TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 Registro: XXXXX ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 1XXXXXX , da Comarca de São Caetano do Sul, em que é apelante GAFISA S.A., são apelados RUBENS (OMITIDO) e OUTRA. ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ALEXANDRE LAZZARINI (Presidente sem voto), GALDINO TOLEDO JÚNIOR E MAURO CONTI MACHADO., 30 de junho de PIVA RODRIGUES RELATOR Assinatura Eletrônica

2 APELAÇÃO CÍVEL Nº XXXXXX APELANTE: Gafisa S/A APELADO: Rubens (Omitido) e outra COMARCA: Fórum Central COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO CONTRATUAL AJUIZADA POR COMPROMISSÁRIOS COMPRADORES. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. INCONFORMISMO DA RÉ GAFISA. NÃO ACOLHIMENTO. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS (ARTIGO 252, RITJSP). 1. Faculdade de os compromissários compradores pleitearem a resolução do contrato e devolução das parcelas. Devolução do valor pago aos compradores na proporção de 90% (noventa por cento) do valor pago, pois resguardada retenção de 10% (dez por cento) em favor da incorporadora-promitente vendedora. Devolução deverá ser imediata e operada em parcela única, conforme Súmula nº 2 deste E. Tribunal. Sentença mantida por seus próprios fundamentos (artigo 252, RITJSP). 2. Recurso desprovido. Aos bem produzidos relatórios de fls. 158/159 e 215/217, acrescento que a Colenda 3ª Câmara de Direito Privado, com voto condutor da E. Desembargadora Marcia Regina Dalla Déa Barone, não conheceu do presente recurso de apelação, determinando redistribuição a esta presente Relatoria, reputada preventa por ter apreciado anterior agravo de instrumento nesse processo. Faço transcrever o relatório constante daquele voto, para melhor conhecimento da controvérsia: Ao relatório de fls. 158/159, acrescento ter a r. sentença julgado procedente o pedido para o fim de rescindir o contrato firmado entre as partes, condenando a ré à devolução, de uma só vez, de 90% dos valores pagos pelos autores, devidamente atualizados a partir 2

3 do desembolso, devendo haver a imediata liberação da unidade objeto da controvérsia. Diante da sucumbência, carreou à ré o pagamento dos respectivos ônus. Foram opostos embargos de declaração pelos autores (fls. 162/163), os quais foram acolhidos pela decisão de fls A ré interpôs recurso de apelo (fls. 170/183), pugnando pela reforma da r. sentença para que o feito seja julgado improcedente, com a inversão dos respectivos ônus. Argumenta não haver abusividade no disposto na cláusula 5.4 do contrato, a qual alega ter sido redigida de forma clara e lícita, não podendo ser declarada nula. Aduz que restou demonstrado que a culpa pelo desfazimento do negócio foi dos autores, que devem se sujeitar à cláusula penal ajustada, que possibilita uma retenção no importe de 40% dos valores, que tem como finalidade cobrir possíveis perdas financeiras. Postula que, ao menos, seja autorizada a retenção da quantia de 30% do montante pago, conforme julgados do Superior Tribunal de Justiça. Alega que o contrato sub judice é regido pelas normas do Código Civil, devendo as regras do Código de Defesa do Consumidor serem aplicadas em caráter apenas subsidiário. Contrarrazões às fls. 198/201. Vieram redistribuídos à Relatoria em , em razão da prevenção gerada pelo AI nº É o relatório. Aceita a prevenção. O recurso não comporta provimento, ratificada a sentença prolatada, em conformidade com o dispositivo que autoriza esse procedimento previsto no Regimento Interno desta Corte (artigo 252, RITJSP). De início, cumpre reconhecer a incidência ao 3

4 caso em tela tanto do Código de Defesa do Consumidor, como da Lei nº 4591/64, pois assume relevância antes a natureza da relação estabelecida entre os contratantes que a estrutura jurídica da empreendedora que promove a construção e a venda de imóveis. Bem situada no ordenamento jurídico a relação contratual em debate (compromisso de compra e venda de unidade autônoma de empreendimento imobiliário), reconhece-se a faculdade dos compromissários compradores de pleitear a resilição do contrato. Isto porque a resilição unilateral, consistente na ruptura do vínculo contratual por iniciativa de uma das partes, tem fundamento na mesma autonomia da vontade em que se funda a liberdade de contratar, desde que a parte desistente assuma as respectivas consequências, legais ou pactuadas. Em se tratando de relação submetida à proteção do Código de Defesa do Consumidor, as consequências pactuadas só podem subsistir uma vez reconhecida a sua compatibilidade com o referido sistema protetivo. No caso em tela verifica-se abusividade na disciplina contratual referente à resilição por iniciativa dos autores, demasiadamente restritiva. Os artigos 51, inciso II, e 53, caput, da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) permitem ao compromissário comprador requerer o desfazimento do ajuste e a devolução do que já foi pago; consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam nesses contratos a perda total das prestações pagas em benefício da ré. É certo que, tratando-se de resolução 4

5 contratual por iniciativa dos compromissários compradores, a devolução deve ocorrer com retenção parcial a título de indenização por despesas administrativas e operacionais havidas pela ré. A referida retenção parcial atende também à necessidade de se evitar a transformação de negócios deste tipo em verdadeira aplicação financeira, na qual os compromissários compradores arrogam-se no direito de a qualquer momento desistir imotivadamente do contrato sem sofrer qualquer sanção. Do lado da compromissária vendedora, a extinção do compromisso permite-lhe renegociar o imóvel no mercado imobiliário sem qualquer depreciação e pelo preço integral, donde se conclui que a retenção de quantidade expressiva das parcelas caracterizaria, sem dúvida, enriquecimento sem causa. Nesse contexto, andou bem o MM. Juízo ao determinar à devolução dos valores despendidos pelos autores com retenção de 10% (dez por cento) a título de taxa de administração, inclusive no que se refere à devolução imediata dos 90% (noventa por cento) dos valores pagos (em conformidade com Súmula nº 2 deste E. TJ-SP), já que inexistem motivos para prorrogar ou parcelar a devolução das quantias já pagas. Tem entendido esta 9ª Câmara de Direito Privado que, em casos como o presente, é devida a retenção do equivalente a 10% (dez por cento) das parcelas pagas. Tal retenção leva em conta, também, a necessidade de se evitar a transformação de negócios deste tipo em verdadeira aplicação financeira, na qual o compromissário 5

6 comprador arroga-se no direito de a qualquer momento desistir imotivadamente do contrato sem sofrer qualquer sanção. Assim, confirma-se a sentença na extensão que reconhece a abusividade do valor arbitrado no contrato de compromisso de compra e venda a título de cláusula penal, em caso de desistência dos compromissários compradores. Nesses termos, nega-se provimento ao recurso de apelação da ré. Na hipótese de apresentação de embargos de declaração contra o presente acórdão, ficam as partes intimadas a se manifestar, no próprio recurso, a respeito de eventual oposição ao julgamento virtual, nos termos do art. 1º da Resolução nº 549/2011 do Órgão Especial deste E. Tribunal, entendendo-se o silêncio como concordância. PIVA RODRIGUES Relator 6