ACÓRDÃO. Marcia Dalla Déa Barone relator Assinatura Eletrônica

Transcrição

1 fls. 293 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Bernardo do Campo, em que é apelante LEANDRO MESQUITA MONEA, é apelado FORMIGNANO INCORPORADORA LTDA.. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores DONEGÁ MORANDINI (Presidente sem voto), EGIDIO GIACOIA E VIVIANI NICOLAU. São Paulo, 19 de julho de Marcia Dalla Déa Barone relator Assinatura Eletrônica

2 fls. 294 VOTO Nº Apelante: Leandro Mesquita Monea Apelado: Formignano Incorporadora Ltda. Comarca: São Bernardo do Campo - 7ª Vara Cível Juiz: Fernando de Oliveira Domingues Ladeira Ação de rescisão de contrato, cumulada com pedido de restituição dos valores pagos, com pedido liminar Recurso do autor - Relação de consumo configurada entre as partes Incidência do Código de Defesa do Consumidor - Compromisso de compra e venda de bem imóvel Insurgência da ré Possibilidade de retenção de parte do montante pago pelos autores para custeio de despesas com publicidade e administração do empreendimento Incidência das Súmulas 1, 2 e 3 desta Corte de Justiça Abusividade na retenção de 30% dos valores pagos Montante retido que deverá ser fixado em 10% dos valores pagos Devolução deve se dar em uma única parcela Juros de mora devidos a contar da citação Precedentes Comissão de corretagem devida a contar dos desembolsos Sentença de parcial procedência Recurso provido. Dá-se provimento ao recurso. Vistos, Ao relatório de fls. 246 acrescento ter a sentença apelada julgado parcialmente procedente o pedido, para: 1) rescindir o compromisso de venda e compra entre as partes; 2) determinar a devolução de 70 % dos valores pagos, nos termos da sentença, pelos índices contratuais e com juros do trânsito em julgado; 3) determinar a devolução integral da SATI e Comissão de Corretagem VOTO Nº

3 fls. 295 corrigidas do desembolso e com juros da citação; 4) determinar a devolução de valores pagos a título de IPTU e taxas condominiais anteriores à imissão na posse do imóvel, corrigido pela tabela prática do Tribunal de Justiça de São Paulo e com juros moratórios a contar do trânsito em julgado. Pelo princípio da causalidade, condenou a requerida ao pagamento das custas e despesas processuais, observados os artigos 84 e 85, 2º do Código de Processo Civil, acrescidos de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor da condenação, incidindo juros moratórios a partir do transito em julgado da sentença, nos termos do artigo 85, 2º e 16 do Código de Processo Civil. Ao final, destacou que a parte autora decaiu de parte mínima do pedido, deixando de fixar honorários advocatícios e abstendo-se de determinar o rateio de despesas processuais, que seriam integralmente suportadas pelo vencido. O autor apresenta recurso de apelo (fls. 257/267) sustentando que a r. sentença apelada comporta reforma. Sustenta que em 19 de março de 2013, se dirigiu ao estande de vendas da requerida, com a qual firmou instrumento particular de promessa de compra e venda de imóvel para entrega futura, tendo por objeto a aquisição da unidade 62, torre C Rio de Janeiro, no empreendimento imobiliário Olimpic Mbigussi, com prazo de entrega previsto para 2015, com tolerância de mais 180 dias úteis. Sustenta que, embora estivesse efetuando o pagamento dos valores, a quantia sofreu majoração em razão da incidência de juros, multa e correção monetária, o que fez com que o saldo devedor sofresse aumento considerável. Argumenta que procurou buscar a rescisão amigável do contrato, mas a requerida exigiu VOTO Nº

