AMAZÔNICAS TRILHAS DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA. BRASIL e PARÁ PARA COMUNIDADES NAS FLORESTAS
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- Valentina Camarinho Capistrano
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1 TRILHAS DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA PARA COMUNIDADES NAS FLORESTAS AMAZÔNICAS 2ª Edição ATUALIZADA Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? BRASIL e PARÁ
2 TRILHAS DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA PARA COMUNIDADES NAS FLORESTAS AMAZÔNICAS Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? Katia O. Carvalheiro Girolamo D. Treccani Christiane Ehringhaus Pedro Alves Vieira Belém 2010 BRASIL e PARÁ
3 Trilhas da Regularização Fundiária para Comunidades nas Florestas Amazônicas Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? BRASIL e PARÁ 1ª edição: dezembro de , CIFOR e FASE 2ª edição: fevereiro de 2010 ISBN: Tiragem: exemplares Projeto Comunidades e Florestas Consórcio IMAZON - Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia CIFOR - Centro de Pesquisa Florestal Internacional FASE - Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil Colaboradores CDS - Comitê de Desenvolvimento Sustentável de Porto de Moz FAE Fórum de Articulação do Manejo Florestal Comunitário do Estuário Amazônico LASAT - Laboratório Sócio-Agronômico do Tocantins Execução CIM - Centro para Migração e Desenvolvimento Internacionais CIFOR FASE CDS Apoio Projeto BR-163: Floresta, Desenvolvimento e Partiipação GTZ Cooperação Técnica Alemã Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit (GTZ) GmbH União Européia FAO - Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação SFB - Serviço Florestal Brasileiro MMA - Ministério do Meio Ambiente Créditos Concepção de Projeto: Christiane Ehringhaus, Westphalen Nunes e Katia Carvalheiro Autores: Katia O. Carvalheiro, Girolamo D. Treccani, Christiane Ehringhaus e Pedro Alves Vieira Revisão Técnica: Paulo Roberto Vieira, Dilton Tapajós, Paulo Amaral, Westphalen Nunes, Jomabá Pinto Torres, Agostinho Tenório Filho e Carlos Augusto Ramos Revisão Gramatical: Glaucia Barreto Edição e Revisão Final: Katia Carvalheiro Desenhos: João Henrique Lopes de Souza e Christiane Ehringhaus Design Editorial e Diagramação: RL 2 Propaganda e Publicidade
4 APRESENTAÇÃO Na Amazônia, além da vasta riqueza e heterogeneidade em termos de fauna, flora, hidrografia, minerais, clima, encontra-se também uma diversidade de etnias e grupos sociais (índios, remanescentes de quilombo, seringueiros, castanheiros, babaçueiros, roceiros, vazanteiros, vaqueiros, pescadores e ribeirinhos) que são importantes segmentos de camponeses que dependem da floresta e de seus recursos naturais. Assim, devido às diferentes formas de apropriação e uso dos recursos naturais, foram sendo elaborados diversos mecanismos jurídicos para regularizar a situação fundiária dos diversos grupos sociais que precisam da terra e dos recursos naturais (principalmente a floresta e água) para sobreviver física e culturalmente. No Pará, onde a posse e a violência rural são elementos de acesso aos recursos naturais, a consolidação da propriedade rural passa a ser uma política importante de consolidação da democracia, do respeito aos direitos humanos e da proteção ambiental. A institucionalização da propriedade privada se constitui também em uma condição para a consolidação de um modelo democrático e participativo de distribuição e de gestão da terra e dos recursos naturais e, conseqüentemente, de proteção do meio ambiente. É dentro deste contexto que deve ser colocada a criação de assentamentos e o reconhecimento da posse das populações tradicionais. Na política de regularização fundiária, deve-se assegurar a pluralidade de concepções de propriedade, considerando a instituição de diferentes modalidades que favoreçam as variadas formas de acesso e de uso dos recursos naturais.
5 Com isso, objetiva-se diminuir a violência rural e o desrespeito aos direitos humanos, em assegurar o direito de propriedade aos diferentes segmentos sociais, em diminuir o desmatamento e em garantir a sustentabilidade ambiental. A importância do presente Manual sobre Regularização Fundiária está em ressaltar a lógica das etapas básicas a se seguir para a legalização do uso da terra e seus recursos, ajudando a compreender as diferentes categorias jurídicas para o reconhecimento dos direitos dos camponeses e das populações tradicionais. De forma clara e objetiva, explica cada uma delas, facilitando a compreensão e a reivindicação da sociedade civil. Desse modo, o Manual contribuirá na ampliação da cidadania e consolidação do processo democrático, especialmente por buscar instrumentalizar a luta pela terra, uma vez que possibilitará aos movimentos sociais que apresentem suas propostas de regularização fundiária, sabendo de antemão quais são os instrumentos jurídicos disponíveis para assegurar o direito à terra e a uma vida mais digna. Está de parabéns toda a equipe que elaborou o texto e produziu um material muito bem escrito. José Heder Benatti Advogado, doutor, professor de direito da Universidade Federal do Pará, pesquisador do CNPq e presidente do Instituto de Terras do Pará (ITERPA).
