Diarreia Crónica e Síndromes de Má-Absorção
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- Giovanna Penha Pedroso
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1 Diarreia Crónica e Síndromes de Má-Absorção Aula teórica de Pediatria II Coordenador de Pediatria II e Director de Serviço: Prof. J. Gomes Pedro Regente de Pediatria II: Prof. P. Magalhães Ramalho Docente: Prof. Ana Isabel Lopes Novembro de 2009
2 Diarreia Crónica na criança Variabilidade socio-demográfica da prevalência e do impacto clínico
3 Diarreia Grave Rebelde ou Diarreia intratável da infância Etiologia no passado -S. pós-gastroenterite -Intolerâncias alimentares Etiologia actual (rara) -Atrofia microvilositária congénita -Cloridorreia congénita -Enteropatias auto-imunes -Imunodeficiências 1ªs Nutrição parentérica / Transplante intestinal Mortalidade elevada
4 Sumário Conceitos básicos Fisiopatologia Classificação da diarreia crónica Quadros clínicos mais frequentes Abordagem clínica
5 Definição Diarreia consistência das fezes, nº de dejecções diárias e / ou volume das fezes vs padrão habitual solutos no lúmen intestinal osmolaridade chamada de água DIARREIA
6 Classificação Vários critérios... duração natureza origem topográfica mecanismo fisiopatológico grupo etário
7 Classificação Quanto à duração: Diarreia Aguda: < 2 semanas Diarreia Crónica: 2 semanas (diarreia prolongada.) Quanto à natureza: Orgânica: com patologia subjacente Funcional: sem patologia orgânica
8 Classificação Quanto à origem topográfica: Intestino Delgado Cólon Pâncreas Fígado... Quanto ao mecanismo fisiopatológico: Má-absorção Má-digestão Fermentação Secretório Motilidade intestinal Misto
9 Fisiopatologia Má-absorção Superfície de absorção: Doença Celíaca Giardíase Síndrome do intestino curto (enterocolite necrotizante, volvo)
10 Fisiopatologia Má-digestão intraluminal Todos os nutrientes (insuf.pancreática) Deficiência de sais biliares Fibrose Quística Malnutrição grave Sínd. Schwachmann Colestase
11 Fisiopatologia Fermentação Défice de dissacaridases da mucosa intestinal (lactase, sacarase, maltase) Tipo Primário: - precoce (raro) - tardio (frequente): intolerância à lactose primária de tipo adulto ( hipolactasia ) Tipo Secundário (frequente): intolerância à lactose secundária (síndrome pós-gastroenterite)
12 Fisiopatologia Mecanismo Secretório secreção intestinal de água e electrólitos Hiperplasia das criptas com atrofia das vilosidades: Doença Celíaca Secretagogos luminais (enterotoxinas bacterianas): Cólera Secretagogos de origem sanguínea: Tumores funcionantes (vipomas, gastrinomas...)
13 Fisiopatologia Motilidade Intestinal Sínd. Intestino Irritável Hipertiroidismo Mecanismo Misto Doença Celíaca Sínd. Pós-Gastroenterite D. inflamatória intestinal
14 Etiologia em função do grupo etário Primeiros meses < 1 ano Primeiros anos 1-5 anos Idade escolar e adolescência > 5 anos
15 Etiologia Primeiros meses < 1 ano Erros alimentares Intolerância/ Alergia alimentar Infecções (Infecção entérica, Infecção parentérica) Síndrome pós-gastroenterite Fibrose Quística Defeitos congénitos (Estruturais, Enzimáticos) Diarreia Grave Rebelde
16 Etiologia Primeiros anos: 1-5 anos Funcional Síndrome do Intestino Irritável Infecciosa Infecção Entérica; Giardíase Síndrome pós-gastroenterite Intolerância/Alergia alimentar Doença Celíaca Fibrose Quística
17 Etiologia Idade escolar e adolescência: > 5 anos Doença Inflamatória Intestinal Idiopática Síndrome do Intestino Irritável
18 Síndrome do intestino irritável Clínica Crianças hiperactivas c/ bom estado geral/ nutrição Diarreia crónica (6 meses - 3 anos): 3/4 dejecções pastosas/ líquidas diurnas; restos alimentares; muco Dor abdominal (5-13 anos) Flatulência Alternância diarreia / dejecções moldadas/ obstipação
19 Síndrome do Intestino Irritável Perturbação gastrointestinal mais frequente Dismotilidade nocicepção visceral Predisposição familiar Intervenção: Tranquilização dos pais!
