PROCURADORIA-GERAL DO TRABALHO CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO

Transcrição

1 Origem: PRT da 1ª Região Rio de Janeiro/RJ Órgão Oficiante: Dra. Lúcia de Fátima dos Santos Interessado 1: Sandro Alex de Oliveira Cezar Interessado 2: Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho e Previdência Social no Estado do Rio de Janeiro. COBRANÇA DE HONORÁRIOS INDEVIDA DE ADVOCATÍCIOS POR ENTE SINDICAL. NECESSIDADE DE ATUAÇÃO DO MPT. O sindicato tem O ônus normativo de prestar assistência jurídica aos seus associados. O art. 514, b, da CLT, estabelece claramente essa inescusável obrigação legal dos entes sindicais, denominada de assistência jurídica sindical. Os custos financeiros desse serviço de assistência jurídica são suportados pelos honorários assistenciais. Os arts. 14 a 18, da Lei de 26 de junho de 1970, regulamentam minuciosamente o exercício dessa atribuição associativa. O referido diploma legal determina ainda, que a verba honorária assistencial será devida diretamente à entidade sindical. Destarte, ficam vedados os contratos paralelos entre os substituídos e os advogados dos sindicatos. No caso concreto, existe prova dessa transferência indevida do ecargo financeiro da assistência jurídica sindical, que é marcada pela gratuidade em relação aos integrantes da categoria profissional. 1

2 I RELATÓRIO Trata-se de denúncia do Sr. Sandro Alex de Oliveira Cezar em face do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho e Previdência Social no Estado do Rio de Janeiro, alegando que o sindicato denunciado estaria cobrando indevidamente honorários advocatícios de seus associados e não associados nos autos de ação ajuizada em desfavor da FUNASA- Fundação Nacional de Saúde. O Órgão Oficiante promoveu o arquivamento da representação formulada pelo denunciante (fl.103) por entender desnecessária a intervenção do MPT, pois o objeto da denúncia se encontra sob o crivo do judiciário. Irresignado, o denunciante interpõe recurso, mediante os fundamentos de fl. 106/112. O órgão de origem manteve seu entendimento em sede de juízo de retratação às fls Contrarrazões do recorrido às fls. 128/135. É o breve relatório. II ADMISSIBILIDADE O recurso administrativo foi interposto dentro do prazo previsto no 10º, 1º, da Resolução CSMPT nº 69/2007. Portanto, dele conheço. III FUNDAMENTAÇÃO A representação inicial noticia que o SINDSPREVRJ estaria cobrando honorários advocatícios indevidamente, dos trabalhadores filiados, bem como dos não associados (em 2

3 valores diversos), relativamente ao patrocínio da reclamação trabalhista O Órgão oficiante de origem promoveu o arquivamento do inquérito civil, ao entendimento de que a matéria já estava sendo discutida em juízo. O denunciante, irresignado, recorre administrativamente. Razão assiste ao recorrente. Com efeito, a questão extrapola os limites subjetivos da reclamação trabalhista , já que envolve um dever legal do sindicato recorrido, a prestação dos serviços de assistência jurídica à integralidade da respectiva categoria profissional, abrangendo os associados e os não filiados. O sindicato tem o ônus normativo de prestar assistência jurídica aos seus associados. O art. 514, b, da CLT, estabelece claramente essa inescusável obrigação legal dos entes sindicais, denominada de assistência judiciária sindical. Os custos financeiros do serviço de assistência jurídica que deve ser prestado pelo ente sindical são suportados através dos honorários assistenciais. Nesse sentido, os arts. 14 a 18, da Lei de 26 de junho de 1970, regulamentam minuciosamente o exercício dessa atribuição associativa. O referido diploma legal determina ainda, que a verba honorária assistencial será devida diretamente à entidade sindical, verbis: Art 16. Os honorários do advogado pagos pelo vencido reverterão em favor do Sindicato assistente. 3

4 A súmula 219, do TST, é taxativa também no sentido de ampliar as hipóteses de condenação dos honorários assistenciais sindicais, verbis: HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HIPÓTESE DE CABIMENTO (nova redação do item II e inserido o item III à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e I - Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca superiores a 15% (quinze por cento), não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família. (ex-súmula nº Res. 14/1985, DJ ) II - É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista. III São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como substituto processual e nas lides que não derivem da relação de emprego. Inegável a importância da assistência judiciária sindical que vem, a propósito, desde os primórdios do sistema celetário, estando gravada na redação da letra b do art. 514, a obrigatoriedade de prestação de tais serviços. Esse dispositivo foi recepcionado pelo inciso III do art. 8º da Carta Política atual que a consagrou nos seguintes moldes: ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses 4

5 coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas; A teleologia dos preceitos legais citados é a de dispensar os trabalhadores do pagamento honorários do patrono eleito pela criatura sindical, especialmente se considerarmos que a obrigação legal do sindicato de prestar os serviços elencados no art. 514, Consolidado é uma contrapartida da contribuição sindical compulsória regrada nos arts. 578 a 591, da CLT e das demais fontes de arrecadação dessas entidades. Portanto, o sindicato conta com diversas fontes de custeio para desincumbir-se do seu dever legal de prestar assistência jurídica gratuita aos integrantes da categoria profissional que representa, e ainda se beneficia da percepção dos honorários assistenciais, pagos sempre pelo vencido das causas que ajuíza. O direito acima invocado pelo autor irradia que a prestação da assistência judiciária não é uma escolha do sindicato, mas, sim, função inerente a sua existência, que não pode ser recusada, postergada, alterada, tornada ineficaz ou descaracterizada. A receita conferida pelo art. 592 da Consolidação das Leis do Trabalho, decorrente da contribuição sindical e da contribuição sindical compulsório deverão obrigatoriamente subsidiar, dentre outras finalidades, a assistência judiciária, inteligência do inciso IV do art. 8º da Constituição Republicana. Nesse sentido é o magistério de Ruy Fernando Gomes Leme Cavalheiro: O que se percebe é que não apenas a prestação da assistência judiciária sindical é uma obrigação do sindicato, como, ainda, que esta prestação é 5