6 SIGLAS RELACIONADAS À REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA ADCT Ato das Disposições Constitucionais Transitórias APP Área de Preservação Permanente ARL Área de Reserva Legal AUAS Área para Uso Alternativo do Solo CAR-PA Cadastro Ambiental Rural (Estado do Pará) CCU Contrato de Concessão de Uso CDS Comitê de Desenvolvimento Sustentável de Porto de Moz CDRU Concessão de Direito Real de Uso CEPAF Conselho Estadual de Política Agrícola, Agrária e Fundiária CIFOR Centro Internacional de Pesquisa Florestal CIM Centro para Migração e Desenvolvimento Internacionais CNPT Centro Nacional das Populações Tradicionais (IBAMA/ICMBio) CNIR Cadastro Nacional de Imóveis Rurais DISAM Diretoria Sócio Ambiental, que era o antigo CNPT (IBAMA/ICMBio) FASE Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional FAO Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação FCP Fundação Cultural Palmares FLONA Floresta Nacional FLOTA Floresta Estadual FUNAI Fundação Nacional do Índio GRPU Gerência Regional do Patrimônio da União IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis ICMBio Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade IDEFLOR Instituto de Desenvolvimento FlorestaI IEB Instituto Internacional de Educação do Brasil
7 IMAZON Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ITERPA Instituto de Terras do Pará ITR Imposto Territorial Rural IDEFLOR Instituto de Desenvolvimento Florestal do Estado do Pará LAR Licenciamento Ambiental em Propriedade Rural na Amazônia LIO Licença de Instalação/Operação LP Licença Prévia MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário MMA Ministério do Meio Ambiente PAOF Plano Anual de Outorga Florestal PDA Plano de Desenvolvimento do Assentamento (INCRA) PDS Plano de Desenvolvimento Sustentável (ITERPA) PDS Projeto de Desenvolvimento Sustentável (INCRA) PEA Projeto de Exploração Anual (INCRA) PEAS Projeto Estadual de Assentamento Sustentável PEAEX Projeto Estadual de Assentamento Agroextrativista PEE Plano Ecológico Econômico PNRA Programa Nacional de Reforma Agrária PRA Plano de Recuperação do Assentamento (INCRA) PROA Pró-Assentamento Estadual (Pará) PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar RTID Relatório Técnico de Identificação e Delimitação SEJUDH Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Pará) SEMA Secretaria de Estado de Meio Ambiente SFB Serviço Florestal Brasileiro SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservação SPU Secretaria do Patrimônio da União TEQ Território Estadual Quilombola TRARL Termo de Averbação da Reserva Legal
8 Segunda edição do manual Nossa experiência com a primeira edição do manual, em dezembro de 2008, mostrou que as informações apresentadas no texto e o uso do pôster enriqueceram bastante as reuniões sobre o tema. Observamos comunitários e seus parceiros discutindo mais e entendendo melhor as vantagens e desvantagens das opções para a regularização fundiária, e isso os ajudou a tomar decisões conscientes, de acordo com seu interesse e sua realidade. O Manual foi muito bem aceito pelos comunitários, lideranças, técnicos do governo e de instituições de educação, pesquisa e extensão. E graças a esse sucesso, chegamos à segunda edição do Manual, atualizada e ampliada conforme as sugestões recebidas e mudanças nas leis. Esperamos que o Manual percorra muitas trilhas no Pará e na Amazônia!
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10 ÍNDICE Cordel da Regularização Fundiária Pra que este Manual? Porque é tão Importante Regularizar a Terra? Caminhos para Regularizar sua Terra PASSO 1: Essa Terra é de Quem? Fatos, Boatos e Mentiras: Qual Documento Vale? PASSO 2: Que Órgão do Governo Pode Documentar a Terra? PASSO 3: Individual ou Coletivo: Que História é Essa? PASSO 4: Título ou Concessão: Que História é Essa? Quem pode ser cliente da Reforma Agrária? PASSO 5: Quais as Modalidades de Regularização? Compra Doação Usucapião Terrenos de Marinha e Várzea RESEX Federal e Estadual Reserva Extrativista RDS Federal e Estadual Reserva de Desenvolvimento Sustentável FLONA - Floresta Nacional FLOTA - Floresta Estadual PAE Projeto de Assentamento Agro-Extrativista PDS Projeto de Assentamento Sustentável PAF Projeto de Assentamento Florestal PA Projeto de Assentamento Terras de Quilombo TEQ Território Estadual Quilombola PEAS Projeto Estadual de Assentamento Sustentável PEAEX Projeto Estadual de Assentamento Agro-Extrativista Passos Gerais para a Regularização da Terra Contatos Importantes As Leis Mais Importantes Pequeno Dicionário da Regularização Fundiária Conclusão Agradecimentos
11 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas CORDEL DA REGULARIZAÇÃO Ao abrir esta cartilha você vai querer saber, o rastro, o rumo, ou a trilha da conversa que vai ler. Por isso peço atenção ao senhor e à senhora que a REGULARIZAÇÃO é o nosso tema agora. Todos sabemos que a terra, apesar de ser enorme, é motivo de mil guerras tristeza disconforme. Mas o povo organizado começou a reclamar e agora tem um bocado de novidades no ar. Além, é claro, de tudo o que já existia antes. E não carece de estudo pra me entender, nesse instante vou explicar as maneiras para REGULARIZAR sua terra, e a primeira, se lembre, pode guardar, é a tal da DOAÇÃO, que pro Pará não tem mais, mesmo assim faço questão de não deixar para trás. E na segunda maneira de se regularizar, eles põem a terra à venda e você pode COMPRAR. Seguindo o mesmo argumento vamos para outra maneira, falo agora da terceira, PROJETO DE ASSENTAMENTO. Não perca o rumo, sem tombo, a quarta que vem agora, é a TERRA DE QUILOMBO. Em frente, sem fazer hora. Vou falar então da quinta maneira, mais um projeto de assentamento, um certo PROJETO AGRO-EXTRATIVISTA. SUSTENTÁVEL esse texto fala em DESENVOLVIMENTO, e o PDS é o sexto PROJETO que lhe apresento. Mas o sétimo PROJETO que agora vou relatar é o de ASSENTAMENTO FLORESTAL, tente lembrar. Pois a oitava que se avista a gente pode chamar, de RESERVA EXTRATIVISTA ou RESEX, pra encurtar. E não vá se encurralar, vamos dar a nona pista 10