4 fls. 296 o pagamento de multa no valor de R$33.520,63. Alega que não restou alternativa ao apelante, a não ser o envio de notificação extrajudicial, relativo ao seu ingresso com uma ação judicial para obter o decreto de rescisão do contrato e a devolução daquilo que lhe é devido por direito. Acrescenta que a retenção de 30% dos valores pagos pelo requerente se mostra excessiva e pugna pela devolução de 90% dos valores pagos pelo autor da demanda, na medida em que não há provas nos autos a ensejar multa em valor maior. Ressalta que a redução de 10% sobre os valores pagos se mostra suficiente para o pagamento dos gastos da requerida com administração e propaganda. Alega que devem ser compensadas as despesas com gastos de administração e publicidade, nos termos da Súmula 1 do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que determina a compensação dos gastos de administração e publicidade. Defende que a retenção de 10% dos valores corresponde a quantia de R$7.587,51, valor que se mostra mais condizente para o custeio das despesas com administração do que a quantia de R$ ,54, que a requerida pretende reter. Afirma que, caso a r. sentença apelada seja mantida, nos termos em que fixada, restará configurada a pena de confisco, com a consequente ofensa ao Código de Defesa do Consumidor. Pugna pela reforma da r. sentença apelada, a fim de que sejam restituídos 90% dos valores pagos, devidamente corrigidos, a partir do desembolso de cada parcela, acrescido de juros legais de 1% ao mês, desde a citação até a efetiva restituição dos valores, observado o disposto pela Sumula 543 do E. Superior Tribunal de Justiça, bem como com as Súmulas 1, 2 e 3 do E. Tribunal de Justiça de São Paulo. VOTO Nº

5 fls. 297 O recurso foi processado nos termos do Novo Código de Processo Civil (fls. 270). Contrarrazões a fls. 273/282, em que a requerida sustenta que o valor do preparo foi recolhido em valor menor do que aquele efetivamente devido. Foi proferido despacho (fls. 289/290) em que se destacou que o valor do preparo obedeceu ao disposto pelo artigo 4º, inciso II da Lei Estadual , de 29 de dezembro de 2003, com as alterações da Lei n , de 02 de julho de 2015, restando afastada a alegação da requerida de que o preparo comportava majoração. As partes não se opuseram ao julgamento virtual. É o relatório. Inicialmente, inequívoca a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela, tendo em vista que a relação jurídica sub judice enquadra-se como relação de consumo, nos termos dos artigos 1º e 2º daquele Diploma legal. A parte autora, na condição de compromissária compradora de bem imóvel, é vulnerável na relação contratual estabelecida com a parte ré, a qual, por outro lado, é grande empreendedora da área imobiliária, que atua objetivando lucro, sendo assim, fornecedora sujeita às normas consumeristas. Inegável, ademais, que o contrato celebrado é de adesão, uma vez que a maioria de suas cláusulas foi estipulada pela fornecedora, de modo unilateral, sem que o consumidor VOTO Nº

6 fls. 298 pudesse discutir ou alterar substancialmente seu conteúdo, nos termos do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor. A parte ré não se opõe à resolução do contrato, persistindo a controvérsia em relação à possibilidade de retenção de parte dos valores pagos, bem como quanto ao valor a ser restituído aos compradores, sustentando a parte ré que deve haver a retenção de 30% dos valores pagos, quantia que foi adotada pela r. sentença apelada, que determinou a restituição de 70% dos valores pagos pela parte autora. Insurge-se a parte autora contra a r. sentença apelada, sustentando que a retenção de 30% dos valores pagos se mostra excessiva, pugnando pela retenção de somente 10% dos valores pagos pelos autores, ressaltando que a quantia seria suficiente para a reparação das despesas da parte ré com publicidade e administração. Como é cediço, na hipótese de rescisão, ainda que a pedido dos adquirentes, é possível o acolhimento da pretensão de restituição dos valores pagos, sob pena de configurar o enriquecimento ilícito, vedado pelo ordenamento jurídico. Na hipótese dos autos, restou incontroverso o desejo da parte autora de rescindir o negócio, uma vez que os autores afirmam não tinham mais interesse na manutenção do contrato, pugnando pelo cancelamento do ajuste. Configurada a culpa dos compromissários compradores pela rescisão do contrato, a retenção de parte dos valores VOTO Nº

