ESTADO DA PARAÍBA PODER JUDICIÁRIO GABINETE DO EXMO. DES. MÁRCIO MURILO DA CUNHA RAMOS

Transcrição

1 d ÀL à '1r. \ZS ESTADO DA PARAÍBA PODER JUDICIÁRIO GABINETE DO EXMO. DES. MÁRCIO MURILO DA CUNHA RAMOS ACÓRDÃO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA APELAÇÃO CÍVEL N /001 r Vara da Comarca de Catolé do Rocha RELATOR : Des. Márcio Murilo da Cunha Ramos EMBARGANTE: Banco do Nordeste do Brasil S/A ADVOGADOS : Marcos Firmino de Queiroz e outros EMBARGADOS: Cícero Alves de Farias e Rita Dutra de Farias ADVOGADO : Luiz de Sousa Leite APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIMENTO DO APELO MONOCRATICAMENTE INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONVERSÃO EM AGRAVO INTERNO PENHORA BEM IMÓVEL IMPENHORÁVEL IMPOSSIBILIDADE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL CONFIGURADA AUSÊNCIA DE LEI REGULAMENTADORA DO ART. 5, XXVI, DA CF APLICABILIDADE, POR ANALOGIA, DO ART. 40,!, DA LEI N 8.629/93 PRECEDENTES DE TRIBUNAIS DE JUSTIÇA E DO STF ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE ERRO MATERIAL NO DECISUM CONSTATAÇÃO CORREÇÃO DEVIDA PROVIMENTO PARCIAL. _ "É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que não cabem embargos declaratórios contra decisão monocrática, devendo esses embargos, quando possível e é o caso, ser conhecidos como agravo regimental." (STF 1 Turma AI AgRg Rel. Min. Moreira Alves DJ ) "PENHORA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL DEFINIÇÃO AGRAVO DESPROVIDO. (...) cumpre, então, perquirir o que se entende como pequena propriedade rural. A Lei 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, define-a com base na área compreendida entre um e quatro módulos fiscais e muito embora tal diploma diga respeito à desapropriação-pena do artigo 185 da Constituição Federal, iniludivelmente, fixa os parâmetros concernentes à pequena propriedade, e esta não pode ser considerada de forma únic e o como aplicável à espécie a citada lei, não confe do à referê cia à desapropriação eficácia restritiva." F AI n /PR Rel.: Ministro Marco Aurélio) Existindo err material na decisão, impõe-se a sua correção. acima identificados. VISTOS, RE TADOS E DISCUTIDOS os presentes autos 1

2 ACORDA a Egrégia Terceira Câmara Cível do Colendo Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, por unanimidade, EM RECEBER OS EMBARGOS COMO AGRAVO INTERNO E DAR-LHE PROVIMENTO PARCIAL PARA CORRIGIR O ERRO MATERIAL. RELATÓRIO Trata-se de embargos de declaração (fls. 109/113) opostos por Banco do Nordeste do Brasil S/A, em face da decisão monocrática proferida às fls. 106/107, que negou provimento ao apelo interposto pelo embargante, sob o argumento de ter ocorrido erro material no julgado, porquanto deveria ter sido considerado o conceito de pequena propriedade rural previsto no Estatuto da Terra (Lei n 4.504/64) e não a definição da Lei n 8.629/93. É o brevíssimo relatório. VOTO: Foram opostos os presentes embargos de declaração com o fim de reformar a decisão monocrática que negou provimento ao apelo interposto pelo embargante (fls. 106/107), quando, na verdade, por se tratar de decisão que nega provimento a recurso monocraticamente, é cabível o agravo interno, no prazo de 05 (cinco) dias, nos moldes do art. 284, do R1TJPB. Todavia, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que, na hipótese dos autos, sejam convertidos os embargos de declaração em agravo interno, consoante atestam as decisões abaixo transcritas, ad litteram: "É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que não cabem embargos declarat6rios contra decisão monocrática, devendo esses embargos, quando possível e é o caso, ser conhecidos como agravo regimental." ( STF I I T. AI AgRg Rel. Min. Moreira Alves DJ ) "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.PROCESSUAL CIVIL. CABIMENTO. OMISSÃO. OBSCURIDADE. CONTRADIÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA DOS ALUDIDOS DEFEITOS. EFEITO INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS. 2. A doutrina e a jurisprudência têm-se manifestado no sentido da possibilidade de recebimento dos embargos de declaração como agravo regimental, sempre que constatada a inexistência de omissão, contradição ou obscuridade no julgado monocrático impugnado. (...)" (Grifei) (EDcl nos EDcl no REsp /SC, Rel. Ministra Denise Arruda, Corte Especial, julgado em 17/04/2007, DJ 21/05/2007 p. 545) Embora os embargos declaratórios devam ser convertidos em agravo interno, no meu entendimento, o recurso deve ser parcialmente provido, apenas para corrigir o erro material existente. O recorrente, nas razões de fls. 109/113, alega que, na ausência da lei específica para regulamentar o inciso XXVI do art. 50 da Carta Magna, acerca da definição do termo "pequena propriedade rural", para que se possa reconhecer a impenhorabilidade do bem, deveria ser utilizado o conceito de pequena propriedade rural previsto no Estatuto da Terra, ou seja, imóvel com ' a 4e até um módulo rural, e não a definição da Lei n 8.629/93, que trata da re ma a ária, delimitando em até quatro módulos fiscais, nos mesmos termos das razi s do recurso : -. oelação. Entretanto, pel eitura do agravo interno, observo ter se tornado incontroverso que a falta de lei neces iria à imediata aplicabilidade de regra constitucional, sobretudo quando criadora de dit.; to ou garantia fundamental, pode ser suprida por analogia. 2