12 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? pra se regularizar, RDS entra na lista, que é a RESERVA SUSTENTÁVEL e de DESENVOLVIMENTO. Se parece interminável Esta lista eu lamento, mas os TERRENOS da beira, DE VÁRZEA E DE MARINHA são a décima maneira da terra ser legalzinha. Chega o USUCAPIÃO, como a décima primeira luz pra documentação da terra, e a derradeira maneira, pois finda a lista da REGULARIZAÇÃO, mas o humilde cordelista pede ainda sua atenção pra dizer TOME CUIDADO NA HORA DE ESCOLHER o jeito mais adequado de o documento obter. Reúna a comunidade, para lutar em conjunto pela terra e com vontade defender os seus assuntos Pois se cada um quiser, se a luta for coletiva, e todo mundo fizer a sua parte efetiva logo vai se apresentar uma terra libertada, sem sangue, morte ou pesar, mas toda delimitada, com respeito e com ternura, pra pescar, plantar, colher, pra criançada correr e a vida ser mais segura. Agora, sim, me despeço, e agradeço a atenção dos que leram esses versos que fiz com dedicação. Autor: Paulo Vieira pauloforest@gmail.com 11
13 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas 1. PRA QUE ESTE MANUAL? Mesmo com as vitórias pelos direitos da terra das comunidades que vivem nas florestas e várzeas da Amazônia, o caminho para a regularização fundiária continua sendo bastante difícil de compreender e cheio de obstáculos. São tantas leis, tantos órgãos do governo, tantos documentos e coisas a se fazer, que até quem está acostumado a lidar com leis tem dificuldade de entender os chamados processos fundiários. O processo fundiário nada mais é do que a trilha que se precisa seguir até conseguir o documento final da terra. Nosso objetivo ao escrever este manual foi ajudar as milhares de famílias rurais a trilharem o caminho para a regularização com suas próprias pernas e no rumo certo. Para isso, apresentamos aqui informações sobre quais as melhores soluções para regularizar a terra e como chegar ao final dessa trilha. Isto inclui responder algumas dúvidas mais comuns sobre a melhor maneira de se fazer isso, como: Será que vou atrás dos documentos sozinho, ou vou junto com os moradores da minha comunidade e de comunidades vizinhas? Qual a diferença entre um título e uma concessão de uso? Qual a diferença entre uma Reserva e um Projeto de Assentamento? Vou poder vender a minha terra depois? Ao responder algumas dessas perguntas, fornecemos informações básicas e sugestões para se orientar neste mundo confuso de 12
14 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? instituições, documentos, leis, boatos, mentiras e algumas verdades. Também sugerimos os passos a se seguir na escolha dos caminhos para a regularização da terra. Além disso, apresentamos as diversas opções de regularização existentes para populações tradicionais a fim de facilitar o entendimento, a discussão, o aconselhamento, e a tomada de decisão. É importante entender que esses diferentes tipos de regularização foram sendo construídas conforme as necessidades. Porém, pode acontecer que ainda não exista um tipo que se encaixe na sua realidade e, por isso, ainda precisa ser criado ou adaptado. Vamos ser sinceros: ter o documento da terra é muito importante, pois é o pé dentro do sistema de direitos pela terra. Mas, apesar de ser um grande passo, não quer dizer que todos os problemas foram resolvidos. Por exemplo, ter o documento da terra não significa que a pessoa vai logo receber uma renda melhor e ser atendida pelo governo com os serviços públicos. Dependendo da situação, a documentação da terra pode não resultar no fim dos conflitos ou até diminuir a possibilidade de uso da floresta, lagos e rios. Pois é... a luta pela qualidade de vida no interior da Amazônia é grande. Para viver bem em suas terras, as famílias também precisam de moradia boa, saúde, educação, luz, transporte, incentivos à produção e venda de seus produtos, apoio ao uso tradicional de suas florestas, rios e lagos, entre outros. Gente, este Manual foi pensado especialmente para a realidade do Estado do Pará, mas esperamos que as pessoas de outros Estados também possam utilizar estas informações nas lutas pela segurança em suas terras. Boa caminhada nas trilhas da regularização fundiária!!! 13
15 Sem a regularização da terra os produtores e a mata correm muitos perigos...
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17 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas 2. PORQUE É TÃO IMPORTANTE REGULARIZAR A TERRA? Sem o documento da terra, o risco é que sua posse fique que nem banana madura na beira da estrada; quem passa quer levar porque acha que não tem dono. Isso pode acontecer com suas caças, suas árvores, seus frutos, seus peixes, a água e mesmo com a terra. Dessa forma, fica difícil provar quem tem o direito de usar esses bens, o que acaba resultando em conflitos. Nas comunidades rurais da Amazônia as famílias correm vários riscos, que ficam mais difíceis de serem evitados quando elas não possuem o documento da terra. Pode acontecer das famílias: Terem suas terras invadidas por madeireiros, fazendeiros, geleiras e outros querendo tirar o que não lhes é de direito; Terem sua mata quebrada pela entrada de madeireiros com balsa e trator; Terem sua mata engolida pelos pastos muito grandes; Perderem a caça porque a mata foi derrubada ou a caça se espantou com a zoada dos madeireiros na floresta; Serem expulsas da terra por algum espertinho que quer tomá-la de vocês, correndo, às vezes, até perigo de morte. Serem proibidas de usar a floresta por um fazendeiro e seus pistoleiros, ficando sem poder caçar, quebrar castanha, tirar cipó; Terem que usar produtos da floresta com medo das autoridades, não sabendo se serão multadas ou mesmo presas; Brigarem com os vizinhos por causa dos limites da terra; Não poderem ter Planos de Manejo Florestal aprovados; Terem grande dificuldade de planejar o uso da floresta e dos rios para seus filhos e netos. 16
18 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? Com a regularização da terra é mais fácil combater e até evitar esses riscos, pois as famílias: Têm mais apoio para impedir a invasão de madeireiros, fazendeiros, geleiras e outros invasores; Têm mais oportunidades para conseguirem autorização pra manejar a floresta e conseguirem a certificação do manejo; Têm mais facilidade para receber benefícios sociais como créditos, aposentadoria e outros benefícios da previdência social; Vivem mais sossegadas, sabendo que terão um lugar para elas, seus filhos e netos produzirem sua comida e viverem sua vida. 17
19 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas 3. CAMINHOS PARA REGULARIZAR SUA TERRA Existem várias possibilidades para se obter a documentação da terra, cada uma com suas diferenças, vantagens e dificuldades. É importante conhecer essas diferenças para poder decidir qual a melhor forma de regularização para a sua situação ou de sua comunidade. Aqui vamos descrever 18 tipos diferentes de regularização, que vão do individual (uma pessoa) ao coletivo (várias pessoas), do título de propriedade à concessão de uso, do estadual ao federal, da terra firme à várzea. A esses diferentes tipos de regularização chamaremos de MODALIDADES DE REGULARIZAÇÃO. Cada uma será apresentada para que você identifique qual a melhor MODALIDADE para a sua terra ou de sua comunidade. Para conseguir identificar qual a melhor solução para regularizar sua terra, é preciso seguir alguns PASSOS. Vamos falar sobre eles? 18
