; Campus de Palmas; thaynne_immortal@hotmail.com PIVIC/UFT 2 Orientador(a) do Curso de Medicina; Campus de Palmas; leonardobaldassara@gmail.com 3 Co-autor(a) do Curso de Medicina; Campus de Palmas; beelep@gmail.com RESUMO A cocaína é uma das drogas ilícitas mais consumidas no mundo. Atualmente, cerca de 0,3% da população mundial consumem a cocaína e o crack. A cocaína é obtida através da maceração das folhas da planta Erythroxylon coca, em sequencia, é misturada a determinados produtos químicos, produzindo uma pasta alcalina, que é a forma base para o crack. A droga vai atuar nos sistemas gabaérgicos e glutamatérgicos na modulação do sistema de recompensa cerebral, causando os sintomas de euforia, manias e desejo por um novo episódio de consumo, podendo o indivíduo evoluir para situações de uso nocivo e dependência. Até o momento, nenhum medicamento mostrou-se eficaz para proporcionar alívio aos sintomas de abstinência, tampouco para atuar sobre o comportamento de busca da substância. O dissulfiram, atualmente, tem mostrado um potencial efeito na terapia da dependência a cocaína. O presente estudo foi realizado com o intuito de averiguar a eficácia do dissulfiram quando comparado ao tratamento com placebo na redução do uso do crack em indivíduos com critérios de dependência. Apesar do dissulfiram já ter sido utilizado para dependência à cocaína é importante estudar o crack separadamente por se tratar de droga de concentração, absorção e distribuição diferenciada. Palavras-chave: Dissulfiram; Crack; Dependência; Ensaio Clínico. INTRODUÇÃO A cocaína ressurgiu em nosso cotidiano nos últimos 20 anos. 1 Desde lá, novos padrões de consumo e apresentações da substância foram introduzidos. 2 A cocaína e o crack são consumidos por 0,3% da população mundial, constituindo-se na terceira substância ilícita mais utilizada, atrás dos solventes (2,7%) e da maconha (6,6%). Nas salas de emergência, a cocaína é responsável por 30% a

2 40% das admissões relacionadas a drogas ilícitas, 10% entre todos os tipos de drogas e 0,5% das admissões totais. 3 A população de usuários é extremamente jovem, variando dos 15 aos 45 anos, com predomínio da faixa etária dos 20 aos 30 anos. 4 A cocaína é um alcalóide extraído das folhas da coca (Erythroxylon coca), planta originária dos altiplanos andinos. 5 Genericamente, a obtenção da cocaína passa por duas etapas e origina diversos subprodutos. 3 A maceração das folhas, misturada a determinados produtos químicos, produz uma pasta de natureza alcalina, denominada pasta base de cocaína. 5 O refino da pasta origina a cocaína em pó (cloridrato de cocaína), apresentação mais conhecida em nosso meio. O crack e a merla são a cocaína em sua forma de base livre. 6 O consumo da substância pode dar por qualquer via administração, com rápida e eficaz absorção pelas mucosas oral e nasal e pela via pulmonar. A droga vai atuar nos sistemas gabaérgicos e glutamatérgicos na modulação do sistema de recompensa cerebral, causando os sintomas de euforia, manias e desejo por um novo episódio de consumo, podendo o indivíduo evoluir para situações de uso nocivo e dependência. Esses fenômenos são todos influenciados pela via de administração escolhida. 7 Até o momento, nenhum medicamento mostrou-se eficaz para proporcionar alívio aos sintomas de abstinência, tampouco para atuar sobre o comportamento de busca da substância. As condutas a esse respeito têm sido tomadas a partir da prática clínica, sem, no entanto, haver evidências científicas comprobatórias. Além disso, a associação entre o abuso de álcool e cocaína (em especial o crack) é frequente, inclusive mais frequente que a associação de outras drogas. 