Morcegos do Parque Chico Mendes, Osasco, São Paulo, como Dispersores de Sementes
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- Laura Regueira Carreiro
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1 1 5 Biologia Morcegos do Parque Chico Mendes, Osasco, São Paulo, como Dispersores de Sementes Elaine Lupiani Augusto Pesquisadora Profª Ms. Miriam Mitsue Hayashi Orientadora Resumo O papel desempenhado pelos morcegos na dispersão de sementes é bem estudado em áreas naturais, porém pouco se conhece sobre sua influência em áreas urbanas como o parque. Platyrrhinus lineatus, espécie constante, forneceu maior número de amostras de sementes de Fícus guaranítica. As sementes que passaram pelo trato digestório dos morcegos germinaram mais rapidamente do que as retiradas diretamente dos frutos, demonstrando que ao passar pelo trato sofrem escoriações que quebram a dormência. Apesar disso, P. lineatus e Sturnira lilium não podem ser considerados eficientes dispersores, pois danificam com os molares, parte das sementes eliminadas. Além disso, S. lilium ingere frutos imaturos, inviáveis para germinação. Palavra-chave: Sementes. Morcegos. Germinação. Dispersores. Abstract The role of frugivorous phyllostomid bats in pollination and seed dispersal is well investigates in several natural regions of its occurrence, but litleness is known on their influence in urban áreas, parks for instance. Platyrrhinus lineatus, constant species, has supplied larger number of Ficus guaranitica seeds samples. The seeds have gone through bats digesting treatment, have germinated quicklier than that ones. Taken directly off from the fruits, because they suffer excoriations that it breaks dormancy. In spite of that, P. lineatus and Sturnira lilium cannot be considered as efficient dispersers, for part of eliminated seeds is damaged by their molars. Besides, S. lilium ingests immature fruits inviable for germination. Key words: Seeds. Bats. Germination. Dispersers.
2 1 6 Elaine Lupiani Augusto Os morcegos são mamíferos voadores, pertencentes a Ordem Chiroptera (Classe Mammalia) com aproximadamente 950 espécies conhecidas (NOWAK, 1994). Cerca de 250 das 950 espécies são parcial ou totalmente dependente de plantas como fonte de alimento (FLEMING, 1988), sendo denominadas de fitófagas. Estas espécies vivem na região tropical e subtropical, onde a umidade e a temperatura são altas e algumas espécies de plantas frutificam em vários meses do ano. Embora muitas espécies de morcegos sejam basicamente fitófagas, suas dietas podem incluir insetos (HUMPHREY; BONACCORSO, 1979) ou folhas (ZORTEA, 1993). Os morcegos fitófagos exercem um papel importante como polinizadores, dispersores de sementes e restauradores de áreas alteradas. Embora muitos estudos tenham sido desenvolvidos sobre a dieta dos fitófagos, pouco se conhece sobre a taxa de germinação de sementes ingeridas e dispersadas por esses morcegos e a eficiência dos morcegos como dispersores de sementes. O estudo foi desenvolvido no Parque Chico Mendes, no município de Osasco (46 o W e 23 o S), São Paulo, no período de agosto de 2001 a julho de O Parque abrange uma área de m 2 de mata secundária, com diversas espécies vegetais que servem de alimento aos morcegos. Possui clima temperado úmido, oscilando entre 12 o C no inverno e 26 o C no verão e precipitação anual de 2000mm. No período em estudo foram coletados 83 morcegos divididos em cinco espécies da família Phyllostomidae. As capturas foram realizadas com redes de neblina (2,0mX7,0m), armadas ao escurecer em trilhas próximas às fontes de alimento e retiradas após seis horas, sendo vistoriadas a cada 30min. Foram realizadas 13 coletas com 78 horas de atividades, totalizando um sucesso de captura de 0,0884 indivíduos/m 2 e 1,064 indivíduos/hora. Os morcegos eram retirados da rede e colocado em sacos de pano para coleta de amostra de fezes e sementes de frutos ingeridos. Parte das amostras de sementes eram obtidas nas redes durante o manuseio dos animais. Os morcegos eram pesados com balança digital e medidos o antebraço com paquímetro. As anotações quanto ao horário de captura, sexo, espécie, estado reprodutivo e rede na qual foram capturados eram feitas em ficha de campo. Glossophaga soricina e Platyrrhinus lineatus foram as espécies fitófagas mais abundantes no parque, sendo coletadas em oito das 13 coletas realizadas, sendo consideradas constantes. Artibeus