VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

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1 II-21 REMOÇÃO DE DQO EM ÁGUA RESIDUÁRIA INDUSTRIAL ATRAVÉS DE UM SISTEMA EM ESCALA LABORATORIAL COMPOSTO POR UM REATOR UASB SEGUIDO POR UM FILTRO BIOLÓGICO COM FUNGOS Glória Maria Marinho Silva Sampaio (1) Farmacêutica Bioquímica pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Engenharia Civil área de concentração em Saneamento Ambiental (UFC). Professora de 1 o e 2 o graus do CEFET CE. Doutoranda em Hidráulica e Saneamento na EESC/USP. Sandra Tédde Santaella Química pela UFSCar. Mestre em Química (UFSCar.). Doutora em Engenharia Civil área de Hidráulica e Saneamento pela EESC/USP. Professora Adjunta do Dep. de Eng. Hidráulica e Ambiental da UFC. Endereço (1) : Rua Cons. João Alfredo, 213 Jardim Paraíso São Carlos São Paulo SP CEP: Brasil Tel: (16) gloriamarinho@bol.com.br RESUMO Nesta pesquisa avaliou-se, em escala laboratorial, um sistema contínuo constituído por um reator de fluxo ascendente com manta de lodo (UASB), com volume de 4L, seguido por um filtro biológico inoculado com espécies fúngicas (FBF), com volume de 3L, para o tratamento da água residuária de uma indústria de beneficiamento de castanha de caju. Inicialmente foi testada a viabilidade das espécies fúngicas em batelada, com o efluente da indústria de beneficiamento de castanha de caju e, em seguida, estas espécies foram utilizadas na etapa de fluxo contínuo. O sistema contínuo foi alimentado por um período de 6 dias com o efluente da indústria de beneficiamento de castanha de caju, com o objetivo de verificar seu desempenho na remoção de DQO. O reator UASB apresentou eficiência média de remoção de DQO de 72%; 78% e 68% para os tempos de detenção hidráulica (TDH) de 12h; 1h e 8h respectivamente. O FBF mostrou-se viável ao pós-tratamento do efluente do reator UASB, removendo DQO com eficiências de 58%; 65% e 25% para os TDH de 4h; 2h e 1h, respectivamente. O sistema UASB-FBF teve como melhor remoção de DQO, um percentual de 94% para 14h de detenção, sendo 1h no reator UASB e 4h no FBF. De um modo geral o sistema UASB-FBF apresentou-se como alternativa viável ao tratamento do efluente da indústria de beneficiamento de castanha de caju. PALAVRAS-CHAVE: Água residuária industrial, reator UASB, filtro biológico com fungos, demanda química de oxigênio. INTRODUÇÃO O aumento da população mundial e a constante intervenção do homem no meio ambiente estão alterando a qualidade das águas superficiais e subterrâneas com descargas poluidoras e tornando cada vez mais escassos os recursos hídricos. O estado do Ceará desempenha hoje importante papel no desenvolvimento econômico da região Nordeste e a indústria de beneficiamento de castanha de caju é uma das responsáveis por esse desenvolvimento, já que a castanha é uma iguaria apreciada no mundo inteiro. De acordo com Dourado (1999), este Estado possui o maior parque industrial de beneficiamento de castanha de caju, formado por 16 fábricas de grande porte e mais de 23 cadastradas em todo o Estado. O crescimento desse tipo de indústria tem contribuído também, de forma significativa, para a poluição do meio ambiente, por gerar resíduos líquidos com a presença de compostos poluidores em quantidades significativas, além de apresentarem compostos de difícil poder de biodegradação, notadamente os compostos fenólicos. Na busca do desenvolvimento sustentável, no qual se alia o crescimento industrial à preservação ambiental, principalmente para o Ceará, que conta com longos períodos de seca, onde a escassez de água é cada vez maior, novas tecnologias para o tratamento de águas residuárias vêm sendo pesquisadas com o intuito de preservar as coleções hídricas como também poupar este recurso através de reutilização de efluentes ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1