8 O dissulfiram foi a primeira medicação aprovada para a dependência ao álcool (em 1951) e recentemente tem sido foco de maior interesse devido ao potencial efeito na terapia da dependência a cocaína. Alguns ensaios clínicos demonstraram sucesso com a administração de 250mg ao dia de dissulfiram em pacientes com abuso de álcool e cocaína e tal efeito foi atribuído a propriedades potencializadoras da dopamina. 8 Possivelmente o dissulfiram inibe a enzima dopamina-betahidroxilase, que é envolvida no catabolismo desse neurotransmissor. A ativação da dopamine no núcleo acumbens (centro do prazer do sistema de recompensa cerebral) é uma das teorias biológicas sobre a dependência as drogas. O dissulfiram também impede bloqueia enzimas plasmáticas e microssomais responsáveis pelo metabolismo da cocaína em seus trajetos O presente estudo foi realizado com o intuito de averiguar a eficácia do dissulfiram quando comparado ao tratamento com placebo na redução do uso do crack em indivíduos com critérios de dependência. Este estudo se faz necessário, pois há poucas opções de tratamento para a dependência ao

3 crack, inclusive medicamentosas. Além disso, nenhuma droga se mostrou eficaz no tratamento do uso e abuso dessa droga. Apesar do dissulfiram já ter sido utilizado para dependência à cocaína é importante estudar o crack separadamente por se tratar de droga de concentração, absorção e distribuição diferenciada. MATERIAL E MÉTODOS Tipo de estudo e Randomização Esta pesquisa será realizada no formato de ensaio clínico duplo cego. O método de randomização utilizado neste estudo clínico foi de alocação por blocos permutados. Cada regime de droga foi atribuído aos blocos de seis pacientes e distribuído por esta ordem: dissulfiram, placebo, placebo, dissulfiram, dissulfiram e placebo. Esta atribuição foi repetida até que o número total de indivíduos (24) foi atingido. Participantes Vinte e quatro indivíduos do sexo masculino com o vício do crack de cocaína (CID-10 diagnóstico) que procuraram espontaneamente o Centro de Atendimento de Atenção Psicossocial para Álcool e Drogas (CAPS-AD) do município de Palmas TO Brasil, foram recrutados. Eles primeiro foram avaliados por um psiquiatra e somente após o consentimento livre esclarecido foram alocados. Foram divididos em doze indivíduos (29,21 ± 4,76 anos de idade) que receberam dissulfiram, doses de 250mg por dia, durante 8 semanas e em doze controles (pareados por idade) que receberam placebo. Todos os indivíduos foram seguidos também por entrevista motivacional e terapia de grupo. Eles foram comparados por (i) adesão (número de indivíduos que permaneceram no tratamento por 60 dias, (ii) o uso de drogas frequência (média de número de dias por semana, que usou crack), (iii) dosagem da droga (média diária de dosagem de crack usado em gramas), (iv) quantidade de dinheiro gasto com a dependência, (v) livre de drogas (número de indivíduos que deixaram de uso de crack após 60 dias, confirmada por exame de urina; (vi) efeitos colaterais. Os critérios de inclusão: indivíduos com diagnóstico de dependência em crack, como droga principal, de acordo com a 10 ª edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), com idades entre 18 e 40 anos, residentes na cidade de Palmas, que concordam em participar voluntariamente da estudar depois de assinar um termo de consentimento. Critérios de exclusão: história negativa do vício de crack, doença física ou outro transtorno psiquiátrico, não consentimento para participar da pesquisa e incapaz de consentir. A faixa etária entre