lituratus, Sturnira lilium e Artibeus fimbriatus foram amostradas em menos da metade das coletas, sendo consideradas acessórias. Apenas Glossophaga apresenta uma dieta predominantemente nectarívora, embora complemente a sua dieta com frutos e insetos (HUMPHREY; BONACCORSO, 1979). No presente estudo todas as espécies coletadas estavam utilizando as plantas disponíveis no parque, alguns exemplares não se abrigam no parque e o utilizam apenas para forragear. Foram listadas 34 espécies de plantas que podem servir de alimento aos morcegos, destas, 18 servem também como abrigo ou pouso de alimentação. Das 34, 16 (47,06%) apresentavam frutos com sementes menores do que 0,5cm de diâmetro, possíveis de serem transportadas por todos os morcegos coletados no parque; 14 (41,18%) entre 1,0 e 5,0cm; dois (5,88%) superiores a 5,0cm, transportáveis apenas pelas espécies de Artibeus. Frutos apenas com polpa (5,88%) eram difíceis de serem identificadas nas amostras de fezes, podendo apenas ser identificada pelo odor e coloração. Observações em cativeiro auxiliaram na caracterização das polpas das fezes. A escolha do fruto está diretamente relacionada com o tamanho do fruto (HEITHAUS et. Al, 1975), características nutricionais e período de floração e frutificação (HOWE, 1988), restringindo desta forma a oferta de frutos para cada uma das espécies. O número de plantas em floração e frutificação variou ao longo do ano, com predominância de uma ou outra espécie em cada mês, excetuando as da família Solanaceae que frutificaram em pequena quantidade por longos períodos. A frutificação intercalada de Solanum erianthum e Solanum variabile possibilitaram que Sturnira,especialista em Solanum,
3 Morcegos do Parque Chico Mendes, Osasco, São Paulo, como Dispersores de Sementes 1 7 mantivesse a fidelidade a esses frutos (Tabela I). Já espécies como Artibeus e Paltyrrhinus se alimentavam de frutos com alta frutificação por períodos curtos, característica das espécies de interesse comercial, como verificado por Hill & Smith (1988). Desta forma necessitaram variar a dieta ao longo do ano, buscando frutos com a mesma característica de frutificação. As sementes retiradas das amostras fecais foram colocadas em envelopes de papel vegetal para identificação e posterior teste de germinação. Todas as sementes pequenas eram retiradas das fezes, já as grandes eram recolhidas abaixo do pouso de alimentação. Foram encontradas muitas sementes em folhagens e pousos temporários, como Psidium guajava, Eriobotrya japonica e Plinia edulis, próximas a fonte de alimento. As características das fezes eliminadas, tipo de mordida (marcas dos dentes deixados nos frutos), altura e locais onde foram encontrados, auxiliaram na identificação do consumidor potencial desses frutos. A identificação dos frutos consumidos por cada espécie de morcego foi feita por comparação com a coleção referência de sementes montadas ao longo do estudo. Tabela I Itens alimentares consumidos pelos morcegos frugívoros do Parque Chico Mendes, no período de agosto de 2001 a julho de Espécies de morcegos Espécies vegetais Parte consumida Platyrrhinus lineatus Ficus guaranitica Fruto Solanum erianthum Fruto, folha Syagryus romanzoffiana Fruto Artibeus lituratus Ficus guaranitica Fruto Plinia edulis Fruto Syagrus romanzoffiana Fruto Artibeus fimbriatus Solanum erianthum Fruto Glossophaga soricina Ficus guaranitica Fruto Solanum erianthum Fruto, folha Sturnira lilium Solanum erianthum Fruto Metade das sementes coletadas foram colocadas para germinar em vermiculita, terra preparada para jardinagem, e na terra do parque, a fim de poder comparar o tempo de germinação e as características do desenvolvimento. As sementes eram colocadas a 3,0cm abaixo da terra e regadas a cada dois dias. Sementes retiradas diretamente dos frutos foram colocadas para germinar nas mesmas condições e faziam parte do grupo controle. Frutos parcialmente comidos e abandonados pelos morcegos em vôo ou abaixo do pouso foram identificados e também colocados para germinar. O teste de germinação serviu em alguns casos para identificação do fruto consumido a partir da plântula. Sementes de Fícus que passaram pelo trato digestório germinaram em 15 dias e o grupo controle em 32, com quase o dobro de diferença, assim como os frutos de Solanum (Tabela II). Apenas em Psidium guajava as sementes do grupo controle germinaram primeiro, em 52 dias. Não houve diferença no início da germinação entre a vermiculita e a terra do parque. Sementes eliminadas há algum tempo e as recém liberadas germinaram em tempo semelhante. Frutos parcialmente comidos e abandonados com sementes em pousos ou em vôo, também foram testados e obtiveram início da germinação mais tardio. Dos 83 morcegos coletados apenas 25 (30,12%) forneceram amostras fecais, sendo a maior parte
