PORTINARI: AS OBRAS SOBRE CRIANÇAS E FUTEBOL COMO REPRESENTAÇÃO DA CULTURA POPULAR,
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- Guilherme Barata Bernardes
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1 DOI: /4cih.pphuem.531 PORTINARI: AS OBRAS SOBRE CRIANÇAS E FUTEBOL COMO REPRESENTAÇÃO DA CULTURA POPULAR, Prof. Aluisio de Almeida Andriolli Faculdade de Artes do Paraná. FAP Mestrando em Artes Universidade Estadual de Campinas UNICAMP A Iniciativa de pesquisar este tema começou a se delinear após o contato com obras de Portinari da série Meninos de Brodósqui, desenvolvidas a partir de 1946 por este pintor. A partir dessa busca por obras que retratassem o universo infantil na produção do artista, tentando refinar a procura por um tema de pesquisa, optou-se por procurar, nas suas obras, a representação de crianças brincando, em movimento. Dessa forma, a escolha pela figuração de jogos foi decisiva, mas como a obra de Portinari é bastante extensa, foi feita ainda outra opção por um jogo específico, muito presente na cultura brasileira, de características que se tornaram muito populares ao longo do tempo em nosso país, a ponto de ser transmitido às crianças, que o transformaram em uma brincadeira que pode ser considerada universalizada no meio infantil brasileiro, e que é popular entre todas as camadas sociais no nosso país: o jogo de futebol. Procurar dar conta de aspectos relativos a esta problemática torna-se assim um dos objetivos buscados na pesquisa relativa a este tema. À medida que novas leituras sobre o artista foram sendo realizadas, passamos a considerar também o seu posicionamento político-social, bem como a aceitação que sua obra passou a ter, historicamente falando, como representação, se não oficial, no mínimo oficiosa da arte brasileira da época, levando-se em conta o relativo sucesso que o artista teve junto aos meios empresariais e governamentais dessa fase da história do Brasil. A visão de Portinari como artista oficial, se não de um regime, pelo menos de um governo (Governo Vargas), foi muito contestada, tanto na crítica de arte como mais tarde na academia. Na crítica de arte podemos citar a defesa de Portinari feita por Antonio Bento:
2 4326 Uma das críticas contundentes em relação á Portinari até hoje com repercussão negativa é a que o colocava como artista do establishment, ou seja, na posição de pintor oficial. Acusavam-no de ter realizado decorações murais para o ministério da educação, hoje Palácio Gustavo Capanema, no Governo de Getúlio Vargas. Buscavam assim torná-lo antipático aos olhos do público. O regime do Estado Novo era de fato antidemocrático. Mas Portinari foi chamado a fazer aquelas decorações não em decorrência de suas posições políticas ou de sua filiação ao regime então vigente mas em virtude de suas habilitações profissionais. Tornara-se na época o nosso único pintor moderno capaz de executar satisfatoriamente em afrescos, as pinturas murais que lhe foram encomendadas. Carlos Lacerda, então um jovem político de extrema esquerda e por isso insuspeito afirmou em 1940 que Portinari não era um pintor oficial. Sua observação, além de isenta, foi absolutamente correta. No seu conjunto, a obra portinariana era a de um artista preocupado com os problemas sociais; portanto a antítese do rótulo que lhe tentaram impor. (...) Quem conhece a história da arte sabe que sempre coube aos governantes (potentados, tiranos, dignitários, reis, ministros e príncipes), como agora também incumbe aos burgueses (banqueiros, industriais e executivos diversos), o exercício do mecenato. (Bento, 2003: ) No nível da academia, um dos trabalhos mais conhecidos sobre o significado do conjunto da obra de Cândido Portinari é o de Annateresa Fabris, Portinari, Pintor Social, no qual a autora faz uma análise da importância do Pintor no cenário nacional das artes plásticas, buscando desmistificar as idéias preconcebidas sobre ele e sua obra. Quanto à crítica feita à Portinari sobre a oficialidade de sua pintura, esta autora diz o seguinte: Ter trabalhado para o governo Vargas