20 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? PASSO 1 - ESSA TERRA É DE QUEM? A PRIMEIRA COISA é saber de quem é a terra que vocês ocupam, se é PÚBLICA ou PARTICULAR. Chamamos de TERRA PÚBLICA àquela que pertence a toda a SOCIEDADE, mas que é administrada pelo GOVERNO. Existem três tipos de TERRA PÚBLICA: TERRA PÚBLICA da União, que é administrada pelo Governo Federal; TERRA PÚBLICA do Estado, que é administrada pelo Governo Estadual; e TERRA PÚBLICA do Município, que é administrada pelo Governo municipal. Mas neste Manual não vamos falar sobre estas. Saber a ORIGEM DA TERRA que vocês ocupam é necessário para indicar em que portas vocês terão que bater e as modalidades de regularização que vão poder escolher. Por exemplo, se for terra pública da 19
21 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas União, vocês terão que ir atrás do INCRA ou da SPU; mas se for terra pública Estado do Pará, deve-se ir ao ITERPA. Os significados das siglas desses órgãos estão explicados nas páginas 31 à 34. Toda terra pública pode ser devoluta ou arrecadada. TERRA PÚBLI- CA DEVOLUTA é a terra que ainda não foi devidamente identificada, demarcada e registrada no cartório pelo órgão do governo. TERRA PÚ- BLICA ARRECADADA é a terra já registrada no cartório pelo órgão do governo. Esta diferença é importante, pois o governo só vai entregar documentos da terra que já foi arrecadada. Se você ocupa uma terra pública e quer saber se ela é devoluta ou arrecadada você deve procurar o cartório de registro de imóveis da comarca, ou os escritórios do ITERPA, do INCRA ou da SPU. Além da terra pública, também existe a terra PARTICULAR, que é aquela que pertence a um fazendeiro, a uma empresa, ou a outro particular. Para fazer a Reforma Agrária, o governo federal pode tornar uma terra particular em terra pública de duas maneiras: pela desapropriação por interesse social ou pela compra. Nós vamos usar o desenho de uma árvore como guia, que chamaremos de ÁRVORE-GUIA. Com ela vamos aprender algumas das diferenças mais importantes entre as diferentes formas de regularizar a terra. 20
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23 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas FATOS, BOATOS E MENTIRAS: QUAL DOCUMENTO VALE? Durante toda a história do Brasil, houve diferentes tipos de documentos e papéis ligados com a posse da terra. São tantos, que muitas pessoas ficam sem saber a verdadeira validade que um documento tem. E complica mais quando entendemos que nem todos os documentos garantem o direito da terra. Esses documentos serão apresentados nas páginas seguintes. Para ajudar a esclarecer, vamos resumir os TIPOS DE DOCUMENTOS da terra em 3 GRANDES CASOS: 22
24 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? É importante examinar cada caso e cada documento para entender em qual situação vocês estão. No CASO 1, a pessoa ou associação tem um papel que é VERDA- DEIRO e VALE como prova de documento da terra. Neste caso, a questão da documentação da terra já está resolvida. Os documentos que VALEM como documento da terra são os seguintes: a) Título Definitivo de Propriedade - Documento que tem validade definitiva e dá ao dono o direito do uso e venda da propriedade. Se a terra foi regularizada pelo Programa Nacional de Reforma Agrária, só poderá ser vendida depois de 10 anos e se tiver cumprido a sua Função Social (ver página 112 para saber sobre Função Social da Propriedade). Pode ficar de herança. b) Título de Reconhecimento de Domínio Quilombola - Documento que tem validade definitiva e dá aos moradores reunidos pela Associação o direito de propriedade. Essa terra não pode ser vendida ou subdividida, mas as próximas gerações, filhos, netos, bisnetos, terão os mesmos direitos dos atuais quilombolas. 23
25 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas c) Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) - Documento que tem validade pelo tempo que diz no contrato assinado pelo Poder Público Federal ou Estadual junto com a Associação que representa os moradores. Em alguns casos, podem existir contratos assinados entre o governo e as famílias. Essa validade pode ser renovada ou então pode ter validade indeterminada, quer dizer, para sempre. Depende do contrato. Esse documento dá o direito de uso sobre a terra e seus bens naturais. Não dá direito de vender a terra. Os herdeiros das famílias podem continuar a usar as terras, desde que cumpram as regras do contrato. Por isso, o contrato é muito importante para poder acordar como será o uso da terra, pra garantir quanto tempo as famílias terão de uso dessa terra e também como esse tempo pode ser renovado no futuro. d) Contrato de Concessão de Uso (CCU) - Documento utilizado pelo Governo Federal para entregar a um produtor (tipo individual) ou a vários comunitários (tipo coletivo) os direitos de uso de uma terra e seus recursos naturais. As condições de concessão e tempo de validade dependem de contrato. Na regularização através de projetos de assentamento, o INCRA entrega para as famílias primeiro o CCU. Quando as exigências do CCU são cumpridas, as famílias recebem o título definitivo. e) Autorização de Uso. Têm duas possibilidades: e.1) Autorização de Uso feita pelo Poder Público - Permite explorar os recursos naturais de uma terra. Esses recursos podem ser açaí, frutos, madeira ou outro. Essas autorizações são feitas pelo governo, podendo ser para um grupo de famílias ou para cada família separadamente. São feitas para situações de transição, enquanto a solução definitiva não ocorre. 24