7 fls. 299 pagos é admitida segundo jurisprudência pacífica desta Corte de Justiça, conforme restou sedimentado nas Súmulas 1, 2 e 3 do Tribunal de Justiça de São Paulo, da Seção de Direito Privado: Súmula 1: O Compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem; Súmula 2: A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição; e Súmula 3: Reconhecido que o compromissário comprador tem direito à devolução das parcelas pagas por conta do preço, as partes deverão ser repostas ao estado anterior, independentemente de reconvenção E também, de acordo com a Súmula 543, recentemente aprovada pelo Col. Superior Tribunal de Justiça, que prescreve: Súmula 543: Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. A retenção de parte dos valores é justificada com fundamento no ressarcimento de despesas VOTO Nº

8 fls. 300 administrativas, uma vez que a rescisão do contrato causa a redução do fluxo de caixa, bem como a necessidade de devolução das parcelas pagas, o que onera todo o empreendimento, justificando a retenção. Contudo, a retenção não pode observar o quanto requerido pela parte ré, isto é, que seja feita no importe de 30% dos valores pagos, como determinado pela r. sentença apelada, uma vez que a retenção deste valor se mostra abusiva, assim como se mostra abusiva a previsão de retenção de 20% dos valores pagos prevista pela cláusula XVI do contrato firmado pelas partes, que deve ter sua nulidade reconhecida em observância ao artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, a retenção de 10% dos valores pagos, e não de 30% dos valores pagos pelos autores, se mostra mais adequada ao restabelecimento do status quo ante, mantendo-se, assim, o equilíbrio do contrato. Neste sentido, colacionam-se precedentes desta E. 3ª Câmara de Justiça, que adotam percentuais semelhantes ao ora adotado: Agravo Regimental/ Promessa de Compra e Venda Relator(a): Carlos Alberto de Salles Comarca: São Paulo Órgão julgador: Data do julgamento: 06/04/2015 Data de registro: 06/04/2015 Ementa: Agravo Regimental. Interposição contra decisão monocrática que deu parcial provimento ao recurso de apelação para declarar a rescisão do contrato de compromisso de compra e venda, condenando a ré à restituição dos valores pagos a título de taxas de intermediação e das parcelas pagas, autorizada a retenção de 10% para pagamento de despesas com propaganda e administração. Agravo regimental não provido Apelação / Promessa VOTO Nº

9 fls. 301 de Compra e Venda Relator(a): Alexandre Marcondes Comarca: Mirassol Órgão julgador: Data do julgamento: 23/03/2015 Data de registro: 23/03/2015 Ementa: COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA Ação de rescisão contratual c.c. reintegração de posse Rescisão do contrato por inadimplemento da promitente compradora Vendedora que não é obrigada a aceitar a proposta de parcelamento da dívida - Direito da compradora à restituição do sinal - Valor que integra o preço ajustado Arras de caráter confirmatório do negócio jurídico Retenção, pela vendedora, de 10% do montante pago pela compradora para fazer frente a despesas administrativas e de propaganda Incidência da Súmula nº 1 do TJSP Pedido de indenização pelo tempo de ocupação do imóvel não formulado na inicial Inadmissibilidade de apreciação em sede de apelação Juros de mora Incidência sobre o montante a ser restituído a ré após o trânsito em julgado e da intimação da autora para pagamento RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS, O DA AUTORA NA PARTE CONHECIDA Apelação/Promessa de Compra e Venda Relator(a): Donegá Morandini Comarca: São Paulo Órgão julgador: Data do julgamento: 12/12/2016 Data de registro: 12/12/2016 Ementa: COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA DE BEM IMÓVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. Desistência do negócio apresentada pela adquirente. Hipótese a ensejar o desfazimento do contrato e o retorno dos contratantes ao estágio anterior à relação contratual. Retenção estabelecida em 25% (vinte e cinco) por cento dos valores quitados. Ampliação descabida. Falta, na espécie, de efetiva ocupação do imóvel, bem assim de outros prejuízos relacionados ao desfazimento do contrato. Montante calibrado aos prejuízos ordinários resultantes da rescisão. Precedentes. Atualização da importância a ser restituída. Correta incidência de correção monetária e de juros moratórios. Correção alinhada à simples recomposição inflacionária da moeda. Juros, por seu turno, correspondentes à mora da empreendedora na devolução segundo o requerimento administrativo. Incidência do art. 405 do Código Civil. APELO DESPROVIDO Ademais, conforme já transcrito na Súmula 2 do Tribunal de Justiça de São Paulo, a devolução das quantias pagas pelo comprador deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando a forma de parcelamento. Quanto ao termo inicial de incidência dos VOTO Nº