parece constituir um handicap para certos setores da crítica mais recente, que se prendem ao fato em si, sem procurar indagar quais as relações de Portinari com o modelo getulista. (...) A figura do pintor oficial parece ter se cristalizado de tal forma para estes setores da crítica que, mesmo obras anteriores e posteriores aos trabalhos feitos para o governo, são vistas a partir dessa óptica. É o caso de Café, em que Carlos Zílio já vê a tipificação duma estética oficial. No artigo A Querela do Brasil apesar de não se referir especificamente a Portinari, Zílio reproduz Café com a legenda a influência do dirigismo. A partir disso, é possível localizar no artigo qual o papel de Portinari no contexto da arte brasileira, Zílio situa nos anos trinta o interesse por uma arte genuinamente brasileira, caracterizada por formulações nacionalistas. (...) Do que se depreende que Portinari teria veiculado uma imagem estereotipada da realidade brasileira, de acordo com o modelo desenvolvimentista e aglutinador fornecido pelo governo. (...) Se este tipo de visão não é satisfatória em seu esquematismo, pode-se propor o enfoque do oficialismo de Portinari a partir de um outro ponto de vista. Pode-se tentar ligar a imagem do pintor oficial á imagem do pintor moderno, isto é, pode-se tentar demonstrar a apropriação de Portinari quer por parte do governo, quer por parte da intelectualidade modernista, objetivando veicular determinadas idéias. É a fama de pintor moderno que leva Portinari à posição de pintor oficial. O artista é convidado por Gustavo Capanema graças ao prestígio internacional de Café, e esse fato não é irrelevante numa época como a década de 30, em que o Brasil estava empenhado num processo de modernização. Arte moderna para um país moderno. Arte reconhecida internacionalmente para um país em busca de reconhecimento internacional. (Fabris,1990: 29-31)
3 4327 Num certo estágio da pesquisa foi necessária uma base mais elaborada sobre a biografia do artista e, principalmente, sobre o contexto histórico da confecção da sua obra. Assim localizamos Portinari como um aluno da grande academia artística de sua época: a Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, o que significa que, como muitos artistas de sua geração, Cândido também teve uma formação inicial no academicismo e suas obras do início de carreira revelam isso. Como outros artistas, Portinari teve a oportunidade de viajar e estudar na Europa por volta da década de 1920, tendo contato assim com a vanguarda artística da época. Dessa experiência resultou a vontade de pintar as coisas do seu Brasil, ou seja, a representação artística do que ele conhecia em seu país, daí talvez a ênfase dada em alguns momentos em cenas da sua infância, da sua cidade natal, mas principalmente desta forma, numa figuração das manifestações populares da cultura brasileira. De resto, este foi um tema constante de vários artistas e pensadores da época, representações não só artísticas, mas também reflexões filosóficas e científicas, e no caso das artes, não só no campo das artes visuais como também da música, teatro, etc. Ou seja, o chamado modernismo brasileiro ficou prenhe da cultura popular de nosso país, e nesse sentido, Portinari talvez seja o mais representativo dos artistas plásticos a retratar a cultura brasileira de sua época em suas obras. Um dos possíveis aspectos curiosos das obras da série Meninos de Brodósqui, de Portinari, é o fato de que realmente podem ser representações de lembranças da infância do artista, nascido em 1903; as figuras dos meninos aparentemente parecem ter entre cinco e dez anos de idade, o que denotaria o tempo desta infância representada por volta de 1910, um momento histórico em que possivelmente o futebol ainda estava se popularizando em nosso país, pois segundo alguns autores, esse esporte, introduzido no Brasil como prática desportiva de elite ao final do século XIX e início do XX, ao longo das três primeiras décadas do século passado passou por um processo de popularização, ou seja, começou a fazer parte do que se denomina cultura popular. Nesse sentido, é interessante observar como o futebol se popularizou, não só no Brasil, como em outras partes do mundo. Uma das coisas que se pretende neste trabalho é procurar as relações possíveis entre as expressões dessa cultura popular concernentes ao futebol, no intervalo de tempo das