26 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? e.2) Autorização de Uso feita pela Associação - É o documento que a Associação faz depois de ter assinado com o governo o Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU). A Associação tem que seguir as regras previstas no Contrato e cuidar para que cada família também siga essas mesmas regras. Por isso, antes de assinar o contrato, a Associação tem que garantir que as regras do contrato estejam de acordo com os interesses das famílias que fazem parte da Associação. E isso tem que ser feito com muita conversa e reunião, para que todos estejam bem esclarecidos e que cada pessoa tenha compromisso pelo que foi acordado. No CASO 2, a pessoa ou associação tem um documento que é VERDADEIRO, mas que NÃO VALE como prova de documento da terra. Muitas famílias ficam decepcionadas por descobrirem que possuem documentos errados. Por isso é importante saber QUAIS OS DOCUMENTOS QUE NÃO VALEM como documento da terra. Os documentos que NÃO VALEM como documento da terra são: a) Cadastro de terra no INCRA Cadastro Nacional de Imóveis Rurais - CNIR e o Cadastro Ambiental Rural CAR: os governos federal e estadual exigem o cadastro de todas as pessoas que ocupam uma terra, sendo proprietário ou não. Fazer um destes cadastros é obrigatório, mas isso NÃO PROVA QUE A PESSOA TENHA DIREITOS SOBRE A TERRA. 25
27 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas b) Protocolo num Escritório do Governo: é um papel que comprova que uma pessoa entregou informações num escritório do governo, que pode ser o ITERPA, ou o INCRA, ou o IBAMA, ou o Ministério Público, pedindo que a terra seja regularizada em seu nome ou em nome de uma empresa ou associação. O governo dá um comprovante de recebimento, o chamado protocolo, que somente significa que o documento foi entregue. NÃO TEM VALIDADE COMO DOCUMENTO DE PROPRIEDADE DA TERRA. c) Comprovante de Pagamento de Imposto Territorial Rural ITR: é um documento feito pela Receita Federal que comprova que o imposto da terra foi pago. Mas o ITR NÃO TEM NENHUMA VALIDADE COMO DOCUMENTO DE PROPRIEDADE DA TERRA. Acontece que esse imposto é obrigatório para todos os que são proprietários ou ocupam um imóvel rural. d) Escritura Pública no Cartório: é a autenticação de um documento que foi apresentado ao cartório. A autenticação quer dizer que este documento foi registrado no cartório. A escritura pública em si NÃO DÁ NENHUM DIREITO SOBRE A TERRA, mesmo que esteja carimbada pelo cartório. 26
28 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? e) Autorização de Detenção de Imóvel Público ADIP: era um documento que dava a uma pessoa ou empresa o direito de usar os recursos naturais, como a madeira, de uma terra pública, por um tempo certo, que podia ser renovado conforme o contrato. NÃO TINHA VALI- DADE COMO DOCUMENTO DA TERRA. Por lei, este documento pode ou não ser transformado em Contrato de Transição. f) Contrato de Transição: é um documento que permite a uma pessoa ou empresa manejar a floresta de uma terra pública de forma sustentável. Isso só é possível depois que o Plano de Manejo Florestal tenha sido aprovado na SEMA ou IBAMA. NÃO TEM VALIDADE COMO DO- CUMENTO DA TERRA. g) Contrato de Concessão Florestal: é um documento que permite a uma empresa ou associação manejar a floresta de uma terra pública, seguindo as regras de uso que estão no contrato, e é válido pelo tempo que diz nele. IMPORTANTE: Não poderá ser feito em áreas de floresta onde as populações rurais vivem ou retiram seus produtos. NÃO TEM VALIDADE COMO DOCUMENTO DA TERRA. 27
29 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas No CASO 3, a pessoa tem um papel que É FALSO. Mesmo que pareça valer alguma coisa, este documento não vale para nada, a não ser servir como prova de CRIME. Mas como dá pra saber quando um título é falso? Não é fácil saber se um título é falso ou não. Só pessoas com conhecimento na área agrária e de cartografia podem ter clareza se o documento não foi assinado por um falsário, ou perceber se o registro foi realizado legalmente. Outra forma de tentar saber é verificando no documento se o local em que diz onde a terra fica está correto. Quando estes erros são feitos com intenção de enganar, chamamos isso de Grilagem de terra. Mas nem sempre é má fé, porque também podem acontecer erros por falta de informação, ou por acreditar só no papel, sem ir conhecer a realidade. Os ERROS mais comuns que podem ocorrer num TÍTULO FALSO são: a) A localização da terra é confusa: a localização da terra num documento falso pode dar bem em cima de outra terra que já estava documentada; b) O documento não diz onde a terra fica; 28 c) O órgão do governo não é o correto: por exemplo, a terra se localiza numa região administrada pelo INCRA, mas no papel está ITERPA. Neste caso, o documento só vale se o ITERPA reconhecer formalmente o título; mas sem este reconhecimento, o documento não vale.
30 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? PASSO 2 - QUE ÓRGÃO DO GOVERNO PODE DOCUMENTAR A TERRA? Há diferentes órgãos que cuidam da documentação e administração das terras. Buscar o órgão errado pode resultar em meses ou até anos de espera em filas compridas, sem conseguir nada. Mas COMO SABER QUAL O ÓRGÃO CERTO? Tudo depende de saber ONDE A TERRA SE LOCALIZA: se for terra do Estado, o responsável é o Governo do Estado; se a terra for da União, então o responsável é o Governo Federal; e se estiver localizada em ilhas e várzeas, a responsabilidade é da SPU. 29
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32 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? A seguir apresentamos os órgãos federais e estaduais que podem e os que não podem documentar terras. Cada órgão tem suas regras e suas responsabilidades. Vamos conhecê-las um pouco: GOVERNO FEDERAL GOVERNO DO ES- TADO ÓRGÃO PODE DOCUMENTAR? TIPO DE DOCUMENTO INCRA SIM Título, CDRU, CCU SPU SIM Título, CDRU ICMBio SIM CDRU IBAMA NÃO - FUNAI NÃO - FCPalmares NÃO - SFB NÃO - ITERPA SIM Título, CDRU SEMA SIM CDRU EMATER NÃO - IDEFLOR NÃO - CDRU = Concessão de Direito Real de Uso CCU = Contrato de Concessão de Uso ÓRGÃOS FEDERAIS QUE PODEM DOCUMENTAR 1. INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária: é um órgão ligado diretamente ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Este instituto tem a responsabilidade de ADMINISTRAR E DESTINAR AS TERRAS que foram desapropriadas para o Programa Nacional de Reforma Agrária e as que passaram a fazer parte do patrimônio público federal por meio de arrecadação, como aquelas que estão nas margens de algumas rodovias federais (as BRs), contando 100 quilômetros para cada lado, que ainda não foram transferidas a particulares, e também as terras que se localizam na faixa de fronteira. O INCRA tem também outra função, que é a de ORGANIZAR O CADASTRO de todas as terras, sejam elas tituladas ou não, sejam terras federais ou estaduais. 31