6 remunerável mediante a condenação e percepção de honorários sucumbenciais assistenciais. Identifica-se como consequência destas duas conclusões que a atividade do advogado na ação judicial sujeita à assistência sindical não é atípica atividade contratada entre as partes, mas, sim, atividade sui generis, de prestação de serviços contratados por uma parte em benefício de terceiro. Quanto ao advogado empregado do sindicato, sua atividade na prestação da assistência judiciária é decorrência de seu contrato de trabalho, por força de lei, e, assim, se sujeita à regra presuntiva do parágrafo único do art. 456 da CLT, pela qual À falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal. Deve se observar, ainda, que o art. 18 da Lei n /1994(5), o Estatuto da Advocacia, norma especial, nada dispõe em contrário, de modo que seu contrato de trabalho será igual, em seu conteúdo, aos dos demais advogados empregados. Integra seu contrato de trabalho, portanto, a obrigação de prestar a assistência judiciária gratuita, a não ser que de outro modo nele se estipule, como, por exemplo, se o advogado for contratado apenas para prestar serviços que digam respeito à representação direta do sindicato. Mas, nesta situação, não deveria prestar a assistência judiciária sindical, e se o faz, de modo espontâneo, a mando de seu sindicato empregador, ou em conluio com este, ainda assim deve ser gratuita a assistência, em relação ao membro da categoria. 6

7 Já nos casos de contratação de advogados autônomos, ou de sociedades de advogados, pelo sindicato, se o objeto do contrato for a prestação da assistência judiciária nos termos da Lei n /1970, então se considera como ínsita ao contrato a gratuidade, em relação ao membro da categoria patrocinado, podendo o advogado pleitear pagamentos apenas em face do sindicato que o tenha contratado. Deste modo, em todas as hipóteses de atuação de advogado contratado pelo sindicato por contrato de emprego ou de prestação de serviços de advogado para prestar os serviços de assistência judiciária gratuita a que é obrigado o sindicato, não poderá pactuar ou cobrar honorários dos membros da categoria assistidos. (grifamos e sublinhamos)( Assistência Judiciária Sindical E Os Honorários Contratuais De Advogado in Revista do Ministério Público do Trabalho, n. 44. Ed. Ltr. São Paulo Pgs ). Nessa toada, com a assistência judicial levada a cabo pelo grêmio profissional, ficam vedados os contratos paralelos entre os substituídos e advogados. Outra não foi a senda trilhada pelo XV CONAMAT Congresso Nacional da Magistratura do Trabalho, realizado no mês de abril de 2010 em Brasília, ao aprovar a seguinte tese: O art. 22 e seu 1o, da Lei 8.906/94 - Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil -, não autorizam advogado de sindicato, constituído nos termos do art. 14, da Lei 5.584/70, firmar, paralelamente, com o trabalhador, contrato de honorários, sob risco de, sistematicamente, lesar todo o propósito institucional da Assistência Judiciária Gratuita. 7

8 Destarte, não pode o sindicato transferir aos trabalhadores o ônus financeiro dos serviços advocatícios prestados por profissionais autônomos ou empregados. Sob esse viés, o contrato de honorários advocatícios juntado pelo recorrente às fls. 6/7, comprova essa cobrança de honorários contratuais, não permitida pelos dispositivos legais acima mencionados. Cabe ao recorrido custear o pagamento dos serviços advocatícios com os valores apurados a título de honorários assistenciais, nos precisos termos da Súmula 219/TST. A situação fática acima delineada demanda a atuação do MPT, diante da potencial lesão a interesse coletivo em sentido estrito. Nesse ponto, o fato do Sindicato dos Trabalhadores no Combate a Endemias e Saúde Preventiva no Estado do Rio de Janeiro SINTESAÚDE ter ingressado com ação judicial buscando a declaração de nulidade da cláusula contratual no percentual de 15% (exclusivamente em relação aos não filiados) não atende a tutela integral do interesse coletivo em questão, porque o pleito não abrange a cobrança de honorários advocatícios (não assistenciais) imputados aos filiados do recorrido, procedimento que colide com o princípio da gratuidade da prestação do serviço de assistência jurídica associativa sindical em relação aos integrantes da categoria profissional, sejam eles filiados ou não. Esse é o regulamento do art. 18, da Lei 5584/70, verbis: Art 18. A assistência judiciária, nos termos da presente lei, será prestada ao trabalhador ainda que não seja associado do respectivo Sindicato. Reitera-se que tais serviços devem ser remunerados através da figura das diversas fontes de custeio das entidades sindicais e dos honorários assistenciais, na forma da Lei de 26 de junho de 1970 e do Verbete Sumular 219/TST. 8

9 Não homologo, portanto, a promoção de arquivamento, por vislumbrar que já existem elementos fáticos nos autos que demandam e fundamentam a ajuizamento de ação coletiva pelo MPT para impedir a cobrança indvida em discussão. IV - CONCLUSÃO À vista do exposto, voto pelo conhecimento do recurso e pelo seu provimento, não homologando a promoção de arquivamento e, determino o ajuizamento de ação civil pública para impedir a cobrança dos honorários advocatícios decorrentes do contrato de prestação de serviços advocatícios, bem como para impor ao recorrido a obrigação de abster-se de cobrar a verba honorária dos integrantes da categoria profissional, filiados ou não ao sindicato. Brasília, em 28 de novembro de Fábio Leal Cardoso Membro da CCR - Relator 9