3 O cerne da questão é saber se deve ser aplicado o conceito da Lei n 4.504/64 (Estatuto da Terra) ou da Lei n 8.629/93 (Lei da Reforma Agrária). Em que pese ao aresto citado na decisão monocrática da relatoria do Dr. Geraldo Emílio Porto, Juiz Convocado a me substituir, proferido nos autos do RE n , da lavra do Excelentíssimo Senhor Ministro Sepúlveda Pertence, validar a utilização do conceito de "propriedade familiar" prevista no Estatuto da Terra, esta não representa a orientação atual da jurisprudência. Todavia, a transcrição do referido julgado serviu para demonstrar que. o entendimento jurisprudencial tem sido no sentido de que o inciso XXVI do art. 5 da Constituição Federal, por tratar de garantia fundamental, é de aplicabilidade imediata, razão pela qual, a ausência de lei regulamentadora pode ser suprida por analogia. Cabe ressaltar que o RE n foi distribuído em 30 de abril de 1991, ou seja, em data anterior à edição da Lei da Reforma Agrária (Lei n 8.629/93), e, portanto, jamais poderia o referido julgamento tratar sobre a lei mais adequada para conceituar a "pequena propriedade rural", limitando-se a ratificar a possibilidade de se aplicar a interpretação por analogia. Após a edição da Lei n 8.629/93, os Tribunais de Justiça, e até mesmo o Egrégio STF, passaram a se utilizar da definição nela contida para a expressão "pequena propriedade rural", sendo aquela com área de 01 (um) a 04 (quatro) módulos fiscais. Nesse sentido, destaco os seguintes julgados: "EXECUÇÃO. IMPENHORABILIDADE DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL TRABALHADA PELA FAMÍLIA POR DÍVIDA DECORRENTE DE SUA ATIVIDADE PRODUTIVA. IMPENHORABILIDADE DE TRATOR, ÚTIL PARA O DESEMPENHO DO OFÍCIO DE AGRICULTOR. O inciso X do art. 649 do Código de Processo Civil, acrescentado pela Lei 7.513/86, e o inciso XXVI do art. 5o da Constituição traçam duas hipóteses distintas de impenhorabilidade. Portanto, o citado dispositivo legal não é regulamentação do dispositivo constitucional, e nem foi por ele revogado; assim, a incidência de cada um deve ser analisada separadamente. A definição de pequena propriedade rural consta do art. 4o, I, da Lei 8.629/93 como sendo aquela compreendida entre um e quatro módulos fiscais, conceito diferente de módulo rural. Embora a referida lei tenha tido por obietivo definir pequena propriedade rural para fins de desapropriação, a reaulamentação também pode ser entendida como extensiva à impenhorabilidade, uma vez que a Constituição usa o mesmo conceito de pequena propriedade rural para ambos os fins, nos seus art. 5o, XXVI, e 185, I. O trator, por ser instrumento no mínimo útil para o exercício da profissão de agricultor, é impenhorável, nos termos do art. 649, VI, do Código de Processo Civil." (Grifei) (TA/MG, Apelação Cível n , Rel.: Dra. Maria Elza, Quarta Câmara Cível, julgado em 27/02/2002, DT 09/03/2002) "APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À PENHORA. IMPENHORABILIDADE DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL TRABALHADA PELA FAMÍLIA. Nos termos do art. 5 0, inciso XXVI, da CF e do art. 649, inc. VIII, do CPC, é impenhorável o imóvel enquadrado no conceito de pequena propriedade rural (art.4 da Lei n 8.629/93). (...) Atendidos os requisitos ais, im e-se o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel constrito n autos exe alvos. Apelo do embarga, e provido." (Se,s no original) (TJ/RS, Apela ". Cível n , Décima Segunda Câmara Cível, Relator: Orlaw. o Heemann Júnior, Julgado em 23/04/2009) "APELAÇ O CÍVEL EMBARGOS À EXECUÇÃO. PENHORA. PEQUENA PROPRI lo ADE RURAL. RENÚNCIA DO BENEFÍCIO LEGAL DA IMPENHORABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. 3