33 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas 2. SPU Secretaria de Patrimônio da União: é ligada ao Ministério de Orçamento, Planejamento e Gestão e REGULARIZA e ADMINISTRA as ILHAS e VÁRZEAS federais, as terras que estão nas margens dos rios que estão sob a influência das MARÉS e os terrenos nas margens dos rios navegáveis. Como atualmente a SPU e o INCRA possuem um Termo de Cooperação, a ação de regularização dessas áreas é feita em conjunto. O escritório da SPU em cada estado se chama Superintendência Estadual do Patrimônio da União. 3. ICMBio Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade: foi criado em 2007, quando houve a divisão do IBAMA. É responsável pelas chamadas UNIDADES DE CONSERVAÇÃO, sendo do interesse deste Manual apenas as Reservas Extrativistas (RESEX), as Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e as Florestas Nacionais (FLONA). O trabalho do ICMBio é RECEBER OS DOCUMENTOS com a solicitação da criação da Unidade de Conservação, REALIZAR OS ESTUDOS necessários na área e encaminhar todos os documentos para a Casa Civil, para que o Presidente do Brasil assine o decreto de criação. Depois que a Unidade de Conservação está decretada, o ICMBio passa a ter responsabilidade de APOIAR A ASSOCIAÇÃO na administração e promoção do desenvolvimento sustentável da Unidade de Conservação. O ICMBio é também responsável pelas atividades de comando, controle e monitoramento das Unidades de Conservação. O Contrato de Direito Real de Uso (CDRU) é assinado entre o ICMBio e a Associação representante dos moradores. ÓRGÃOS FEDERAIS QUE NÃO PODEM DOCUMENTAR 1. IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis: é um órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente. Ao contrário do que muitos pensam o IBAMA NÃO TEM NENHUMA responsabilidade sobre a REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA. Uma das res- 32
34 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? ponsabilidades do IBAMA é de cuidar para que as leis ambientais sejam cumpridas, monitorando e fiscalizando o uso do meio ambiente. 2. FUNAI Fundação Nacional do Índio: este é um órgão ligado ao Ministério da Justiça, que tem a tarefa de IDENTIFICAR, DEMARCAR e ADMINISTRAR as terras ocupadas por Populações Indígenas. 3. FCP Fundação Cultural Palmares: é um órgão ligado ao Ministério da Cultura, que é responsável por acompanhar os processos de RECONHECIMENTO DE DOMÍNIO das terras ocupadas pelos Remanescentes das Comunidades de Quilombos e apoiar as ações de valorização da cultura afro-brasileira. Esta Fundação emite uma Certidão de Registro no Cadastro Geral de Remanescentes de Comunidades de Quilombos. 4. SFB Serviço Florestal Brasileiro : é o órgão do governo federal que atua na gestão das florestas públicas, apoiando programas de treinamento, pesquisa e assistência técnica para o manejo da floresta. É também o órgão responsável pelas CONCESSÕES FLORESTAIS. ÓRGÃOS ESTADUAIS QUE PODEM DOCUMENTAR 1. ITERPA Instituto de Terras do Pará: cada Estado do Brasil tem suas leis que dizem como será feita a titulação ou concessão das suas terras. Cada Estado tem um órgão que cuida desta questão. No Estado do Pará é o ITERPA que é o RESPONSÁVEL PELA DOCUMENTAÇÃO DAS TERRAS ESTADUAIS. No caso paraense, a lei permite a doação, venda e concessão das terras públicas estaduais. O ITERPA adotou recentemente a política de VARREDURA FUNDIÁRIA, que é a regularização fundiária de todo um município ou região, regularizando todas as terras que estejam de acordo com as exigências da lei. Nesta varredura a legetimação da ocupação familiar é uma prioridade. 33
35 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas 2. SEMA Secretaria de Estado de Meio Ambiente: cada Estado tem uma secretaria ambiental. No Pará é a SEMA a responsável pelas UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO ESTADO. Para os que moram na floresta, as modalidades de interesse são Reservas Extrativistas ou RESEX Estaduais; Reservas de Desenvolvimento Sustentável ou RDS Estaduais; e Florestas Estaduais ou FLOTA. O Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) para essas terras é assinado entre a SEMA e a Associação que representa os moradores. A SEMA também é responsável pelo Cadastro Ambiental Rural, o CAR, pela aprovação do Licenciamento Ambiental Rural, o LAR, que toda terra tem que ter, e também por licenciar as atividades de manejo dos recursos florestais. A partir da nova legislação estadual de alienação de terras públicas (ver página 110), todos os que quiserem regularizar a terra que ocupam devem fazer o CAR. ÓRGÃOS ESTADUAIS QUE NÃO PODEM DOCUMENTAR 3. EMATER - Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural dos governos estaduais: NÃO TEM RESPONSABILIDADE DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA em si, mas pode ser PARCEIRA das Associações na elaboração dos diagnósticos e dos Planos de Desenvolvimento ou Planos de Recuperação dos Projetos Estaduais de Assentamento, que são documentos necessários para se ter o licenciamento ambiental dessas terras. 4. IDEFLOR Instituto Florestal do Pará: é o responsável pela política florestal do Estado; pela assistência técnica no manejo dos produtos da floresta; pela concessão de florestas estaduais; e pela administração do Fundo Florestal. O IDEFLOR NÃO tem responsabilidades de REGULARIZAÇÃO DAS TERRAS. 34
36 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? PASSO 3 - INDIVIDUAL E COLETIVO: QUE HISTÓRIA É ESSA? Depois de saber de quem é a terra e qual o órgão do governo procurar para documentá-la, é hora de dar o TERCEIRO GRANDE PASSO: decidir se quer a regularização da terra do tipo individual ou coletiva. Mas qual a diferença? Quais as vantagens de cada uma? A principal diferença entre a regularização individual e coletiva é que, quando é individual, o governo dá um documento para cada família. 35
37 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas Quando a regularização é coletiva, o governo dá um só documento pra associação e a associação dá um documento pra cada família, o que acaba sendo mais rápido e com menos custos pro governo. O tipo individual pode ser feito por uma só pessoa ou por várias pessoas de uma região ou comunidade. No tipo individual feito por UMA SÓ PESSOA, ela faz todo o processo de regularização sozinha. Em geral, esta é a forma mais DEMORADA e MAIS CARA, pois o governo dá prioridade para regularização de comunidades e também porque a pessoa tem que pagar todos os estudos de mapeamento e todas as taxas. O tipo individual pode também ser feito para um grupo de várias famílias de uma ou mais COMUNIDADES, através de uma associação. Neste caso, é pedido ao governo que a documentação seja individual, como é o caso dos Projetos de Assentamento (PA) e os Projetos Estaduais de Assentamento Sustentável (PEAS). 36