4 18 e 40 anos foi escolhido para garantir a utilização segura de dissulfiram, uma vez que é uma droga hepato e nefrotóxica. A presença de outro transtorno psiquiátrico foi avaliada por um psiquiatra que utilizou critérios diagnósticos da CID-10. Desenho do estudo Todos os pacientes foram avaliados semanalmente por um psiquiatra. Foram mascarados tanto para os pacientes quanto para o psiquiatra no que diz respeito à atribuição de tratamento do paciente. A segurança clínica de tratamento foi avaliada por meio de notificação espontânea e um inquérito aberto em eventos adversos, bem como um exame físico, e medição dos sinais vitais em cada visita. Eventos adversos e aderência da droga foram cuidadosamente monitorados ao longo do estudo. Os pacientes foram retirados do julgamento, se eles pediram a interrupção, se o médico sugeriu que por conta de um evento adverso, se o tratamento mostrou falta de eficácia ou se os pacientes eram não-cooperativos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Após 8 semanas, todos os indivíduos que receberam dissulfiram reduziram o consumo de cocaína crack. A taxa de abandono foi alta para ambos os grupos: 5 (41,6%) para dissulfiram e 6 (50%) para placebo. Porém, o grupo do dissulfiram apresentou maior número de pacientes com teste para urina negativo (n=6, 50%), quando comparado ao placebo (2, 16,6%), p<0.01. A redução da dose da droga e sua frequência também foi maior no grupo que utilizou o dissulfiram. Os efeitos colaterais apresentados foram leves, ocorrendo geralmente apenas no inicio do tratamento, sendo eles parestesia e sonolência. Algumas limitações deste estudo merecem ser observadas. Em primeiro lugar, o tamanho da amostra e o tempo de tratamento (8 semanas) foram curtos, mas justificado pelo fato de que se tratava de um estudo preliminar. Em segundo lugar, o estudo foi conduzido em apenas um centro especializado para dependência de drogas e, portanto, estes resultados não podem ser generalizados para as configurações de outros serviços de saúde. No entanto, os pontos fortes do nosso estudo é que a amostra foi bem caracterizada, e sem comorbidades. LITERATURA CITADA 1. Carlini EA, Nappo SA, Galduróz JC. A cocaína no Brasil ao longo dos últimos anos. Rev ABP- APAL 1993; 15:121-7.

5 2. Dunn J, Laranjeira R. Cocaine - profiles, drug histories, and patterns of use of patients from Brazil. Subst Use Misuse 1999; 34: United Nations Office for Drug Control and Crime Prevention (UNODCCP). Global illicit drug trends Vienna: UNODCCP, Available from: URL: _1/report_ _1.pdf. 4. Colliver JD, Kopstein AN. Trends in cocaine abuse reflected in emergency room episodes reported by DANW. Public Health Rep 1991; 106: Negrete JC. Cocaine problems in the coca-growing countries of South America. In: Bock GR, Whelan J, editors. Cocaine: scientific and social dimensions. Chichester: John Wiley & Sons; p Wallace BC. Crack Cocaine: a practical treatment approach for the chemically dependent. New York: Brunner/Mazel; Hatsukami DK, Fischman MW. Crack cocaine and cocaine hydrochloride. Are the differences myth or reality? JAMA 1996; 276: Lima MS, Soares BG, Reisser AA, Farrell M. Pharmacological treatment of cocaine dependence: a systematic review. Addiction. 2002; 97: Pettinati HM. A double blind, placebo-controlled trial that combines disulfiram and naltrexone for treating co-occurring cocaine and alcohol dependence. Addict Behav May;33(5): Grassi MC, Cioce AM, Giudici FD, Antonilli L, Nencini P. Short-term efficacy of Disulfiram or Naltrexone in reducing positive urinalysis for both cocaine and cocaethylene in cocaine abusers: a pilot study. Pharmacol Res Feb;55(2): Carroll KM, Fenton LR, Ball SA, Nich C, Frankforter TL, Shi J, Rounsaville BJ. Efficacy of disulfiram and cognitive behavior therapy in cocaine-dependent outpatients: a randomized placebo-controlled trial. Arch Gen Psychiatry Mar;61(3): Carroll KM, Nich C, Ball SA, McCance E, Frankforter TL, Rounsaville BJ. One-year follow-up of disulfiram and psychotherapy for cocaine-alcohol users: sustained effects of treatment. Addiction Sep;95(9): Carroll KM, Nich C, Ball SA, McCance E, Rounsavile BJ. Treatment of cocaine and alcohol dependence with psychotherapy and disulfiram. Addiction May;93(5):