4 4328 décadas de 1930 a 1950, e o estudo das produções artísticas de Portinari sobre este tema, ao longo do tempo. Enfatizando questões colocadas na inserção da obra do artista, talvez numa busca da sua representação da cultura popular neste aspecto específico. A pesquisa tem como ponto de partida dezoito produções já catalogadas do artista nesta temática, que cobrem o tempo entre 1933 e 1958: três obras com o título Jogo de Futebol em Brodowski, de 1933; Futebol, de 1935; Jogando Futebol e Praça de Brodowski, ambas de 1939; Futebol, de 1940; Futebol, de 1941; Brodowski, três obras com o título Meninos Brincando, duas obras com o título Futebol em Brodowski, quatro obras com o título Futebol, todas de Como suporte está se buscando trabalhar com uma metodologia baseada na pesquisa com imagens e representações dos trabalhos de Portinari relativos ao tema, bem como em pesquisa bibliográfica sobre as diversas interpretações do significado da obra do artista e também de bibliografia sobre a cultura brasileira na época do modernismo. A importância do trabalho desse artista para a cultura brasileira é algo reconhecido já há bastante tempo e realizar uma pesquisa sobre um dos aspectos da sua produção artística pode ser um fator que auxilie no processo de conhecimento sobre a sua obra. No contexto desse tema específico é importante frisar que Portinari possivelmente foi um dos primeiros artistas brasileiros a retratar o jogo de futebol; ao longo do desenvolvimento do projeto de pesquisa, viu-se a importância de conhecer mais profundamente a obra do artista, levando em conta a sua formação artística, intelectual e também a sua opção política pessoal, um dos fatores fundamentais que o levam a priorizar a representação de problemas sociais que denunciam a situação dos brasileiros mais carentes de sua época, bem como a cultura popular que é, na visão do artista, produto e usufruto desses mesmos brasileiros figurativamente representados por ele. Assim, de um recorte mais especializado (a representação do jogo de futebol de crianças), está se tentando desenvolver a pesquisa para uma reflexão mais ampla sobre a obra do artista.
5 4329 REFERÊNCIAS ARILLO, J. R. e GONZÁLEZ, J. A. O Conteúdo da imagem. Curitiba: Ed. UFPR, BAXANDALL, M. Padrões de Intenção: A Explicação Histórica dos Quadros. São Paulo: Companhia das Letras, BELLOS, A. Futebol: O Brasil em Campo. Rio de Janeiro: Zahar, BENTO, A. Portinari. Rio de Janeiro: Léo Christiano Editorial, BOSI, A. Reflexões Sobre a Arte. São Paulo: Ática, BRITES, B. e TESSLER, E. O Meio Como Ponto Zero: Metodologia da Pesquisa em Artes Plásticas. Porto Alegre: Ed. UFRGS, BURKE, P. Hibridismo Cultural. São Leopoldo: Editora Unisinos, BURKE, P. O Que é História Cultural? Rio de Janeiro: Zahar, CALLADO, A. Candido Portinari. Buenos Aires: Edições Finambrás, CALLADO, A. Portinari Menino. Rio de Janeiro: José Olympio, CALLADO, A. Retrato de Portinari. Rio de Janeiro: Paz e Terra, CARDOSO, C. F. Narrativa, Sentido, História. Campinas: Papirus, CHALMERS, F. G. Arte, Educacíon y Diversidad Cultural. Barcelona: Paidós, COLI, J. O Que é Arte. São Paulo: Brasiliense, DUARTE JR, J. F. Fundamentos Estéticos da Educação. Campinas: Papirus, DUARTE JR, J. F. O Que é Beleza. São Paulo: Brasiliense, DUARTE JR, J. F. Por Que Arte-Educação? Campinas: Papirus, DUMAZEDIER, j. Lazer e Cultura Popular. São Paulo: Perspectiva, DUPUY, N. C. e ORTIZ, C. Aprender Desde El Arte. Buenos Aires: Papers, FABRIS, A. Portinari, Pintor Social. São Paulo: Perspectiva, FALCON, F. História Cultural: Uma Nova Visão Sobre a Sociedade e a Cultura. Rio de Janeiro: Campus, GIDDENS, A. Modernidade e Identidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2002.
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