10 fls. 302 juros de mora, este deve se dar a partir da citação, uma vez que se cuida de relação contratual e considerando que os autores procuraram obter a restituição dos valores pagos extrajudicialmente. Aplica-se ao caso o disposto no artigo 405 do Código Civil, tendo em vista que a citação constituiu a ré em mora, não comportando acolhimento a tese da requerida de que o termo inicial se daria a partir do trânsito em julgado. A correção monetária, por sua vez, deverá incidir a partir de cada desembolso. Nesse sentido o entendimento desta E. Corte de Justiça: Apelação/Promessa de Compra e Venda Relator(a): Luis Mario Galbetti Comarca: São Paulo Órgão julgador: 7ª Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 19/12/2016 Data de registro: 19/12/2016 Ementa: Apelação Venda e compra Rescisão A devolução de parte dos valores pagos é possível em hipótese de inadimplemento do comprador. Considerando que a rescisão do contrato ocorreu por culpa dos autores, é razoável a retenção equivalente a 10% do valor pago a título de ressarcimento pelas despesas administrativas relativas ao empreendimento, sendo abusiva a retenção pretendida pela ré. Cuidando-se de relação contratual, os juros devem ser contados da citação. É correta a devolução dos valores pagos por taxas condominiais, considerando-se que aos autores não foi dada a posse do imóvel e dele não puderam usufruir. Recurso não provido Apelação/Promessa de Compra e Venda Relator(a): Beretta da Silveira Comarca: Ribeirão Preto Órgão julgador: Data do julgamento: 16/12/2016 Data de registro: 16/12/2016 Ementa: Ação de rescisão de contrato c.c. reintegração de posse. Inadimplemento dos compradores. Demonstração, nos autos de causa suficiente ao rompimento da avença. Contudo, conquanto tenham dado causa ao desfazimento do contrato, os compromissários compradores têm o direito de receber, em uma só parcela, parte das quantias pagas servindo a outra parte como compensação da promitente vendedora quanto aos gastos de propaganda, administração e à ocupação do imóvel. Direito consequente dos réus receberem em retorno 10% das VOTO Nº

11 fls. 303 quantias pagas, com correção monetária e juros de mora. Distribuição dos ônus sucumbenciais que deve ser conservada. Precedentes desta Corte e Súmulas 2 e 3, TJ/SP. RECURSO PROVIDO, EM PARTE. Tem-se, portanto, que o pedido comporta parcial acolhimento, a fim de que seja autorizada a retenção de apenas 10% dos valores pagos pela parte autora, com a restituição de 90% das quantias adimplidas, acrescidas de correção monetária desde o desembolso e juros de mora a contar da citação. Em atendimento ao disposto no artigo 85, 11 do novo Código de Processo Civil, majoro o valor dos honorários advocatícios para a quantia de 12% sobre o valor da condenação em favor do patrono do autor, destacando que a r. sentença apelada condenou a parte requerida ao pagamento integral da sucumbência. Em face do exposto, pelo voto, Dá-se provimento ao recurso, a fim de determinar a devolução de 70% dos valores pagos pela parte autora, acrescidos de correção monetária a contar do desembolso e juros de mora a contar da citação, mantida a r. sentença apelada em relação aos demais termos. MARCIA DALLA DÉA BARONE Relatora VOTO Nº