38 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? Na REGULARIZAÇÃO DE COMUNIDADES, um grupo de famílias que vive em comunidade pode escolher fazer a regularização do tipo individual ou coletiva. SEMPRE TERÃO QUE ESTAR ORGANIZADAS EM ASSOCIAÇÃO. A associação representará as famílias para fazer o cadastro com o governo, e só as famílias que tiverem com o cadastro aprovado pelo governo terão direito à terra, créditos e fomentos (veja página 42 para saber as condições de ser cliente da reforma agrária). Na regularização de comunidades do tipo INDIVIDUAL, a terra é dividida em lotes, sendo um lote para cada família, contendo as suas áreas de moradia, de plantio, de pasto e de florestas. O governo sempre precisa saber quanto tem de floresta, pasto, roça, como são as condições dos rios e nascentes, através de estudos. No individual, os técnicos do governo precisam fazer todos os estudos e processos para cada lote. E isso é mais DEMORADO e CUSTA MAIS do que no coletivo. Outra desvantagem é que o TAMANHO DA TERRA será de no máximo 100 HECTARES para cada família e nem sempre vai ter grandes áreas de floresta e rios. Quando a regularização individual é feita pelo INCRA, primeiro é assinado um Contrato de Concessão de Uso (CCU). Depois que foram cumpridas as obrigações escrita no Contrato, poderá ser emitido o título definitivo. 37
39 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas Na regularização COLETIVA, a associação que representa as famílias pede ao governo o direito à terra de todos os seus associados. Neste pedido, a associação explica onde fica a divisa deles com os vizinhos de fora, SEM PRECISAR MOSTRAR OS LIMITES DA TERRA ENTRE CADA FA- MÍLIA. Os técnicos do governo vão medir só as extremas das terras com os vizinhos que são de fora do Projeto de Assentamento ou da Reserva que vai ser criada. Os limites entre as terras de cada família e entre as florestas de uso coletivo são acordados entre as próprias famílias conforme as regras locais de respeito. Estes LIMITES DE RESPEITO são discutidos e aprovados entre as famílias e a associação, e depois informados ao governo. Como o governo faz o mapeamento do limite total das terras e não faz o mapeamento de cada família, esse estudo sai MAIS RÁPIDO e MAIS BARATO. E por isso a criação de um Projeto de Assentamento coletivo ou de uma Reserva pode ser um pouco mais rápido, o que é uma vantagem do tipo coletivo sobre o tipo individual. 38
40 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? Na regularização COLETIVA, cada família pode ter a RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL por suas ações, como acontece no caso da regularização individual. Por exemplo, se um comunitário cometer um desmatamento criminoso, ele vai pagar pelo crime sozinho e não todos os sócios da Associação. Mas para isso acontecer, DEVE ESTAR NO ESTATUTO DA ASSOCIAÇÃO escrito que cada associado é responsável por suas ações individuais. Outra vantagem do tipo coletivo é que toda a terra usada pelas famílias pode ser pedida na regularização, incluindo as florestas onde caçam, retiram frutos, cipós, madeira e qualquer produto da floresta. Nos casos de populações como ribeirinhos, seringueiros, quilombolas, quebradoras de coco, extrativistas, todas as áreas de floresta utilizadas em seu trabalho devem fazer parte dos seus direitos e por isso NÃO TEM A REGRA DE TAMANHO MÁXIMO DA TERRA. O tamanho da terra será toda a área UTILIZADA PELAS FAMÍLIAS nas atividades de produção, criação e de extrativismo. Para saber direitinho onde toda essa terra se localiza, as famílias precisam fazer o MAPEAMENTO PARTICIPATIVO, com o apoio dos técnicos do governo ou outros que as famílias confiem (veja página 97 para saber mais sobre Mapeamento Participativo). A regularização COLETIVA NÃO QUER DIZER QUE TODO O USO DA TERRA SERÁ COLETIVO! As famílias vão continuar tendo sua área de moradia, de roça, de plantios, de pasto e de floresta, como tinham antes da regularização. Esses limites serão respeitados, conforme o respeito que já havia entre as famílias. Por isso é chamado de LIMITE DE RESPEITO. O que será coletivo serão as terras que as famílias já usavam coletivamente, como as florestas para caçar e fazer o extrativismo. É claro que as famílias podem querer fazer áreas coletivas para plantios, pastagem, mas isso tem que ser conversado e aceito pela maioria das famílias e pela associação. 39
41 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas PASSO 4 - TÍTULO OU CONCESSÃO: QUE HISTÓRIA É ESSA? Existem dois tipos principais de documentos da terra: o TÍTULO e a CONCESSÃO. Título: Uma família sozinha pode receber um TÍTULO INDIVIDUAL de propriedade através de modalidades INDIVIDUAIS. Com esse Título, após cumprir o tempo necessário por lei e a função social da propriedade, a pessoa se quiser pode VENDER sua terra. Mas preste bem atenção: a pessoa que vender a terra NUNCA MAIS poderá receber doação de terras do governo. É que as terras para reforma agrária são doadas somente uma vez, tanto faz se pela modalidade individual ou coletiva. A única modalidade que tem TÍTULO COLETIVO é a dos Territórios QUILOMBOLAS. 40
42 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? Concessão: A palavra CONCESSÃO vem da palavra CONCEDER. E como estamos falando de terra, concessão de uso significa CONCEDER DIREITOS DE USAR A TERRA E SEUS RECURSOS NATURAIS. Na regularização de terras, a Concessão ocorre em algumas modalidades individuais, como nos Terrenos de Marinha e Várzea, e em QUA- SE TODAS as modalidades COLETIVAS. A mais usada é a CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO, ou simplesmente CDRU. O governo (Estado ou União) permanece com o domínio de propriedade da terra, mas concede seu uso pelo TEMPO acordado no CONTRATO que vai ser feito entre o governo e a família ou Associação que representa os moradores. Com esse Contrato, a família recebe uma autorização para viver naquela terra, podendo morar e usar os seus recursos naturais. Esse sistema de CONCESSÃO das terras para populações tradicionais nasceu da luta dos movimentos sociais, para que se respeitassem os modos de vida das famílias da Amazônia. Assim, a CONCESSÃO serve também para proteger os direitos das comunidades tradicionais e se evitar o comércio das terras da regularização fundiária.as próprias lideranças do movimento social têm lutado para que as terras conquistadas para a agricultura familiar continuem nas mãos das famílias e não sejam vendidas para fazendeiros, que na maioria das vezes nem moram na terra e não participam da comunidade. 41