2 tratados. Decorrente disso, alcança-se melhor qualidade de vida sob o ponto de vista da saúde pública e saneamento. O tratamento biológico de águas residuárias nas suas formas aeróbia, anaeróbia ou em conjunto mostra-se como relevante solução para atenuar o potencial poluidor dos despejos industriais, haja vista que a legislação inerente à qualidade dos efluentes torna-se cada vez mais exigente para o despejo final visando alcançar um patamar desejado de segurança sanitária. Com o objetivo de corroborar com o aperfeiçoamento de tecnologias existentes, bem como viabilizar novas alternativas para tratamento biológico de águas residuárias, neste trabalho foi estudado o tratamento biológico do efluente de uma indústria de beneficiamento de castanha de caju, em escala laboratorial, através de um sistema constituído por um reator UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket) seguido de um filtro biológico inoculado com fungos das espécies Aspergillus niger e Cladosporium herbarum. MATERIAL E MÉTODOS Produção dos Fungos Os fungos utilizados na pesquisa eram dos gêneros Aspergillus e Cladosporium. Foram cultivados durante 28 dias, em garrafas de Roux com meio de cultura Sabouraud, utilizando como inibidor das bactérias, cloranfenicol, antibiótico de largo espectro. Esta etapa foi realizada no laboratório de Microbiologia do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Farmácia da Universidade FederaL do Ceará. Origem e caracterização da água residuária A água residuária estudada nesta pesquisa foi oriunda da estação de tratamento de esgotos (ETE) de uma indústria de beneficiamento de castanha de caju. A coleta era realizada precisamente na saída do tanque de equalização da estação de tratamento. Os parâmetros utilizados para caracterização e análise deste efluente foram: DQO, nitrato, fosfato, amônia, sólidos totais, sólidos totais suspensos, sólidos totais suspensos voláteis, sólidos totais suspensos fixos, sólidos totais dissolvidos e ph, seguindo a metodologia descrita em APHA, Durante esta pesquisa, a água residuária foi caracterizada sempre que era coletada, totalizando 12 coletas. Testes com fungos em reatores de fluxo descontínuo (batelada) Esta operação foi realizada em capela estéril, com uso de luz ultravioleta, no Laboratório de Saneamento Ambiental da Universidade Federal do Ceará, durante o período de maio a junho de 2. Foram utilizados quatorze reatores, com volume de 3,5L fechados, cujas tampas possuíam dois orifícios nos quais foram acoplados os aeradores. Todos os reatores foram devidamente esterilizados com luz ultravioleta, a fim de eliminar todos os possíveis agentes contaminantes e garantir eficiente operação. A massa fúngica foi filtrada, pesada e distribuída eqüitativamente em sete reatores, destinados ao tratamento do efluente, e cada reator recebeu aproximadamente 4,7g. Os demais reatores, os sete restantes, não foram inoculados para servirem como controle da operação. Adicionou-se a cada um dos reatores que foram inoculados com fungos, 1,75L do efluente e 1g de cloranfenicol. Retirou-se uma alíquota de 25ml do material de cada reator, para caracterização da entrada do TDH correspondente. Em seguida, estes foram fechados e aerados. Nos reatores de controle, adicionou-se 1,5L do efluente, retirou-se uma alíquota para caracterização da entrada e iniciou-se a aeração. Os tempos de detenção hidráulica estudados foram de 4h, 24h, 48h, 96h e 192h, para cada par de reatores, inoculado e controle. Ao término de cada TDH, os reatores eram abertos e retiravam-se uma alíquota de cada um para nova determinação de DQO. Os reatores que continham fungos continuaram sendo aerados e receberam uma solução contendo 5,2g/L de glicose;,4g/l de fosfato de potássio monobásico;,4g/l de fosfato de potássio dibásico;,4g/l de sulfato de magnésio;,3g/l de cloreto de sódio e,5g/l de cloreto de cálcio (Santaella, 1993), na tentativa de manter ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2