20 Doença celíaca Conceito A doença celíaca é uma enteropatia, imunologicamente mediada, causada por uma sensibilidade permanente ao glúten, em indivíduos geneticamente predispostos.
21 O Iceberg Celíaco Doença celíaca sintomática Alteração da mucosa Doença celíaca silenciosa Doença celíaca latente Susceptibilidade Genética : DQ2, DQ8 Serologia positiva Mucosa Normal
22 Doença Celíaca - prevalência Área Geográfica Prevalência diag.clínico* Prevalência - rastreios Brasil? 1:400 Denmark 1:10,000 1:500 Finland 1:1,000 1:130 Germany 1:2,300 1:500 Italy 1:1,000 1:184 Netherlands 1:4,500 1:198 Norway 1:675 1:250 Sahara? 1:70 Slovenia? 1:550 Sweden 1:330 1:190 United Kingdom 1:300 1:112 USA 1:10,000 1:133 Global 1:3,345 1:266 *baseada na apresentação clínica clássica Fasano & Catassi, Gastroenterology 2001; 120:
23 Dieta com glúten/α-gliadina Genes (trigo, centeio, cevada, aveia?) (DQ2 e DQ8, ) Sensibilização (período de latência de semanas a meses) Resposta imunitária anormal no jejuno mediada por linfócitos T CD4+ Lesão da mucosa Idade Extensão da lesão da mucosa Quantidade de Glúten Infecções Stress metabólico Sintomatologia
24 Doença Celíaca - Expressão Clínica 1. Doença sintomática - manifestações gastrointestinais ( forma clássica ) - manifestações não-gastrointestinais ( formas atípicas) 2. Doença assintomática 3. Associação - patologia auto-imune - sindromes genéticos (Trisomia 21, S. Turner, )
25 Doença celíaca - Clínica Manifestações gastrointestinais Início precoce ( forma clássica : 6-24 meses) Diarreia Crónica: dejecções pastosas, volumosas, fétidas, pálidas, brilhantes Distensão abdominal Anorexia Irritabilidade/Negativismo Alterações da pele e faneras Perda de massa muscular Pregas glúteas verticalizadas Atraso estaturo-ponderal (cruzamento percentis)
26 Doença celíaca - Clínica Manifestações gastrointestinais Início mais tardio Diarreia intermitente Náuseas e vómitos Dor abdominal Má progressão ponderal Obstipação
27 Doença Celíaca Típica
28 Doença Celíaca - Clínica Manifestações não-gastrointestinais Idade de apresentação: criança mais velha, adolescente, adulto dermatite herpetiforme hipoplasia esmalte osteopenia/osteoporose baixa estatura atraso pubertário anemia sideropénica refractária hepatite artrite epilepsia c/ calcificações occipitais
29 Doença Celíaca Como testar? Testes Serológicos Anticorpos anti-gliadina (AGA IgA e IgG) Anticorpos anti-endomísio (EMA IgA) Anticorpos anti-reticulina (ARA IgA) Anticorpos anti-transglutaminase tecidular (TTG IgA) - 2ª geração (proteina humana recombinante) Tipagem HLA
30 Endoscopia Normal Scalloping Nodularidade
31 Doença celíaca - histopatologia intestinal Histologia normal - atrofia vilositária - hiperplasia criptas Histologia d. celíaca
32 Doença Celíaca Critérios de ESPGHAN revistos Biópsia intestinal: atrofia vilositária + Remissão clínica + Negativação marcadores serológicos 2ª Biópsia (SOS): atrofia vilositária Prova de provocação SOS (após > 5 anos dieta exclusão)
33 DOENÇA CELÍACA Intervenção Dieta sem glúten toda a vida!! Exclusão de trigo, centeio, cevada; permissão de milho e arroz
34 Intolerância aos Dissacáridos Primárias ou Genéticas Deficiência de lactase primária (precoce / tardia) Deficiência de sacarase-isomaltase Secundárias ou Adquiridas Sindrome pós-gastroenterite (Rotavirus) Alergia às proteínas do leite de vaca Doença celíaca SIDA Fisiológicas Frutose Sorbitol
35 Intolerância aos Dissacáridos Quadro Clínico diarreia osmótica aquosa, cheiro ácido distensão abdominal cólicas e flatulência desidratação eritema peri-anal Diagnóstico Exame das fezes substâncias redutoras ++ ph fecal < 5 ácido láctico Teste do hidrogénio expirado
36 Intolerância aos Dissacáridos Deficiência de Lactase Prova do H2 expirado com lactose
37 Intolerância aos dissacáridos Intervenção 1. Eliminação do dissacárido específico da dieta: Fórmulas para lactentes com maior diluição Fórmulas isentas de lactose Iogurte 2. Administração de lactase exógena
38 Alergia às Proteínas do Leite de Vaca Definição Reacção adversa às proteínas do leite de vaca imunologicamente mediada caseína, α-lactoalbumina, ß-lactglobulina Predisposição genética Sensibilização por via transplacentária ou por exposição precoce Carácter transitório Intolerância vs. Alergia Sem / Com mecanismos imuno-alérgicos conhecidos