43 Trilhas da Regularização Fundiária para Populações nas Florestas Amazônicas QUEM PODE SER CLIENTE DA REFORMA AGRÁRIA? A família só poderá ser atendida pelos programas de reforma agrária do governo, que incluem todos os Projetos de Assentamento e as Unidades de Conservação de Uso Sustentável, se as pessoas que querem a terra puderem ser classificadas como CLIENTES DA REFORMA AGRÁRIA. Para ser CLIENTE DE REFORMA AGRÁRIA, tem que: Ser família de baixa renda; Não possuir outra propriedade rural; Estar morando na terra; Praticar o cultivo de lavoura e extrativismo; Não ter sido beneficiado antes pela reforma agrária; Não ser funcionário público; Quando uma família beneficiada pela reforma agrária vende essa terra, não pode mais participar do Programa Nacional de Reforma Agrária, pois o governo doa terra para a família UMA SÓ VEZ. Depois disso, só comprando. POVOS e COMUNIDADES TRADICIONAIS habitantes das Reservas Extrativistas, Reservas de Desenvolvimento Sustentável e Florestas Nacionais, podem ser beneficiários do Programa Nacional de Reforma Agrária, o PNRA. Isto significa que eles poderão ACESSAR CRÉDITOS do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, o PRONAF. Agricultores Familiares e Povos e Comunidades Tradicionais em ASSENTAMENTOS ESTADUAIS são reconhecidos pelo INCRA como beneficiários do Plano Nacional de Reforma Agrária, e podem ser beneficiados com os mesmos CRÉDITOS, ASSISTÊNCIA TÉCNICA e INFRAESTRUTURA que o INCRA garante aos demais assentados. 42
44 Como decidir qual a melhor solução para regularizar sua terra? PASSO 5: QUAIS AS MODALIDADES DE REGULARIZAÇÃO? Agora vamos mostrar as MODALIDADES DE REGULARIZAÇÃO FUNDI- ÁRIA. Modalidade quer dizer TIPOS ou MANEIRAS DE DOCUMENTAR A TERRA que podem ser acessadas por comunidades tradicionais e por agricultores familiares. Elas são várias!! Como orientação, vamos usar a nossa ÁRVORE-GUIA, que aparece na próxima página, com todas as 18 modalidades que vamos conhecer. Vamos começar da mesma maneira que a gente começa quando sobe numa árvore, se agarrando no galho mais baixo. Em nossa árvore-guia começaremos então por onde está escrito: TERRAS PARTICULARES. 43
45 44
46 COMPRA COMPRA A COMPRA é uma forma individual de se conseguir a terra. Podem ser de dois tipos: a compra de TERRAS PARTICULARES ou a compra de TERRAS PÚBLICAS ESTADUAIS OU FEDERAIS. COMPRA DE TERRAS PARTICULARES Quem já possui um documento válido de propriedade (um TÍTULO) pode vender sua terra à outra pessoa. Tem que prestar atenção, pois as terras com preço maior do que 30 vezes o salário mínimo só podem ser passadas para outro dono através de escritura pública. Outro cuidado: se a pessoa recebeu o documento de propriedade da terra através de um projeto de REFORMA AGRÁRIA ou de DOAÇÃO, ela só poderá VENDER essa terra depois do prazo determinado pela lei, conforme o caso, e se a terra tiver cumprido sua Função Social (ver página 112). Esta venda deverá ser realizada no Cartório de Registros de Imóveis, após o pagamento dos impostos de transmissão. É importante saber que nesta modalidade, o dono tem que pagar todos os custos do LICENCIAMENTO AMBIENTAL e de demarcação da terra com GEOREFERENCIAMEN- TO/Mapeamento, e pagar pelo registro da RESERVA LEGAL e por todos os impostos necessários. E isso pode ser bem CARO. COMPRA DE TERRAS PÚBLICAS Há dois tipos de Terras Públicas que podem ser compradas: Terras Públicas Estaduais e Terras Públicas Federais. Estas duas modalidades de acesso à propriedade da terra só podem ser feitas por PESSOAS FÍSICAS, isto é não podem ser pedidas por associações ou empresas. Só podem pedir este benefício aqueles que têm como principal atividade 45
47 COMPRA a agricultura, a agroindústria, o extrativismo, o manejo florestal ou a pesca. A lei determina que NÃO PODEM ser legitimadas, regularizadas ou licitadas as posses que se localizem em: 1. Áreas protegidas por lei; 2. Áreas ocupadas ou requisitadas por comunidades quilombolas; e 3. Áreas ocupadas ou requisitadas por comunidades tradicionais (ver pg 111 para conceito de comunidade tradicional). COMPRA DE TERRAS PÚBLICAS ESTADUAIS Quando alguém estiver ocupando um imóvel localizado em áreas administradas pelo Estado, poderá regulamentar a terra através de título ou Concessão Real de Direito de Uso (CDRU), individual ou coletiva. Para que possa ser feita a regulamentação em terra pública estadual, é preciso que: A terra não seja ocupada ou em processo de regularização por povos e comunidades tradicionais; Não haja conflitos pela terra; Não sejam terras destinadas para Concessão Florestal. No processo para titulação da terra, esta será comprada pelo preço de mercado, e poderá ser paga em até 10 anos. O comprador pagará as despesas da vistoria feita pelo governo. A VENDA poderá ser realizada após 10 anos ou antes, se o comprador tiver pago todas as parcelas devidas ao governo; se a terra tiver cumprido sua função social (ver página 112); se tiver cumprido as obrigações trabalhistas com seus empregados. No Contrato de Concessão Real de Direito de Uso (CDRU), a terra NÃO pode ser VENDIDA, a não ser que se obtenha autorização do ITER- 46
48 COMPRA PA. O Contrato terá VALIDADE de pelo menos 10 anos ou indeterminado (para sempre), podendo ficar de herança. O governo cobrará uma TAXA ANUAL DE OCUPAÇÃO DE TERRAS PÚ- BLICAS ESTADUAIS, conforme o valor da terra. As famílias com terras de no máximo 100 hectares NÃO pagarão essa taxa de ocupação. Regras básicas para compra, de acordo com o tamanho da terra: Até 500 hectares: o ITERPA terá que ouvir o Conselho Estadual de Política Agrícola, Agrária e Fundiária (CEPAF). De 500 a hectares: precisa da aprovação de um plano de exploração econômica pelo CEPAF. De até hectares: além da aprovação do CEPAF depende também da aprovação da Assembléia Legislativa do Estado; Para obter terras públicas estaduais acima de 100 hectares, o interessado tem que apresentar um Plano de Exploração Econômica. O Decreto que trará mais informações sobre a compra das terras públicas estaduais será lançado em breve. Para acompanhar este processo, visite o endereço eletrônico na INTERNET: COMPRA DE TERRAS PÚBLICAS FEDERAIS Em junho de 2009 foi criado o Programa Terra Legal Amazônia, com novas regras que facilitam a regularização das terras da União com tamanho máximo de 15 módulos fiscais (ver página 113 para saber o que é o Módulo Fiscal). Nesta terra que se quer regularizar, não pode haver conflitos pela sua posse. Será entregue Título ou Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU). 47
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