3 bom nível de carboidratos e nutrientes para os fungos, pois estes foram utilizados na etapa seguinte da pesquisa. Operação em fluxo contínuo Esta etapa do trabalho foi realizada com um sistema constituído por dois reatores de fluxo ascendente, sendo o primeiro deste sistema predominantemente anaeróbio, do tipo UASB, e outro, do tipo filtro biológico inoculado com fungos das espécies Aspergillus niger e Cladosporium herbarium, ambas oriundas da etapa em batelada. Características dos reatores O material empregado para a confecção do reator anaeróbio foi fibra de vidro. Este reator possuía volume útil de 4L, diâmetro de 15mm na parte superior do reator, 75mm no seu corpo e 55mm no separador de fases. Possuía na base um fundo falso perfurado, para melhor distribuição do afluente, dispositivos de entrada, saída e descarga de lodo, além de um coletor de gases ao qual era acoplada uma mangueira, cuja saída era submersa em uma proveta de 5ml, contendo solução de hidróxido de sódio, com nível determinado, para que se pudesse observar a produção de metano através da alteração do nível estabelecido. O reator aeróbio também foi montado em fibra de vidro, com volume útil de 3L e diâmetros semelhantes aos do reator anaeróbio com exceção do separador de fases, inexistente neste. Possuía entrada para o afluente e saída do efluente e dois dispositivos para fornecimento de ar, que foi realizado por um aerador de aquário, durante todo o tempo de operação. O esquema do sistema de fluxo contínuo está apresentado na Figura 1. UASB FBF A ERADOR BOMBA P E RIS TÁ LTICA SAÍDA DO FBF BOMBA PERISTÁLTICA ENTRADA DO AFLUENTE Figura 1 Esquema do sistema UASB-FBF empregado na fase de fluxo contínuo da pesquisa. Meio suporte do reator aeróbio O meio suporte empregado foi manta agulhada de poliamida, cortada em retângulos de 2x3cm, ensacados em redes de polietileno. Foram confeccionados oito sacos, com quarenta retângulos da manta em cada um. O conjunto de todos os sacos de manta pesava 75,28g. A opção por esta manta de espessura de 2mm, massa específica de,23g/cm 3 e diâmetro médio do fio de,31mm, foi devido ao uso desta com sucesso como meio suporte por Santaella (1993), Sá (1997), Rodrigues (1999) e Giffoni (2). A montagem do meio suporte dentro do reator foi feita intercalando os sacos contendo a manta recortada com a massa fúngica, que foi retirada, filtrada e pesada com um total de 11.89g, dos reatores da operação em batelada. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3

4 Operação do sistema em fluxo contínuo O reator UASB foi inoculado até um terço do seu volume, com uma mistura em proporções iguais de lodo anaeróbio oriundo do decantador da ETE da indústria, e com lodo aclimatado previamente em experimentos anteriores realizados no mesmo laboratório. Após a inoculação do lodo no reator anaeróbio, procedeu-se a inoculação dos fungos no reator aeróbio, e o sistema passou a receber o efluente da indústria de beneficiamento de castanha de caju. A partir daí, amostras do efluente dos reatores foi retirada para análise de DQO a fim de observar a performance dos mesmos. O afluente ao reator com fungos era acidificado com HCl até que este atingisse ph próximo a cinco, com o objetivo de evitar a contaminação do reator por bactérias. Os afluentes aos reatores foram bombeados por bombas peristálticas calibradas para as vazões correspondentes aos diversos tempos de detenção hidráulica, estudados nesta fase da pesquisa. Os TDH estudados do sistema UASB - Filtro Biológico com Fungos (FBF) foram: (12h-4h); (12h-2h); (12h-1h); (1h- 4h); (1-2h); (1h-1h); (8h-4h), respectivamente. As determinações de DQO foram feitas a cada entrada no sistema e em 5 amostras do efluente do UASB e do FBF, para cada ciclo estudado. Foram realizadas medidas de ph e temperatura ambiente durante o experimento, para monitoramento do sistema. Análise microbiológica da manta Finalizada a operação em fluxo contínuo, uma amostra da manta foi levada ao laboratório de microbiologia do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Farmácia da UFC para análise qualitativa dos microrganismos presentes. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados obtidos neste trabalho serão apresentados na forma de gráficos e tabelas e discutidos a seguir, seguindo a evolução dos experimentos. O desempenho dos reatores foi monitorado através da análise de DQO do afluente e do efluente. Caracterização da água residuária O efluente avaliado nesta pesquisa foi oriundo de uma indústria de beneficiamento de castanha de caju, localizada em Fortaleza CE. Como o processo de beneficiamento é subdividido em várias etapas, este efluente industrial possui características diversas, dependendo das etapas de produção. Eventualmente com cargas orgânicas altas, resultante do próprio processo de beneficiamento, ou ainda com cargas orgânicas baixas, quando o efluente é constituído principalmente de águas de lavagem. Na Tabela 1 são mostrados os valores médios obtidos através das determinações físico-químicas, durante a etapa de caracterização da água residuária, proveniente do tanque de equalização. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4

5 Tabela 1 Faixa de variação dos valores obtidos da caracterização da água residuária Parâmetros N o de Determinações Faixa de Variação a 3686 ph 9 7,22 a 9,21 NO - 3 (mg/l) 9,91 a 2,4 NH 3 (mg/l) 1 9,68 a 37,83 PO 3-4 (mg/l) 1 6,8 a 14,72 ST (mg/l) 7 23 a 2466 STS (mg/l) a 88 STSF (mg/l) 7 4 a 16 STSV (mg/l) a 773 STD (mg/l) a 1797 Santaella (1997), encontraram valores diferenciados na caracterização do efluente desta mesma indústria, para os parâmetros nitrato (2,1mg/L), amônia (3,5mg/L) e sólidos totais (1268mg/L). Os mesmos autores em 1999, fizeram nova caracterização e os resultados encontrados para os parâmetros estiveram na mesma faixa de concentração dos obtidos nesta pesquisa, exceto para amônia que apresentou concentração (,51mg/L) bem inferior à desta caracterização. Os sólidos não foram inclusos na caracterização feita pelos autores. Rabelo 3- (1999), também caracterizou este efluente e os valores médios obtidos foram: DQO = 974mg/L; PO 4 = 15,7mg/L; NH 3 = 7,24; Alc = 4,72(mg CaCO 3 /L); ph =7,66; STS = 761mg/L; ST = 1693mg/L. Quando comparam-se os valores de amônia das caracterizações observam-se grandes diferenças. Provavelmente os valores acentuados da concentração de amônia, neste estudo estejam relacionados com a presença de esgoto sanitário no efluente final da indústria, ou por erros cometidos durante as determinações experimentais, como erros inerentes à rotina do técnico, tempo e condições de armazenamento das amostras antes das determinações, variações nas curvas de calibração, etc. Outra suposição para a elevada concentração de amônia nesta caracterização, pode ser decorrente da mineralização dos compostos orgânicos protéicos, promovida pela ação dos microrganismos no tanque de equalização da estação de tratamento de esgoto da própria indústria, provavelmente pelo funcionamento deficitário do mesmo em algumas épocas de estudo. A concentração de sólidos totais durante a caracterização apresentou-se elevada e também diferenciada dos valores obtidos por Rabelo (1999). Os valores elevados podem estar associados às etapas do processo de beneficiamento, ou mesmo relacionados com o nível do tanque de equalização, que por muitas vezes durante o período de caracterização do efluente deste estudo, esteve baixo, favorecendo maior concentração de sólidos na água residuária. Porém, estas diferenças são puramente compreensíveis, haja vista que trata-se de um efluente industrial, cujas características variam de acordo com o processo produtivo que por sua vez varia com a origem e características da matéria prima. Para os demais parâmetros determinados na caracterização deste efluente, os resultados apresentaram concentrações praticamente similares aos resultados dos estudos de Santaella. (1997) e Rabelo (1999). Testes com fungos em reatores de fluxo descontínuo (batelada) Embora esta fase da pesquisa fosse muito importante parta nortear a fase de fluxo contínuo, os resultados obtidos não foram satisfatórios, uma vez que os reatores de controle apresentaram eficiência maior que os reatores com fungos. Na Figura 2 estão apresentadas a variação de DQO e a eficiência, durante a operação em batelada. Os resultados encontrados para os reatores de controle, mostraram remoção de DQO para todos os TDH testados, sendo que o pico de remoção (5%) ocorreu em 24h de operação e depois tendeu a uma estabilidade. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5