39 Alergia às Proteinas do Leite de Vaca Diagnóstico História Clínica + provas exclusão/provocação Gold standard Meio hospitalar (risco de choque anafiláctico) Testes imunológicos Prick-Test ge sérica total (PRIST) IgE sérica específica (RAST) Endoscopia alta / baixa com biópsias (SOS)
40 Alergia às Proteinas de leite de vaca 1. Intervenção leite materno fórmula hidrolisada completa fórmula elementar 2. Prevenção Aleitamento materno exclusivo > 4-6 meses Fórmula hipoantigénica?? (controverso) Introdução tardia dos alimentos mais alergizantes (ovo, peixe, citrinos, morangos)
41 Parasitoses Giardia Parasita mais frequente (diarreia crónica) Transmissão fecal-oral (quistos) Mucosa jejunal normal com diminuição da superfície de absorção
42 Giardiase Espectro Clínico Assintomática / dor abdominal / diarreia crónica / atraso estaturo-ponderal Diagnóstico Parasitológico das fezes (quistos) Biópsia/aspiração de suco duodenal (trofozoitos) Tratamento Metronidazol
43 Doença Inflamatória Intestinal Idiopática Manifestações digestivas Diarreia contínua ou recidivante Dej. pequenas, c/ sangue, muco, pús (colite) Dor abdominal Perda de peso Manifestações extra-digestivas Febre, artrite, uveite, eritema nodoso. Diagnóstico: clínica + imagiologia + endoscopia Terapêutica : anti-inflamatória e imunossupressora
44 Abordagem da criança com diarreia crónica História Clínica Exame Objectivo Exames Complementares de Diagnóstico
45 Aspectos Fundamentais na caracterização da Diarreia Crónica Idade Características das dejecções Circunstâncias precedentes/ acompanhantes Repercussão na curva estaturo-ponderal
46 Diarreia Crónica na Criança Mecanismo Ex. entidade clínica Dejecções Repercussão P/E Outros absorção D. celíaca volumosas,pastosas/ liquidas, fétidas +++ má-nutrição fermentação Int. lactose abundantes,aquosas, ácidas + / ++ eritema perianal digestão F. quística volumosas,pastosas, +++ inf. respiratórias gordurosas, fétidas motilidade S.intest.irritável pastosas/líquidas,muco, restos alimentares,diurnas Secretória Cólera,Vipoma abundantes, aquosas Inflamação DII, Infecção GI 0 padrão familiar alternância dej.nl ++ pouco volumosas, pastosas/ ++ desidratação sistémicas manifestações
47 História Clínica História familiar Consanguinidade Atopia Patologia auto-imune Antecedentes diarreia neonatal Antecedentes pessoais História alimentar Curva estaturo-ponderal Infecções/infestação Atopia Socialização Situação socio-económica
48 História Clínica Doença actual Grupo etário Características da diarreia: frequência, volume consistência,aspecto presença de muco, sangue ou pus cor, cheiro Data de início da diarreia (intervalo livre) Padrão persistente ou intermitente Horário: padrão funcional vs orgânico Relação com os alimentos
49 Doença actual - Factores associados febre História Clínica artrite, eritema nodoso eczema atópico ou dermatite de contacto fármacos infecções prévias ou recorrentes socialização: infantário, início da vida escolar
50 Exame Objectivo I Avaliação somatométrica Peso Comprimento/altura Relação peso/estatura Perímetro cefálico Curvas de crescimento Índices nutricionais Maclaren: peso (g) / estatura(cm) Kanawati: perímetro braquial/perímetro cefálico IMC: peso (kg) / altura (m)2 Pregas cutâneas (tricipital, omoplata)
51 Exame Objectivo II Estado geral Irritabilidade, labilidade emocional Sinais de desidratação Fenótipo peculiar Pele e mucosas Eritema nodoso, eczema atópico Cabelo (fino, seco, quebradiço) Panículo adiposo (pregas glúteas) Olhos (uveite)
52 Exame Objectivo II Tórax: rosário costal, sulco de Harrison, deformação. Abdómen: distensão, flatulência, palpação dolorosa, massas abdominais Membros: edema, artrite, hipocratismo digital Órgãos genitais (atraso pubertário) Ânus (fissuras, fístulas, eritema perianal)
53 Avaliação Diagnóstica da Diarreia Crónica A abordagem diagnóstica deverá ser sempre individualizada! Exames Complementares 1ª linha: (Exames fecais) Coprocultura; ex. parasitológico; pesq. de vírus Pesquisa de leucócitos, sangue oculto Substâncias redutoras, ph e ácido láctico Doseamento da α1-antitripsina Esteatócrito, elastase 2ª linha: Marcadores serológicos (anti-ttg) Testes alérgicos (Prist, Rast, Prick) Prova do H2 expirado (lactose) Prova do suor 3ª linha: endoscopia (alta,baixa) c/ biopsias.