4 1 8 Elaine Lupiani Augusto de Platyrrhinus, espécie coletada após ter se alimentado. Destas 25 amostras, 15 (18,07%) estavam com sementes e nove (10,84%) continham apenas polpa. Artibeus ao consumir frutos com sementes grandes abandonavam a semente no pouso e as fezes continham apenas polpa. Nenhum exemplar foi coletado com mais de uma amostra de semente ou polpa, indicando ter consumido apenas um tipo por noite. Além de frutos, nove exemplares de Platyrrhinus estavam com um pó verde não identificado, espalhado pelo focinho e polegares e uma Glossophaga complementou a sua dieta com besouro (Coleoptera). Tabela II Quantidade de sementes que germinaram das amostras eliminadas nas fezes dos morcegos (SE) e as do grupo controle (GC). 1 20* 21 40* 41 60* Não germinaram TOTAL SE GC SE GC SE GC SE GC SE GC CATIVEIRO Fícus carica FOLHAGEM Fícus guaranítica Psidium guajava Solanum erianthum ABRIGO Syagrus romanzoffiana Eriobotrya japonica TOTAL *=intervalo em dias Todas as sementes das amostras de fezes germinaram antes do grupo controle, com exceção de Psidium guajava que germinou no mesmo intervalo.isso significa que sementes que passam pelo tubo digestório e que sofrem escoriações no revestimento externo germinam mais rapidamente, como verificado por Fleming (1988). Sementes grandes, embora não ingeridas inteiramente, são levemente escoriadas pelos dentes molares. Caso as escoriações sejam muito profundas, pode impedir a germinação. Várias plântulas de Ficus e de Solanum foram encontradas no parque, indicando possíveis rotas de vôo utilizadas pelos morcegos. A maioria das mudas estava se desenvolvendo presas aos troncos de árvores ou em locais possíveis de serem visitados apenas por dispersores voadores. Apesar da eficiência na dispersão aérea, algumas espécies como Platyrrhinus lineatus e Sturnira lilium, danificam parte das sementes com os molares, prejudicando a germinação, como verificado por Muller e Reis (1992) para Platyrrhinus e Hayashi (1996) para S. lilium. Além disso, S. lilium tem preferido frutos imaturos e folhas de Solanum a outros frutos maduros, demonstrando ser especializada neste tipo de fruto. O valor nutricional destes frutos e a facilidade em retira-los em vôo pode estar favorecendo esta relação morcego-planta. No presente trabalho, G. soricina, espécie predominantemente nectarívora, consumiu frutos de Fícus guaranítica, altamente protéicos e transportáveis por esta espécie que pesa no máximo 10g. A ausência de flores de sua preferência pode ser o fator que favoreceu a mudança de dieta.
5 Morcegos do Parque Chico Mendes, Osasco, São Paulo, como Dispersores de Sementes 1 9 Referências FLEMING, T. H. The short-tailed Fruit Bat: A study in plantanimal interactions. Chicago: University of Chicago Press, p. HAYASHI, M.M. Morcegos frugívoros em duas áreas alteradas da Fazenda Lageado, Botucatu, Estado de São Paulo Dissertação (Mestrado em Ciências Bilógicas) Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista, Botucatu, HEITHAUS, E.R.; FLEMING, T.H.; OPLER, P.A. Foraging patterns and resource utilization in seven species of bats in a seasonal tropical forest. Ecology, v. 56, p , HILL, J.E., SMITH, J.D. Bats: A natural history. Inglaterra: British Museum (Natural History), p. HOWE, H.F.; WESTLEY, L.C. Ecological relationship of plants and animals. New York: Oxford Universitu Press, p. HUMPHREY, S. R.; BONACCORSO, F. J. Population and community ecology. In: BAKER, R. J.; JONES Jr.; J. K., CARTER, D. C. (Eds.). Biology of bats of the New World family Phyllostomatidae. Part III. Lubbock: Spec. Publ. Mus. Texas Tech. Univ., v p MÜLLER, M. F., REIS, N. R. Partição de recursos alimentares entre quatro espécies de morcegos frugívoros (Chiroptera, Phyllostomidae). Rev. Bras. Zool., v. 9, p , NOWAK, R. M. Walker s Mammals of the World. 5 ed. Baltimore: John Hopkins Univ.. 2v. 1629p ZORTEA, M. Folivory in Platyrrhinus (Vampyrops) lineatus. Bat res. News, v. 34, p , 1993.
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