6 h 24h 48h 96h 192h TDH 6% 4% 2% % Remoção Afluente - Controle Efluente - Controle Afluente - Fungos Efluente - Fungos Remoção - Controle Remoção - Fungos Figura 2 Variação da DQO em função do TDH para os reatores controle e fungos na etapa de fluxo descontínuo Nos reatores inoculados com fungos, a maior eficiência de remoção ocorreu no último dia de operação, alcançando um percentual de 45%, possivelmente esta melhor remoção seja devida à adaptação dos fungos, ao efluente estudado, e à produção de enzimas extracelulares, decorrentes do maior tempo de contato entre o efluente e as espécies fúngicas. Provavelmente, melhor eficiência de remoção tivesse sido obtida com o aumento do TDH, ou se condições adequadas aos fungos tivessem sido oferecidas ao meio, tais como fonte primária de carbono, ajuste de ph na faixa de 4,5 a 5,, adaptação do inóculo e controle de oxigênio dissolvido. Santaella (1999), obtiveram em seu estudo, tratando este mesmo tipo de efluente, melhor remoção de DQO em torno do sétimo dia, o que vem confirmar os resultados obtidos neste ensaio. Noutro estudo, também realizado pela referida autora, observou-se que a média de remoção de compostos causadores de DQO ficou entre 6 e 75% (Santaella 1997). Operação em fluxo contínuo Durante a fase de fluxo contínuo, o ph afluente ao sistema esteve entre 7, e 8,, sendo que o efluente do reator UASB possuía ph ligeiramente superior ao afluente. O afluente ao FBF, por ser acidificado possuia ph próximo de 5 e o efluente saía com ph ligeiramente superior a 8,. Este fato é decorência do metabolismo dos fungos que possuem a capacidade de produzir substâncias que adequam o ph ao valor mais conveniente a eles. A temperatura ambiente esteve sempre entre 28 e 3 O C. Na figura 3 estão apresentadas as variações de DQO para o sistema UASB-FBF, com os ciclos de TDH (12-4h), (12-2h), (12-1h), (1-4h), (1-2h), (1-1h) e (8-4h). Avaliando os reatores isoladamente, tanto o reator UASB como o reator com fungos, mostrou diminuição na concentração de DQO, resultando em bons percentuais de remoção para estes reatores e, conseqüentemente, para o sistema. Apesar de ter ocorrido oscilação de eficiência de remoção de DQO no reator UASB, a média para o TDH de 12h ficou em torno de 72%, para 1h em torno de 68% e para 8h (único ciclo) de 68%. Estes valores de remoção são compatíveis com os valores existentes na literatura. Santaella (1999) encontrou 68% de remoção de DQO com este mesmo tipo de efluente para um TDH de 12h. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6

7 16 Ciclo Ciclo Ciclo Ciclo Ciclo Ciclo Ciclo 8-4 Eficiência 1% 8% 6% 4% 2% % UASB FBF Figura 3 - Variação de DQO e eficiência dos reatores durante os vários ciclos estudados A diminuição do TDH, de 12h para 1h, e posteriormente para 8h, não provocou alteração significativa na eficiência de remoção do reator. Isto está de acordo com diversos estudos realizados em UASB. TDH de 4 a 8 horas são comumente aplicados nestes sistemas em escala real (Cavalcanti ). Além disto, reatores em escala piloto tem sido operados com tempos de detenção muito menores (1,5 a 3 h), alcançando eficiencias de remoção de DQO na faixa de 65 to 75% (Leitão et al. 22). Souza (1996), com apenas quatro horas ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 7