54 Exames fecais ( Características fecais ) α1 antitripsina fecal esteatócrito Ph e substâncias redutoras
55 Outros Exames Complementares de Diagnóstico (SOS, se evidência de síndrome de má-absorção, repercussão nutricional e/ou no estado geral) Avaliação geral e nutricional Hemograma PCR e VS Ionograma Gasimetria Glicémia Ureia,creatinina Urina II Proteinograma Perfil lipídico Testes hepáticos Ferro, ferritina e transferrina Cálcio, fósforo e fosfatase alcalina Zinco Ácido fólico, vit. B12 Vit. A, D, E Tempo de protrombina RBP (retinol-binding-protein)
56 Caso clínico CMR, sexo fem,12m Motivo de referenciação: - deficiente progressão estaturo-ponderal, - dej. pastosas AF e AP: irrelevantes; Pn p75, Cn p75 2 bronquiolites (3m e 5m); infantário > 3 meses H.alimentar: leite materno <3m; fórmula lactentes > 3m; glúten 6m; diversificação recomendada
57 Caso clínico D. actual: 8ºM: dej.de 1x/d moldadas a 2-3x/d, pastosas, volumosas, fétidas; cruzamento percentis av. médico de família/ dieta antidiarreica intermitente 9ºM: distensão abdominal, irritabilidade, regressão DPM 12ºM: intercorrência Gastroenterite aguda a Rotavirus dej 7x/d, líquidas/ aquosas, por vezes ácidas; prostração internamento
58 Caso clínico Diarreia infecciosa? Sindrome pós-gastroenterite? Parasitose? Intolerância dissacáridos? HIPÓTESES DE DIAGNÓSTICO Intolerância / alergia alimentar? Doença celíaca? Outras?
59 Caso clínico Ex. físico: malnutrição grave, desidratação, palidez, alteração das faneras, edema maleolar
60 Caso clínico Exs. complementares: 1. Av. analítica (exs.alterados): anemia normocítica ( ferro e ac.fólico), hipoalbuminémia, hipokaliemia; t. protrombina, AST/ALT 2xNL, TTG (+) 2. Biopsia jejunal: atrofia vilositária intensa Evolução e terapêutica I: Rehidratação IV, K, albumina IV; VitK e Ferro v.parentérica, polivitamínico
61 Caso clínico Problemas/ Hipóteses de Diagnóstico: 1. Doença celíaca 2. Má nutrição Grave 3. Desidratação
62 Caso clínico Criança 12 meses, D. celíaca (s. má absorção) Má nutrição grave, desidratação, edema palidez, alt. faneras Anemia normocítica (ferro, ac. fólico) Hipoalbuminémia, hipoprotrombinémia, hipozinquémia Que Intervenção Nutricional? Que Prioridades?
63 Caso clínico Intervenção Terapêutica - Nutricional Rehidratação (soros IV), potássio Suplementação vítamínica/ oligoelementos/ sais minerais Polivitamínico, Vit K Zinco Ferro Intervenção Dietética: Dieta de exclusão glúten: toda a vida! - Proíbidos: trigo, centeio, cevada (papas, massas, pão, bolos, bolachas..) - Permitidos: milho, arroz
64 Caso clínico - Somatometria (12 M) Peso: 7Kg (P<<5), P 50-6 M Comprimento: 69cm (P 5 ), P 50-8M
65 Caso clínico Evolução Exclusão glúten, PLV, dissacáridos (8 semanas) rápida melhoria clínica: 2ª sem (2dej/ pastosas), recuperação peso, < irritabilidade Alta 4ª sem! Seguimento em Consulta: Dieta exclusão de glúten, normocalórica, com boa adesão e cumprimento Anticorpos TTG (-) 5A: DEP e DPM normal
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