4 A pequena propriedade rural encontra-se protegida de constrição judicial, nos termos do art. 5 0, inciso XXVI, da Constituição Federal. Hipótese dos autos em que o imóvel se insere no conceito leni, conferido pela leeislação infraconstitucional (Leis 8.009/90 e 8.629/93), por estar dentro do limite de 1 a 4 módulos fiscais. Impossibilidade de renúncia à garantia, por se tratar de direito fundamental que visa à proteção da família do pequeno agricultor." (Grifei) (TJ/RS, Apelação Cível n , Décima Segunda Câmara Cível, Relator: Orlando Heemann Júnior, Julgado em 23/04/2009) O Egrégio Supremo Tribunal Federal já se posicionou a respeito da utilização da Lei n 8.629/93, por analogia, para conceituar a expressão "pequena propriedade rural" na análise da impenhorabilidade prevista no art. 5, XXVI, da Carta Magna, em decisão monocrática da relatoria do Excelentíssimo Senhor Ministro Marco Aurélio de Mello, in verbis: "DECISÃO - PENHORA - PEQUENA PROPRIEDADE RURAL - DEFINIÇÃO - AGRAVO DESPROVIDO. (...) A pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento. Pois bem, cumpre, então, perquirir o que se entende como pequena propriedade rural. A Lei n 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, define-a com base na área compreendida entre um e quatro módulos fiscais e muito embora tal diploma diga respeito à desapropriação-pena do artieo 185 da Constituicão Federal, iniludivelmente, fixa os parâmetros concernentes à pequena propriedade, e esta não pode ser considerada de forma distinta, tendo em conta tratar-se de desapropriação ou penhora. É que está prevista em um mesmo diploma, ou seja, na Constituição Federal e, por isso mesmo, deve ter definição única. Tenho como aplicável à espécie a citada lei, não conferindo à referência à desapropriação eficácia restritiva." (Grifei) (AI , Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 24/08/1998, publicado em DJ DATA P-00026) Saliente-se, ainda, que a doutrina perfila o mesmo sentido, como exemplifica o posicionamento de Eduardo Cambi, nos seguintes termos: "Dar condições para que as famílias trabalhem e se fixem no campo é o grande objetivo social que pode ser alcançado por intermédio da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, atendendo-se, para esse fim, que, pelo art. 4o, I, da Lei 8.629/93, é considerada pequena propriedade o imóvel rural de área compreendida entre um a quatro módulos fiscais." (Sem grifos no original) (Tutela do património mínimo necessário à manutenção da dignidade do devedor e da sua família. In: Shimura, Sérgio e Wambier, Teresa Arruda Alvim (org.). Processo de execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 266) Assim, ainda que a documentação acostada aos autos seja imprecisa quanto à dimensão do imóvel penhorado, verifico que a sua área não ultrapassa 70,0 ha (setenta hectares), medida esta inferior ao limite da área impenhorável, que é de 240 ha (duzentos e quarenta hectares), correspondente 04 (quatro) módulos fiscais, nos termos do art. 4 0, I, da Lei n 8.629/93, restando configurada como pequena propriedade rural. Outrossim, no tocante à alegação de erro material no decisum monocrático, por ter se referido à Lei n 8.629/93 como sendo o Estatuto da Terra, esta denominação deve ser corrigida para. 1 d Reforma Agrária, cujo ponto merece acolhimento. Ante o xposto, RECEBO COMO AGRAVO INTERNO OS EMBARGOS DECLAR ÓRIOS, DANDO-LHE PROVIMENTO PARCIAL, apenas para a correção d erro material, mantendo a decisão agravada nos seus demais termos. É como voto. 4

5 ' Presidiu a Sessão o Exmo. Sr. Des. Genésio Gomes Pereira Filho. Participaram do julgamento, o Exmo. Des. Márcio Murilo da Cunha Ramos, Exmo. Des. Saulo Henriques de Sá e Benevides e o Exmo. Des. Genésio Gomes Pereira Filho. Procurador de Justiça Presente ao julgamento o Exmo. Dr Doriel Veloso Gouveia, João Pesso 1 de março de rcio Murilo da Cunha Ramos Desembargador 5

6 .. TRIBUNAL DE JUSTIÇA Coordenadoria Judiciária Registrado ema tp-f--/t~ 111