8 de detenção hidráulica em um reator UASB em escala laboratorial, tratando substrato sintético simulando esgoto sanitário, encontrou remoção de DQO de 86%. Apesar de o tipo de esgoto estudado pelo referido autor ser diferente do estudado nesta pesquisa, vale a pena ressaltar a ótima eficiência alcançada em um tempo de detenção hidráulica três vezes menor que o maior TDH desta pesquisa. Com relação ao reator inoculado com fungos a melhor eficiência alcançada, (87%) ocorreu com 4h de detenção do ciclo (1-4h). As remoções de DQO oscilaram no reator com fungos, para os tempos de 4h, 2h e 1h e a média de remoção manteve-se em torno 68%, 65% e 25% respectivamente. Pode-se verificar que a diminuição do TDH diminuiu a eficiência deste reator. Este fato pode estar associado ao menor tempo de contato do esgoto com o biofilme, impedindo desta forma total biodegradação da matéria orgânica. Rodrigues (1999), encontrou remoção de DQO de 88% com 5h de detenção hidráulica, tratando efluente sintético de laticínios com fungos da espécie Drechslera monocerans, podendo comprovar que possivelmente maiores tempos de detenção hidráulica resultassem em eficiências melhores. Santaella (1999), utilizando fungos dos gêneros: Aspergillus, Epicocum, Fusarium e Alternaria atingiu 1% de remoção de DQO com 17h, porém com a diminuição do TDH para 8h a eficiência diminui ficando em torno de 45%. Diferente do melhor resultado encontrado na fase de fluxo descontínuo (45% de remoção para 8 dias de detenção) a operação em fluxo contínuo mostrou melhor eficiência de remoção de DQO com as espécies fúngicas Aspergillus niger e Cladosporium herbarum, em TDH menores. Possivelmente, as condições do meio oferecidas como, meio suporte, período de adaptação para os microrganismos, diminuição do ph, contribuíram para este desempenho. De um modo geral os fungos utilizados nesta pesquisa atuaram como agentes decompositores eficientes no pós-tratamento de efluente de reator UASB, para remoção de compostos causadores de DQO, com eficiência média de 5%, para valores de DQO afluente entre 1 e 4mg/L. A maior eficiência foi de 87% para DQO de 4mg/L e TDH=4h e a menor foi de 15%, para a mesma concentração afluente e TDH=1h. Na Figura 4 apresenta-se a eficiência do sistema UASB-FBF em remover DQO das águas residuárias da indústria de castanha de caju. O pico de remoção de DQO do sistema UASB - FBF foi no ciclo de (1-4h), com 94% de eficiência, e a remoção média do sistema 87%, sendo que as remoções médias para os reatores independentemente foram: 72% no UASB (TDH=12h), e 68% no FBF (TDH=4h). A eficiência de remoção alcançada pelo sistema foi superior às alcançadas nos reatores isoladamente, ratificando a importância de sistemas combinados para o tratamento biológico de águas residuárias e justificando a adequabilidade para o efluente em estudo. Souza (1996), avaliou o desempenho de um sistema constituído por um reator UASB seguido de reator aeróbio em batelada e obteve remoção de DQO para o sistema de 95% aproximadamente, com 86% para o reator UASB e de 65% para reatores em batelada Ciclo 1% 8% 6% 4% 2% % Eficiência Eficiência Total Figura 4 - Variação de DQO no sistema UASB-FBF para os diversos ciclos de operação ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 8

9 Comparando a eficiência do sistema UASB FBF desta pesquisa com a verificada por SOUZA (1996), apesar de o autor ter tratado substrato sintético simulando esgoto sanitário, observou-se similaridade no resultado. A análise microbiológica qualitativa de uma amostra do meio suporte utilizado no FBF, acusou a presença das espécies fúngicas Aspergillus flavus e Cladosporium herbarum. Vale ressaltar que houve morte da espécie Aspergillus niger, que foi inoculada no início deste estudo e proliferação da espécie não inoculada, Aspergillus flavus. Além disso ficou evidenciada através da análise microbiológica a contaminação do FBF por espécies bacterianas Pseudomonas aeruginosa e Klebisiella pneumoniae. A espécie Aspergillus flavus por estar presente no ar, pode ter favorecido a contaminação do FBF, haja vista que o reator foi montado em local aberto. Com relação morte da espécie Aspergillus niger, talvez o baixo ph de até 2,8 ao qual o afluente ao FBF foi submetido, tenha contribuído para o desaparecimento da espécie. CONCLUSÕES Os resultados obtidos do tratamento da água residuária da indústria de beneficiamento de castanha de caju pelo sistema UASB-FBF permitiram concluir que é viável tratar água residária da indústria de beneficiamento de castanha de caju através de processos biológicos em sistemas combinados, uma vez que o sistema UASB- FBF, em escala laboratorial, mostrou excelente desempenho no tratamento do efluente da indústria de beneficiamento de castanha de caju, removendo em média 94% de compostos causadores de DQO, com TDH=14h. Apesar do bom desempenho do reator UASB, em torno de 68% de eficiência com TDH= 8h, é provável que tempos de detenção hidráulica menores possam ser utilizados para uma eficiência bem próxima e que uma composição do sistema com TDH menor possa atingir a mesma eficiência, por exemplo com TDH do sistema igual a 8h. Apenas a acidificação do afluente ao FBF, neste caso efluente do reator UASB, em torno de ph 5 não foi o suficiente para evitar a contaminação bacteriana e portanto deve-se adicionar bactericidas ao sistema para inviabilizar a atividade bacteriana. O FBF apresentou 87% de remoção de uma DQO de 4 mg/l, com apenas 4h de detenção hidráulica, sugerindo que os filtros biológicos com fungos podem ser boa alternativa para o pós-tratamento de efluentes de reatores UASB, e que se as concentrações de DQO afluentes forem maiores, a eficiência também maior. Porém, mesmo para concentrações inferiores a 4mg/L o FBF apresentou desempenho satisfatório para TDH de 4 e 2h. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. APHA. Standard methods for the examination of water and wasterwater.18 ad Washington: American Public Health Association, paginação irregular. 2. CAVALCANTI, P.F.F., MEDEIROS, E.J.S., SILVA, J.K.M. e Van HAANDEL, A., Excess sludge discharge frequency for UASB reactors. Water Science and Technology, v.4, n.8, , DOURADO, E. M. C. B. Análise econômica da viabilidade de variados tamanhos de minifábricas processadoras de castanha de caju no Estado do Ceará. Fortaleza, Dissertação (Mestrado em Economia Rural) Departamento de Economia Agrícola, Universidade Federal do Ceará. 4. GIFFONI, D. A. Filtros biológicos aplicados ao tratamento de água residuária sintética de laticínios. Fortaleza, p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil, área de concentração em Saneamento Ambiental, Universidade Federal do Ceará). 5. LEITÃO, R.C., SILVA FILHO, J.A. da, van HAANDEL, A., Zeeman, G., Lettinga, G. Effect of the influent concentration on the performance of UASB reactors: steady-state and transient behaviour, em fase final de redação para publicação, RABELO, S. M. Viabilidade do processo de lodo ativado aplicado ao tratamento da água residuária de uma indústria de beneficiamento de castanha de caju. Fortaleza, p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil, área de concentração em Saneamento Ambiental, Universidade Federal do Ceará). 7. RODRIGUES, K. de A. Tratamento biológico de água residuária sintética de laticínios por decomposição fúngica. Fortaleza, p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil, área de concentração em Saneamento Ambiental, Universidade Federal do Ceará). ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 9

10 8. SÁ, I.M.B, Biotratamento de efluente de uma indústria de laticínios por ação de fungos decompositores. Fortaleza, p. Dissertação (mestrado) Universidade Federal do Ceará. 9. SANTAELLA, S. T. Remoção de cor causada pela presença de substâncias húmicas em águas, empregando tratamento biológico. São Paulo, p. Tese (doutorado) Universidade de São Paulo. Escola de Engenharia de São Carlos. 1. SANTAELLA, S. T. Estudos de tecnologias apropriadas para tratamento de efluentes da indústria de castanha de caju. Fortaleza: UFC, Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental, p. (Relatório Institucional de Pesquisa). 11. SANTAELLA, S. T. Estudos de tecnologias apropriadas para tratamento de efluentes da indústria de castanha de caju. Fortaleza: UFC, Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental, p. (Relatório Institucional de Pesquisa). 12. SOUZA, J. T. Pós tratamento de efluente de reator anaeróbio de fluxo ascendente em reator aeróbio seqüencial em batelada e coluna de lodo anaeróbio para desnitrificação. São Paulo, p. Tese (doutorado) Universidade de São Paulo. Escola de Engenharia de São Carlos. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1